Quando adotou o cachorro Toddy, o designer de produtos Anderson Barboza da Silva priorizou realizar o check up de saúde de seu primeiro pet. O vai e vem entre veterinário e exames foi facilitado porque Anderson teve dois dias da chamada licença PETernidade.
O benefício passou a ser oferecido por algumas empresas para funcionários que adotam animais – geralmente válido para cães e gatos – e funciona como as licenças maternidade e paternidade, um período para se dedicar ao novo membro da família. No caso dos animais domésticos, são dois dias.
“Adotei o Toddy em janeiro, quando ele ainda era um filhote, e esse momento de entrosamento, de atenção total para ele foi muito importante para criamos um vínculo e para ele se ambientar ao novo lar”, conta Anderson, que trabalha em um e-commerce de produtos para pet.
Segundo levantamento da Petlove, 62% das casas do país já têm pelo menos um cachorro ou gato como morador, porcentagem que equivale a 40,4 milhões de residências espalhadas por todas as regiões.
Denice Caetano, head de pessoas e cultura da empresa, diz que a política da Petlove tem como objetivo “garantir a manutenção de um compromisso com o bem-estar dos animais, além de apoiar e trazer mais tranquilidade para a rotina dos tutores nessa nova fase”.
A empresa oferece também outro benefício relacionado aos animais como o Plano de Saúde Pet, com cobertura para consultas, exames laboratoriais, exames de imagem e funeral e cremação.
Mais um
A pandemia de Covid-19 teve como efeito o aumento na busca por animais de estimação. A ONG União Internacional Protetora dos Animais (UIPA), de São Paulo, registrou um crescimento de 400% na procura por cães e gatos logo no começo do período de isolamento em 2020.
Segundo a ONG, o principal motivo apontado para o crescimento foi a busca por companhia durante o isolamento social.
Ao identificar esse movimento, a consultoria Great Place to Work (GPTW) Brasil passou a oferecer o benefício há cerca de um ano. O empregado precisa avisar o gestor com no mínimo cinco dias de antecedência e receberá dois dias de licença. O benefício é oferecido apenas uma vez ao ano.
“Quando os tutores não conseguem se dedicar à chegada do animal, o resultado, muitas vezes, é o abandono”, afirmou Lilian Bonfim, diretora de pessoas da GPTW Brasil.
“Durante a pandemia sentimos que houve um aumento significativo de adoção e como, em muitos casos, a chegada do pet impactou positivamente na saúde mental das pessoas”, relata Bonfim.
De acordo com o último levantamento do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), em 2019, os domicílios no Brasil com algum gato eram 14.144, enquanto com cachorros eram 33.754.
Aline Bernardes de Oliveira, especialista de conteúdo na GPTW, foi uma das que entraram para as estatísticas. Ela também adotou um animal no período de pandemia e aproveitou o benefício da empresa.
Ao CNN Brasil Business, Aline contou que logo após adotar o cachorro Pingado, passou por um período de mudança de apartamento às pressas, além da perda do gato Don. “Foi uma fase muito desafiadora, mas tive todo o apoio para me ausentar quando necessário, fazer a adaptação de todos os animais que dividem a casa conosco e ainda conseguir processar todos os sentimentos que uma nova adoção nos traz”, disse.
Ela hoje também é tutora do cachorro Paçoca, e dos gatos Danny, Dexter e Doug.
“Quando os tutores não conseguem se dedicar à chegada do animal, o resultado muitas vezes, é o abandono. Então é fundamental que haja um tempo de preparo e adaptação para ambos”, avalia Priscila Gonçalves, gerente de Contas da Ogilvy Brasil, que também oferece a PETernidade para seus colaboradores. “As pessoas que adotam um cachorro precisam de tempo e dedicação para se adaptar e ajudar o animal a se acostumar com o ambiente”, lembra Gonçalves.
Beneficiários
Além de gerar satisfação por parte do trabalhador e aproximar a relação de parceria e colaboração entre o funcionário e a empresa, diz Paulo Renato Fernandes, professor da FGV Direito Rio, ele também avalia que é uma forma de reter talentos.
A medida, diz Fernandes, retrata o atual estágio das relações de trabalho, segundo ele de relações colaborativas que se traduz na ideia de aproximar o trabalhador da empresa e gerar satisfação. “Nesse momento de pós-pandemia, as pessoas passaram por muitos traumas e situações de solidão. E os animais exerceram nesse período um papel de parceria”, destaca.
Fernando Luciano, diretor de gestão de pessoas da Vivo, também vê que a conexão com os animais é uma realidade dos novos tempos e, com a pandemia, ficou ainda mais forte.
“Enxergamos a licença PETernidade como forma de estender o cuidado e a atenção também para os animais dos nossos colaboradores, além de estimular a adoção”. Além da licença, a companhia auxilia no contato com ONGs parceiras de acolhimento animal, “com o objetivo de incentivar a adoção consciente dos bichinhos”, disse Luciano.
Letícia Yumi Marques, professora de Direito Animal na Universidade Presbiteriana Mackenzie, explica que as companhias visam construir um ambiente de trabalho mais diverso e inclusivo, estendendo benefícios, que antes eram só percebidos para famílias tradicionais, para diferentes núcleos “homoparentais, monoparentais e de multiespécies”.
Riscos
Os professores alertam contudo, que o risco de oferecer a PETernidade para a empresa é que o benefício não é previsto em lei. Dessa forma, é necessário preencher parâmetros jurídicos para determinar alguns aspectos, como o período da licença e quantas vezes pode ser tirada, “para não ter abuso de má-fé”, diz Renato Fernandes, da FGV.
A licença implica no fato de que a empresa está pagando o dia que o empregado está se dedicando totalmente ao animal.
Por isso, Luciano, da Vivo, determinou regras para controlar e fazer da licença uma boa prática. O funcionário precisa apresentar um certificado emitido por uma ONG que comprove a adoção do animal para ter a licença de dois dias.
Fonte: CNN