A biodiversidade global diminuiu entre 2% e 11% durante o século 20 devido apenas à mudança no uso da terra, de acordo com um estudo multimodelo publicado na última quinta-feira (25) na revista científica Science. As projeções mostram que as alterações climáticas podem se tornar o principal motor do declínio da biodiversidade em meados do século 21.
A análise, liderada por pesquisadores da Alemanha, com participação de pesquisadores brasileiros da Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC-RJ), é o maior estudo de modelagem desse tipo até o momento.
Os pesquisadores compararam treze modelos para avaliar o impacto das alterações no uso do solo e das alterações climáticas em quatro métricas distintas de biodiversidade e em nove serviços ecossistêmicos.
A mudança no uso da terra é considerada o maior impulsionador da queda na biodiversidade, de acordo com a Plataforma Intergovernamental sobre Biodiversidade e Serviços Ecossistêmicos (IPBES). Para entender melhor o quanto a biodiversidade mudou nas últimas décadas, os pesquisadores modelaram os impactos das alterações no uso do solo na biodiversidade ao longo do século 20.
Utilizando outro conjunto de cinco modelos, os pesquisadores calcularam também o impacto simultâneo das alterações no uso do solo nos chamados serviços ecossistêmicos, ou seja, os benefícios que a natureza proporciona aos seres humanos. Enquanto, no século passado, houve um aumento maciço no fornecimento de serviços, como a produção de alimentos e de madeira, a regulação de serviços como a polinização, a retenção de nitrogênio e o sequestro de carbono, diminuiu moderadamente.
A pesquisa ainda examinou como a biodiversidade e os serviços ecossistêmicos poderão evoluir no futuro. Para estas projeções, acrescentaram aos seus cálculos as alterações climáticas como um fator crescente de alteração da biodiversidade.
“O estudo reforça que a combinação de desmatamento e alterações climáticas é catastrófica, empurrando-nos para um evento de extinções em massa”, afirma Bernardo Strassburg, fundador e cientista-chefe da re.green, pesquisador da PUC-RJ e co-autor do estudo.
Embora as alterações no uso dos solos continuem a ser relevantes, as alterações climáticas poderão tornar-se o fator mais importante da perda de biodiversidade até meados do século. Os pesquisadores avaliaram três cenários amplamente utilizados – desde um de desenvolvimento sustentável até um de emissões elevadas. Em todos os contextos analisados, os impactos combinados das alterações no uso dos solos e no clima resultam na perda de biodiversidade em todas as regiões do mundo. Ainda assim, existem variações consideráveis entre regiões, modelos e cenários mundiais.
Os autores observam que mesmo o cenário mais sustentável avaliado não implementa todas as políticas que poderiam ser postas em prática para proteger a biodiversidade nas próximas décadas. Por exemplo, a implantação da bioenergia, um componente-chave do cenário de sustentabilidade, pode contribuir para a mitigação das alterações climáticas, mas pode simultaneamente reduzir os habitats das espécies. Em contraste, medidas para aumentar a eficácia e cobertura de áreas protegidas ou renaturalização em grande escala não foram exploradas em nenhum dos cenários.
Os modelos estudados podem ajudar a identificar políticas efetivas para mitigar efeitos da crise climática e da perda da biodiversidade. “O copo meio cheio é que o estudo também mostra que as ações para conservar e restaurar a natureza, se combinadas com outras medidas de mitigação climática, fornecem soluções excelentes para enfrentar dois desafios globais simultaneamente, destacando a importância de combinar a natureza e as soluções baseadas na tecnologia para a crise climática”, conclui Strassburg.
Fonte: Revista Galileu