A anta é uma empreendedora da natureza. Abre caminhos. Suas trilhas na mata fechada são inigualáveis. É também uma engenheira florestal vegana. Se alimenta de flores e frutos e espalha suas sementes. Por isso, planta florestas e cria habitats para toda a bicharada. E, se não for ameaçada, esbanja docilidade.
Recentemente, uma família de antas foi flagrada no Parque Estadual do Cunhambebe, na Costa Verde, 110 anos depois da espécie ter sido extinta no estado. É o primeiro registro de volta espontânea desse animal ao Rio. Anteriormente, desde 2017, na Reserva Ecológica de Guapiaçu (Regua), em Cachoeiras de Macacu, alguns indivíduos foram trazidos pela Rede para Reintrodução de Fauna e Restabelecimento de Interações Ecológicas (Rede Refauna), onde têm trilhado uma história de sucesso. Lá já há uma saudável população da espécie.
A espécie chega a medir dois metros de comprimento e um de altura, podendo pesar até 300 quilos. Sua característica mais notável é a trombinha, na verdade, um focinho alongado, muito útil para um bicho que adora água. Ela vive nas matas fechadas, mas é excelente nadadora. Os filhotes nascem com os pelos claros, cobertos por listras e pintas brancas, como as do Bambi.
Ela pode ser literalmente cabeça dura, mas nada tem de boba, apesar da fama de pouco inteligente. Coordenador do projeto da reintrodução de antas do Refauna e maior especialista na espécie do Rio, Maron Galliez, do Laboratório de Ecologia e Manejo de Animais Silvestres do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Rio de Janeiro (Lemas-IFRJ), explica que ninguém sabe ao certo por que anta passou a ser sinônimo pejorativo de falta de inteligência.
Uma explicação teria origem nos primeiros exploradores portugueses frustrados por jamais terem conseguido domesticá-la.
“Elas são muito espertas, inteligentes e têm excelente memória. Uma completa injustiça achar que são tolas”, frisa Galliez.
A palavra anta tem provável origem árabe e alude a um cervo sem chifres, ensinava Rodolpho von Ihering (1833-1939) no clássico “Dicionário dos animais do Brasil”. Já tapir, seu outro nome, tem origem tupi.
Em guarani, a anta era mborebi e mborepirape, a trilha aberta por ela na mata e também a Via Láctea, vista como um caminho reluzente no céu. Os cientistas esperam que o retorno das antas ao Rio seja tão brilhante quanto a mborepirape celestial.
Fonte: O Globo