Uma turista recebeu uma multa de R$ 10 mil após segurar uma tartaruga-marinha em Fernando de Noronha, em um vídeo que circulou nas redes sociais. O Plano de Manejo da Área de Proteção Ambiental (APA) do arquipélago — documento que define as regras para o uso sustentável dos recursos naturais e a gestão da área protegida — proíbe esse tipo de conduta.
Thiago Ferrari, ambientalista e diretor do instituto O Canal e dos projetos Amigos da Jubarte e Golfinhos do Brasil, explica que a proibição do toque em animais marinhos está ligada também à saúde deles e à prevenção de doenças que podem ser transmitidas entre humanos e fauna silvestre.
“Um ser humano pode transmitir uma doença a esses animais, assim como eles também podem transmitir doenças a nós. Esses bichos podem adoecer e causar um grande prejuízo à espécie”, afirmou Ferrari ao CNN Viagem & Gastronomia.
Alguns períodos são mais delicados em comparação a outros para as espécies. Entre eles, as épocas reprodutivas de tartarugas e baleias jubarte, por exemplo. “São momentos mais importantes ainda do ponto de vista da conservação”, completou.
Essa interação humana com os animais ainda pode estressar os bichos e até gerar acidentes. “Estamos falando de baleia, golfinho e tartaruga, gerando um prejuízo tanto para o animal quanto para o ser humano [caso ocorra acidentes]. Por isso é importante que as pessoas sigam a legislação indicadas para todas as determinadas espécies que vivem por aqui [na costa brasileira], especialmente as marinhas”, finalizou.
A aproximação e o toque em animais podem atrapalhar o balanço energético, segundo Agnaldo Silva Martins, professor de oceanografia da UFES (Universidade Federal do Espírito Santo).
“Em um lugar muito visitado por vários turistas, talvez o mesmo animal seja molestado por vários viajantes ao longo do tempo. Em cada molestamento, o animal vai se estressar, gastar energia, fugir e, nesse processo, vai ter o balanço energético atrapalhado: ou seja, ele vai gastar mais energia do que vai adquirir se alimentando”, disse ele à reportagem.
As consequências da perda desse equilíbrio são inúmeras: o animal fica mais magro, mais fraco e mais suscetível a ter doenças, o que pode aumentar a taxa de mortalidade da espécie. Já durante a fuga, ele pode ir para uma área onde fica mais passível a predação.
O que diz a legislação?
A Lei de Crime Ambientais define que o ato de perseguir um animal é considerado uma infração em âmbito nacional. Em Noronha, os planos de manejo proíbem, expressamente, o toque nos animais.
“Além disso, tem risco de ferimento: uma tartaruga morde e pode machucar seriamente uma pessoa”, pontuou Edineia Correia, analista ambiental e coordenadora da Área Temática de Proteção do ICMBio (Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade) de Fernando de Noronha.
Pelas leis, a interação com animais marinhos em unidades de conservação pode ser enquadrada como “conduta violadora” das regras que visam proteger a área, segundo Rômulo Sampaio, professor da FGV Direito Rio. Também pode ser enquadrado como infração contra a fauna.
O pesquisador Luiz César Loques, da FGV Direito Rio, explica que o toque é enquadrado como uma infração administrativa por “gerar estresse no animal, que não está acostumado com esse tipo de contato”.
A turista de Fernando de Noronha, no caso, foi multada em R$ 10 mil com base no Decreto Federal nº 6.514/2008 (art. 90), que “pune condutas em desacordo com os objetivos da unidade de conservação, seu plano de manejo e regulamentos”.
As multas ainda “podem variar de R$ 500 até R$ 10 mil, dependendo da gravidade da infração e da condição econômica do infrator”, conforme Sampaio.
Para evitar multas, o ideal é focar somente na observação dos animais marinhos e não tocar ou tomar qualquer ação que possa causar estresse, desconforto ou desequilibrar o meio ambiente.
“Além do toque, não é recomendado tentar assustar ou nadar atrás do animal [por exemplo]”, disse Loques.
“O ser humano está fazendo uma atividade turística ali que, em alguma medida, acaba interferindo naquele habitat que aquele animal está vivendo. Ele tolera e recepciona aquele novo ser que ele está identificando, mas dependendo do animal, ele pode entender aquilo como uma ameaça e atacar.”
O turismo regenerativo, inclusive, é uma forma de viagem que visa não só diminuir o impacto ao meio ambiente, mas renovar perdas da região. A prática oferece soluções como plantações de árvores, reconstrução de áreas devastadas e até plantio de corais no mar.
Quais outras condutas são proibidas também?
Além de tocar ou segurar animais silvestres, há outras condutas proibidas em áreas de proteção ambiental. Em todo o litoral brasileiro, recomenda-se evitar a retirada de conchas, corais, pedras e outros materiais naturais. Segundo especialistas, esse tipo de ação pode desequilibrar ecossistemas costeiros. Em Fernando de Noronha, a prática é expressamente proibida e pode gerar multas de até R$ 10 mil.
Alimentar peixes ou outros animais marinhos também é uma infração comum em várias regiões do país. “Essa prática altera o comportamento natural das espécies, cria dependência e pode aproximar animais de pessoas e embarcações, o que aumenta o risco de acidentes e desequilíbrios ecológicos”, explica Sampaio.
Por isso, conhecer as regras — e respeitá-las — antes de qualquer passeio de observação de animais é essencial. Isso garante a preservação da fauna, da natureza e também a segurança dos próprios visitantes.
Fonte: CNN