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Educação vegana versus bullying

9 de setembro de 2011
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Atualmente tem se destacado demasiadamente os casos de bullying nas escolas, em especial quando resultam em lesão corporal grave ou homicídio (1).

As características clássicas dos bulidores são: personalidade autoritária, necessidade de domínio das situações em que se encontram, facilidade em se enraivecer e resolver os problemas de maneira agressiva usando a força bruta e sucessivamente, obsessão na promoção da autoimagem e visão preconceituosa sobre os que se encontram em estado de vulnerabilidade. As vítimas, por outro lado, geralmente são tímidas, de biotipo aparentemente frágil, adeptas de um estilo musical não muito comum ou em minoria naquele ambiente, esteticamente fora dos padrões socialmente determinados, seguidoras de uma crença religiosa oposta à do bulidor, oriundas de outra região do país trazendo consigo o regionalismo linguístico (foco de ataque do bulidor), de condição socioeconômica vulnerável, e com paupérrimo capital cultural (ou o contrário, assediado por apresentar-se intelectualmente mais adiantado).

As condições em que o bulimento se materializa também já foram bastante divulgadas pelas mídias com o intuito de que professores e pais intervenham e acabem com tal prática. No entanto, tenho a impressão de que tudo não passa de uma jardinagem malfeita; preocupa-se com o podar da copa e ignora que o que dá forma a todo o arbusto é o cuidado com o solo.

Não é necessário ser versado em psicanálise para saber que toda violência física, moral e simbólica levada a cabo por adultos tem sua gênese na infância. Ou seja, a criança e o adolescente bulidor de hoje têm forte tendência em se tornar o pai e marido violento de amanhã. As meninas não ficam de fora dessa triste constatação, em algumas escolas elas são muito mais violentas que os meninos. No que se refere a submeter o outro a humilhação moral, elas sempre foram mais bem dotadas, já que o intimidar pela força física fica a cargo da tradição machista.

Mas onde entra a educação vegana formal de base nessa história? Bom, a minha experiência educacional tem me levado a crer que uma criança ou adolescente que tem o hábito de defender uma pessoa de outra espécie não temeria as ameaças, intimidações e humilhações dos bulidores. Se desde a mais tenra idade a criança é formada no princípio da não violência (ahimsa), no respeito ao outro, e nesse outro entendemos humanos e não humanos, incluindo obviamente os ecossistemas naturais. Se a criança é constantemente levada a entender e compreender que todos os seres sencientes que se encontram em estado de vulnerabilidade merecem ser protegidos de tudo o que lhes causa um mal, e que ela mesma está em situação semelhante, é muito pouco provável que ela pratique o bulimento com os outros.

Estou me referindo àquelas crianças que não tiveram sua empatia pelos outros animais castrada pelos pais e professores. Regan diz que poucas pessoas nascem vincianas, algumas são damascenas e que a maioria esmagadora dos DDAs foram relutantes (2). Assim como o pensador estadunidense utiliza fortemente o recurso à analogia para apresentar suas teses em defesa dos direitos morais para humanos e não humanos; as crianças – pelo menos é o que minha experiência tem constatado – são exímias especialistas em fazer analogias. Cabe aos educadores veganos explorarem essa capacidade infantil e fazer nascer ali o damasceno adormecido, e dentro do possível já introduzir faíscas de raciocínio ético.

Não estou dizendo que os educadores veganos devem dar aula de bioética nos moldes acadêmicos para as crianças, estou dizendo que a empatia delas deve ser fortalecida com o raciocínio ético via recurso à analogia, prática comum infantil. Alguns leitores podem pensar que estou sendo muito rousseauniano aqui; e estou. Acredito que o ser humano nasce bom e que a sociedade o corrompe. “As crianças são sensatas. Reagem ao amor com amor, e reagirão ao ódio com ódio. (…) Eu afirmo que a maldade não é básica na natureza humana, como não é básica na natureza de um coelho ou de um leão. Encadeie um cão, e um bom cão se tornará mau. Discipline uma criança e uma criança boa e sociável torna-se um odiento, mau e insincero. É penoso, mas a maior parte das pessoas está segura de que um mau menino deseja ser mau”(3).

Era prática comum na Grécia antiga comparar o filósofo com a criança, pois os dois vivem dos porquês. Infelizmente, hoje, a prática comum é podar/castrar as maravilhosas dúvidas e questionamentos das crianças, e com isso levá-las ao abandono gradual do espanto com o óbvio, a abandonar sua empatia natural em troca da frieza, grosseria, hostilidade e violência. A Paideia aristotélica nos ensina que é através da mimesis que se dá todo processo educativo, ou seja, a virtude só é praticada após ver o mestre praticando e é na prática da virtude que nos tornamos virtuosos. É necessário que os educadores veganos criem uma estrutura estruturante de um habitus não violento e respeitoso.

Crianças formadas dentro dos princípios pacíficos da ética animal e ambiental terão condições emocionais e intelectuais para se proteger dos assédios intimidadores dos bulidores e muito provavelmente não se tornarão praticantes do bulimento. Mas não podemos ignorar a agressão física que acompanha boa parte dos assédios.

Como as crianças podem se defender numa situação dessas em que não há um adulto por perto e a “diplomacia” e força de espírito da criança não conseguem fazer frente ao bulidor? Uma saída esta na prática marcial. Artes como jiu-jítsu, judô, kung-fu e aikido são excelentes meios de combater o bulidor sem o agredir, apenas colocando-o no seu devido lugar. O jiu-jítsu, por exemplo, foi criado por monges budistas, adeptos da não violência; o aikido, segundo Morihei Ueshiba, seu fundador, não consistia em uma prática marcial, e sim em uma Arte da Paz: “Aikido não é uma técnica para lutar com ou derrotar o inimigo. É o caminho para reconciliar o mundo e fazer dos seres humanos uma só família”. (…) “O segredo do Aikido não está em como você move seus pés, e sim em como você move a sua mente. Eu não estou ensinando técnicas marciais. Eu estou ensinando a vocês a não violência” (4).

Fala-se tanto hoje em dia que devemos combater o bullying. Eu já disse, mas vale a pena repetir: veganismo também é um esporte de combate 5. Educação vegana de base pode ser o caminho.

Referências

1. Vejam as películas: “Bullying – Provocações sem limites” (Bullying, Espanha, 2009, 93 min). Direção: Josecho San Mateo. E “Tiros em Columbine” (Bowling for Columbine, EUA, 2002, 120 min). Direção: Michael Moore. O caso de Columbine teve sua versão brasileira no caso de Realengo, Rio de Janeiro. Penso que a bióloga e educadora Ellen A. V. de Freitas nos deu uma pista do motivo pelo qual tudo isso ocorre em:
https://www.anda.jor.br/2011/09/07/%E2%80%9Ctive-fome-e-nao-me-destes-de-comer-tive-sede-e-nao-me-destes-de-beber%E2%80%9D/
2. REGAN, Tom. Jaulas Vazias. Porto Alegre: Lugano, 2006. p. 25-44.
3. NEILL, A. S. Liberdade sem medo. São Paulo: Ibrasa, 1980. p. 148.
4. Disponível em: http://www.aikidobr.com.br/aikido/
5. http://www.sociedadevegana.org/index.php?option=com_content&view=article&id=23:educar-para-o-veganismo-enfrentar-ou-recuar-&catid=17:educacao&Itemid=5. Nesse texto da sociedade vegana uso os princípios do jiu-jítsu e do judô para inspirar os educadores veganos no combate ao corpo burocrático especista escolar. No texto acima vejo que os princípios podem muito bem ser usados pelo educando.

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