Fátima ChuEcco/Anda – Agência de Notícias de Direitos Animais
Colaboração Vegan News
Olhe bem para cada um dos rostos que ilustram essa matéria. É provavelmente a última vez que poderão ser vistos com vida. Vida que, aliás, está por um fio. Um fio de esperança, um fio de dignidade, um fio de humanidade. Eles viviam nas ruas comendo lixo e dormindo no asfalto, mas ainda assim a vida desses cães era muito melhor que essa que enfrentam agora passando por dolorosos experimentos na Universidade Federal de Viçosa (UFV), em Minas Gerais. Primeiro foram recolhidos ao CCZ da cidade que fica dentro da UFV e, mais tarde, escolhidos para a vivissecção sem chance de serem adotados.
Por isso, cada um dos próximos minutos é uma contagem regressiva, uma despedida. As pesquisas visam sacrificar os animais ao final de dois meses (que já estão se esgotando) e nem mesmo uma Ação Civil Pública (ACP), expedida no mês passado pelo Ministério Público de Minas Gerais (MPMG) e o Ministério Público Federal (MPF), solicitando a paralisação de experimentos científicos realizado pela UFV com cães cedidos pelo canil municipal conseguiu reverter a situação.
Alguns dos experimentos implicam em cirurgias e rompimento de ligamentos importantes para os movimentos das patas. Assim, o destino desses cães está sendo dolorosamente selado por um bisturi e um cárcere onde sentem dor, frio, medo, angústia e nenhuma vontade de viver. Entre paredes frias e chão gelado eles aguardam a hora de novos e terríveis procedimentos sem entender o que fizeram de tão errado para merecer um castigo tão pesado.
Pelo menos três ONGs se prontificaram a ficar os animais: Cão Sem Dono, Bendita Ação e Amigos de São Francisco, mas a universidade não quis abrir mãos das cobaias. Doug é um dos cães dessa infeliz matilha e estava prestes a ser adotado. O historiador Francisco José Mendes Duarte simpatizou com Doug quando passou a visitar o canil da UFV onde faz pós-doutorado em Economia. Quando foi oficializar a adoção e levar Doug para casa ele já tinha sido removido para o centro de pesquisas alguns dias antes. Francisco falou pessoalmente com o diretor do centro veterinário da UFV e também com veterinários reafirmando seu interesse no cachorro. Tudo em vão. Disseram que ele já estava inserido nos experimentos.
“Meu sentimento é de revolta. Estou muito decepcionado com algumas pessoas do centro veterinário que não têm qualquer consideração pela vida dos animais de rua. Mesmo o Ministério Público determinando a soltura dos cães, eles permanecem nos experimentos. Não acredito numa educação sem ética. Estou nessa universidade há um ano e meio porque sei que é uma ótima entidade de ensino, então como podem permitir isso?”, diz o historiador.
A Sociedade Viçosense de Proteção aos Animais (Sovipa) explica que um Termo de Ajustamento de Conduta (TAC) assinado pela prefeitura de Viçosa e pela UFV perante o Ministério Público Federal em 2009 e reajustado em 2013, determina que apenas os animais gravemente doentes e sem expectativa de vida podem ser usados nos experimentos – o que também não é justo, mas foi a solução encontrada para uma cidade que não tem lei protegendo os animais de rua. Os cachorros saudáveis, conforme o TAC, seriam tratados por entidades de proteção e colocados para adoção.
Mas em meados deste ano o canil interrompeu as visitas de voluntários que, inclusive, contribuíam para com a alimentação e vacinação dos animais e, pouco tempo depois veio à tona que todos os animais lá mantidos até então haviam sido encaminhados para pesquisas. Foi e continua sendo um baque para os protetores de animais de Viçosa que viram um trabalho construído com amor tragado pela vivissecção.
Sem justificativa ética ou técnica
Procurado pela ANDA, Sérgio Greif, um dos pesquisadores e ativistas da causa animal mais respeitados do Brasil, comentou as pesquisas da UFV: “Os cães oriundos do CCZ, com idades entre 1 e 2 anos, estariam sendo induzidos a apresentar sintomas de displasia coxofemoral, osteoartrite e polpa dentária exposta para depois serem submetidos a procedimentos experimentais diversos. Coelhos também estariam sendo induzidos a apresentar osteoporose e defeitos ósseos cranianos. Estes projetos pertencem todos ao mesmo grupo de trabalho financiados pela CAPES, CNPq, FAPEMIG, FUNARBE, bem como pela iniciativa privada (JHS Química Ltda) em um valor total de R$ 584.042,80. Os projetos foram todos aprovados pela CEUA – Comissão de ética no Uso de Animais da Universidade”.
“Os dados das pesquisas revelam pouco sobre os procedimentos que foram ou estão sendo realizados nos animais, bem como em relação ao número de animais utilizados em cada experimento, mas podemos questionar essas pesquisas pelo pouco que elas nos permitem conhecê-las, tanto pelo ponto de vista ético quanto técnico. Os questionamentos éticos são bastante simples: de que forma podemos justificar ética ou moralmente a utilização de cães ou coelhos saudáveis cujo único `defeito` foi não possuírem raça definida, nem um tutor que se preocupe com eles, ou haverem nascido pertencendo a uma espécie que alguns podem considerar inferior, para então supostamente salvar cães de raça e cujos tutores possam pagar caro por seus tratamentos? Ou para em teoria aplicar estes conhecimentos na medicina humana? Que relação possuem os vira-latas apreendidos pelos CCZs com uma doença que sequer incide sobre sua população? Ou que culpa possuem os coelhos criados em laboratórios com nossos problemas periodônticos ou de formação óssea, se eles mesmos não sofrem naturalmente desses mesmos problemas?”, argumenta.
E salienta o despropósito dos experimentos: “Os questionamentos técnicos são menos óbvios, mas não menos evidentes. Apenas para exemplificar, a displasia coxofemoral é uma doença genética, com prevalência sobretudo em cães de raça cuja variabilidade genética é pequena e sobretudo cães de grande porte e com tendência à obesidade. Os cães recolhidos do CCZ não possuem displasia coxofemoral, são cães com grande variabilidade genética, geralmente de porte médio ou pequeno e pouquíssima massa gorda. Não há nenhuma justificativa técnica para seu uso em pesquisas dessa natureza”.
Por que não se testa em animais de fato doentes?
“Mais óbvia é a pergunta: Se estamos lidando com uma doença hereditária, com alta prevalência em cães de raças grandes, porque não utilizar esta população para a realização dos procedimentos? Esses cães não seriam assim cobaias de laboratório, mas pacientes reais sofrendo procedimentos experimentais cujo objetivo seria seu próprio benefício. Nada mais óbvio”, diz Sérgio Greif.
Segundo ele, os demais projetos da UFV, cuja consulta é pública, consistem basicamente de procedimentos igualmente dolorosos que visam induzir em animais saudáveis sintomas de doenças que eles possivelmente jamais poderiam ter naturalmente, para realizar procedimentos desnecessários que poderiam ser verificados em animais que realmente padecem dessas doenças ou mesmo mediante simulações in vitro.
“Não há justificativa ética ou técnica para tais pesquisas, trata-se de uma vergonha que veterinários que poderiam estar auxiliando realmente animais estejam tornando-os doentes para então submetê-los a tratamentos possivelmente dolorosos e depois matando-os e descartando-os como se fossem lixo. É uma vergonha que órgãos de fomento que se mantêm às custas de impostos pagos pela população financiem tais pesquisas, que nada mais fazem do que lesar animais saudáveis”, finaliza.
A opinião da pioneira em “Medicina do Futuro”
Daniela Lopes, veterinária homeopata e especialista em Saúde Quântica aplicada aos Animais, conhecida também como “Medicina do Futuro”, é categórica: “Sou contra o sofrimento sob qualquer alegação científica”. “A realidade é que não apenas as faculdades de veterinária retrógradas utilizam desse cruel método, mas a permissibilidade dos comitês de ética instalados nas faculdades de medicina representam uma realidade obscura e oculta aos olhos de muitos. Vários são os centros de técnica cirúrgica que se utilizam de cães e suínos para treinar profissionais, não apenas alunos, mas também especialistas em cirurgia cardíaca e abdominal participam desses procedimentos até hoje. Eles treinam anestesia, endoscopia, entre outras coisas”.
Para Daniela, todo e qualquer experimento com animais, cuja finalidade é a obtenção de um resultado seja de comportamento, medicamento, cosmético ou ação de substâncias químicas em geral é cruel e antiquado. Ela diz que geralmente os experimentos são realizados sem anestésicos, podendo ou não envolver o ato da vivissecção.
“Creio que os comitês de ética estão compostos por pessoas leigas e que ainda não entenderam que os animais não estão aqui para nos servir. Nós é que estamos aqui para aprender com a bondade e capacidade de perdão deles. Nem mesmo a utilização de animais na área médico-científica é justificável, uma vez que já se sabe que a utilização de animais em pesquisas é um retrocesso, um atraso na evolução científica, além de ser um grande desperdício de dinheiro público”, diz a especialista. “A vivissecção envolve basicamente interesses financeiros e políticos, e nem tanto científicos, pois, tudo tem a indústria como megainteresse e ganhos faraônicos em cima da dor de tantos”, afirma.
As alternativas que poupam vidas
Daniela comenta que já existem inúmeros métodos substitutivos eficazes que podem e já estão sendo usados nessa área. “Isso sem falar dos modernos processos de análise genômica e sistemas biológicos in vitro, que vêm sendo muito bem utilizados por pesquisadores brasileiros. Existem culturas de tecidos, provenientes de biópsia, cordões umbilicais ou placentas descartadas que dispensam o uso de animais. Vacinas também podem ser fabricadas a partir da cultura de células do próprio homem. Eu, particularmente, dispensei o uso de ratos em meu experimento que testava uma substância homeopática para câncer, mantendo minha postura profissional, usando apenas cultura de células e proporcionou um excelente parâmetro de resultados e, o mais importante, minha consciência livre de ter que induzir à morte inúmeros ratos saudáveis!”.
A reportagem da ANDA ligou inúmeras vezes para a UFV na tentativa de falar com o chefe do centro veterinário e também com a veterinária Andrea Pacheco Batista Borges, a principal líder das pesquisas com cães, gatos, coelhos, ratos e equinos que estão sendo realizadas desde 2000, mas não foi possível falar com nenhum dos dois. Foi também enviado email à Andrea, mas não houve resposta até o fechamento desta matéria. No entanto, a ANDA permanece aberta para o pronunciamento da UFV. Todas as 94 pesquisas, com sua breve descrição e valor do financiamento, podem ser acessadas no link colocando o nome da veterinária no campo para membros da equipe.
*É permitida a reprodução total ou parcial desta matéria desde que citada a fonte ANDA – Agência de Notícias de Direitos Animais com o link. Assim você valoriza o trabalho da equipe ANDA formada por jornalistas e profissionais de diversas áreas engajados na causa animal e contribui para um mundo melhor e mais justo.