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DESEQUILÍBRIO

Efeitos negativos de queimadas e extração de madeira na amazônia perduram por décadas, mostra estudo pioneiro

Queda no número de espécies e na interação entre fauna e flora aponta riscos para o futuro da floresta

25 de junho de 2025
Eduardo Geraque
12 min. de leitura
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Incêndio na Terra Indígena Kayapó (Pará), na floresta amazônica, em setembro de 2024. Foto: Marizilda Cruppe/Greenpeace Brasil/Divulgação

É na pequenez das sementes que residem as grandes árvores das florestas de amanhã. E, no caso das árvores mais grandiosas dentre todas —aquelas que compõem as florestas tropicais, como a amazônica—, este futuro também depende dos animais. Nestes biomas, até 90% das espécies vegetais necessitam das interações com animais para completar seu ciclo de vida.

No caso da maior floresta tropical do planeta, a lista de espécies que se alimentam dos seus frutos carnosos inclui de aves a primatas e morcegos, o que torna essas relações ecológicas absolutamente fundamentais para a preservação do bioma.

Estas relações são objeto de estudos atentos por parte dos ecologistas. Mas, no caso da amazônia, outros importantes fenômenos, como as queimadas constantes e a retirada massiva de árvores, têm ocorrido de forma crescente desde os anos 1990. Estas mudanças tornam mais complexo o quadro da interação entre as espécies, obrigando os estudiosos a mergulharem em pesquisas minuciosas para entender o que, de fato, está ocorrendo no dia a dia da serrapilheira amazônica.

A bióloga Liana Chesini Rossi dedicou sua pesquisa de doutorado, cursado no Programa de Ecologia e Biodiversidade do Instituto de Biociências da Unesp, Câmpus de Rio Claro, para investigar até que ponto a frequência maior de queimadas e a extração de madeira estão impactando as interações de frugivoria (nas quais animais se alimentam de frutos das plantas e depois dispersam as sementes em suas fezes) na amazônia.

Rossi atualmente é pós-doutoranda no Jardim Botânico do Rio de Janeiro, e os resultados do estudo foram divulgados em um artigo publicado na revista Oikos.

“É a primeira vez que um estudo produz uma avaliação tão abrangente no campo das interações ecológicas —no caso, frugivoria— para a amazônia”, explica Rossi. “E é pioneiro em examinar os efeitos, em um prazo mais longo, do fogo sobre essas interações em florestas tropicais”, diz.

A pesquisa também está inserida no Programa de Monitoramento Ecológico de Longa Duração do CNPq (Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico), no âmbito do projeto coordenado pela Rede Amazônia Sustentável.

Esperava-se, diz ela, que o estudo constatasse a ocorrência de impactos negativos sobre a biodiversidade em áreas que foram incendiadas ou onde ocorreu alguma extração de madeira. A gravidade dos dados finais, porém, superou as expectativas.

“O estudo mostra que, mesmo passados 20 anos, as interações observadas ainda são simplificadas. Envolvem menos espécies, e elas interagem menos entre si”, explica. “Isso é preocupante, porque essas interações são fundamentais para a regeneração e a consequente manutenção da floresta.”

A investigação abrangeu mais de 1.500 horas de observações focais, além de 30 mil horas de monitoramento por armadilhas fotográficas situadas na região da amazônia brasileira.

Nas áreas impactadas há quase 20 anos, constatou-se, em média, uma redução de 16% nas espécies de frugívoros e um declínio de 66% no número de interações de frugivoria. As mudanças na composição da fauna incluem até o desaparecimento de diferentes espécies, como o pássaro cujubi (Aburria cujubi), o primata coatá-de-testa-branca (Ateles marginatus) e a anta (Tapirus terrestris), fato que chamou a atenção dos cientistas.

O foco da pesquisa recaiu sobre quatro classes de floresta: intacta, explorada, explorada e queimada há 17 anos (queimada 17 anos antes da amostragem) e explorada e queimada há 3 anos (contados antes da amostragem). As florestas intactas sustentaram um número significativamente maior de espécies e interações em comparação com as florestas exploradas e queimadas há 17 anos, e resultaram em números semelhantes às florestas apenas exploradas ou exploradas e queimadas há 3 anos.

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