A quantidade de toninhas encontradas mortas na costa em recentes monitoramentos realizados pelo Núcleo de Educação e Monitoramento Ambiental (Nema) e pelo Laboratório de Tartarugas e Mamíferos Marinhos da Universidade Federal do Rio Grande (Furg) está preocupando pesquisadores dos dois órgãos. No monitoramento realizado pelo Nema na última segunda-feira, em 80 quilômetros de praia entre o Molhe Leste e a localidade de Bujuru, em São José do Norte, foram achados mortos 107 exemplares desta espécie, alguns com redes enroladas em seus corpos. Já na saída feita pelo Laboratório da Furg, desde o Molhe Oeste (Cassino) até o Chuí, compreendendo 220 quilômetros, foram verificados mais 134 animais, de diferentes tamanhos.
A toninha é uma espécie de golfinho muito vulnerável, cuja distribuição ocorre do norte do Espírito Santo até a Bahia Blanca, na Argentina. No Rio Grande do Sul, ocorre em toda a zona costeira, principalmente nas áreas de até 30 metros de profundidade. Nasce, se reproduz e se alimenta na costa gaúcha. A preocupação, conforme o biólogo Sérgio Estima, do Nema, acontece porque se trata de um animal ameaçado de extinção, com grande incidência de morte por captura acidental em redes de pesca de emalhe, e a quantidade e tamanho destas redes estão sempre aumentando. Ele e o oceanógrafo Eduardo Secchi, do Laboratório de Tartarugas e Mamíferos Marinhos da Furg, dizem que a grande maioria dos animais desta espécie que aparece morta é vítima de redes de emalhe. E os casos ocorrem principalmente nesta época do ano, durante a captura proposital da corvina. “Na primavera e verão, a corvina encosta mais na beira da praia, onde ocorrem as toninhas. E a captura acidental se torna maior”, observa o biólogo.
Ele relata que a legislação reguladora das redes de emalhe estabelece em 2,5 quilômetros o tamanho permitido, mas está muito ultrapassada. Como este tamanho já não é mais viável economicamente, hoje as embarcações estão utilizando redes de 20 a 30 quilômetros. E com o aumento das redes, foram ampliadas também as chances de captura das toninhas. Eduardo Secchi acrescenta que a captura da corvina atrai muitos barcos pesqueiros de Santa Catarina que utilizam mais de 30 quilômetros de rede. “O recurso pesqueiro colapsado conduz a um aumento no esforço de pesca, ou seja, os pescadores usam redes cada vez maiores. Por onde vão passar as toninhas?”, questiona. Os dois órgãos vêm solicitando ao Ibama e ao Ministério da Pesca que, junto com o setor pesqueiro, façam o ordenamento da pesca de emalhe, única forma de diminuir esse problema.
Sérgio Estima e Eduardo Secchi entendem que a legislação tem que ser revista. “O agravante nesta época do ano é que as fêmeas estão em fase final de gestação e muitas com filhotes. É um período crítico porque a captura nas redes retira fêmeas da natureza no momento reprodutivo da espécie”, alertou Estima. Dos 107 animais encontrados mortos pelo Nema, seis eram filhotes. Este tipo de golfinho nasce com 60 centímetros de comprimento e chega, na fase adulta, a 1,7 metro. Os achados pelo Nema variavam entre 72 centímetros e 1,65 metro. Os pesquisadores dizem que a intenção não é acabar com a pesca, que é uma importante atividade econômica, mas acreditam que é preciso ordená-la. Isso porque a corvina está declinando e o aumento das redes é mais ameaça às toninhas.
Vulnerabilidade
O Laboratório de Mamíferos Marinhos vem monitorando esse problema desde o início da década de 90. “A toninha, como todos os golfinhos, tem capacidade reprodutiva baixa. Reproduz há cada dois anos e tem longevidade curta. Raramente chega a 20 anos de idade. A grande maioria dos indivíduos mais velhos não ultrapassa 10 ou 12 anos de idade. Ela começa a reproduzir com quatro anos. É a espécie de cetáceos (grupo que inclui baleias e golfinhos) mais ameaçada de todo o Oceano Atlântico Sul-Ocidental. A mortalidade não natural leva a um declínio e persistindo o problema, pode ocasionar sua extinção”, destaca Eduardo Secchi. Estudo realizado pelo Laboratório da Furg junto com o Grupo de Mamíferos Aquáticos do Rio Grande do Sul mostra que esta espécie está declinando.
No estudo, foram feitas duas estimativas de abundância, através de levantamento aéreo, para saber quantas toninhas existem no Rio Grande do Sul. Estas estimativas foram comparadas com o que está sendo retirado pela pesca. E a conclusão foi de que a população deste animal no Estado está em declínio. “Alguma coisa precisa ser feita em termos de ordenamento da pesca”, alertou.
Fonte: Jornal Agora
Nota da Redação: “Os pesquisadores dizem que a intenção não é acabar com a pesca, que é uma importante atividade econômica, mas acreditam que é preciso ordená-la”. A frase mostra a triste inversão de valores e conceitos da atualidade. Ainda prevalece a importância da economia e da ganância humana sobre a vida de qualquer espécie. A pesca deveria, sim, ser extinta e substituída por outras atividades econômicas. A toninha está em extinção porque foi, um dia, tratada com descaso, como acontece agora com a corvina, por exemplo. Uma espécie não vale mais do que a outra porque preserva um número menor de espécimes. Todas as formas de vida devem ser respeitadas.