Oras, após todo o sólido e embasado discurso sobre a sustentabilidade ambiental, ainda é preciso discutir a produção de animais como matéria-prima para a indústria? Sim. A carne é fraca desvenda o processo de transformação de uma vida em bife. Neste segundo bloco de informações do filme, o assunto é a ética e as condições humilhantes em que animais são criados, explorados desde o momento de seu nascimento. São selecionados e descartados da maneira mais impiedosa possível quando não interessam à indústria, largados às quantidades imensas para que morram à mingua, descartados como se fossem objetos. São violados em todos os seus direitos de ter uma vida natural, reproduzir-se livremente, procurar seu próprio alimento e até de coisas tão básicas como o sono. São criados em baias tão minúsculas que mal conseguem ficar em pé.
As aves sofrem com a utilização de processos de engenharia de produção em larga escala como a “debicagem”, nome técnico para o absurdo de serrar o bico das aves para que elas não se matem umas às outras devido às condições de maldade permanente nos criadouros. Isto também as obriga a se alimentar de forma contrária à sua natureza. Em vez de comer de bicada, passam a comer de bocada, não trituram os alimentos e engordam mais. Os espaços dos criadouros são verdadeiros campos de concentração: áreas minúsculas onde jamais haverá acesso, na quase totalidade das vezes, sequer à luz solar. E isso vale igualmente para a produção de suínos, gado e vacas leiteiras. Suas doenças individuais como as causadas por excesso de peso não são tratadas, obrigando-os a conviver por toda a vida com dores e feridas. As fêmeas são privadas do convívio com seus filhotes, o que vale como regra geral para o setor leiteiro.
A carne é fraca é, segundo sua idealizadora Nina Rosa, um filme que ela mesma preferiria que não fosse necessário. Até em questões óbvias ele assume a postura educativa de recordar aos consumidores, por exemplo, que somente uma vaca prenha é capaz de dar leite. Além de passar a vida toda prenha, a vaca é utilizada como objeto para dar leite, diariamente submetida ao bombeamento de suas tetas, cujas infecções causam imensas dores. A contaminação do leite se dá por hormônios e antibióticos ministrados por criadores e veterinários além, evidentemente, das secreções comuns às feridas purulentas provocadas pela extração de leite. É realmente lamentável que seja preciso explicar isto a adultos, que inclusive alimentam seus filhos com este mesmo produto. E o que é feito com os bezerros nascidos destas vacas? Primeiramente são impedidos de mamar. Depois, ou são simplesmente descartados e abandonados à morte por fome e falta de abrigo como “coisas” ou vão para outra indústria ainda mais sanguinária: a do “baby beef”. Estes filhotes são criados sem condições de se movimentar para não criar músculos e abatidos logo, com poucos meses de vida. Nina Rosa afirma que o “baby beef” é um “produto” da maldade humana com pouco público consumidor no Brasil e insiste para que não seja consumido, eliminando dessa forma as variações macabras inventadas pela indústria de alimentos a partir da tortura e exploração de filhotes. Ainda nas palavras de Nina Rosa: “o mercado de vitela é conhecido como um dos mais imorais e repulsivos mercados de animais do mundo”.
O capítulo sobre a realidade do abuso traz o depoimento de importantes pesquisadores e imagens impressionantes obtidas nos criadouros e matadouros. Em uníssono, os depoimentos selecionados são prova de que é possível viver longe deste mercado, defendem a legitimidade dos direitos dos animais e a necessidade urgente de cessar a exploração. A professora titular de anatomia da USP, Irvênia Prada, comenta a condição de pânico a que estes seres indefesos são submetidos no transporte, no encaminhamento para o abate, a escravidão pertinente às atividades meramente econômicas como a pecuária. Sônia Felipe, professora de ética e filosofia da UFSC, alerta para uma ação simples que todo cidadão tem ao alcance das mãos para acabar com isso: “O mercado é o grande campo de reflexão política quando se tem que abolir um costume pelo fato de ele ser moralmente injustificável, porque é no supermercado que eu alimento o trabalho e o sistema de produção daquelas mercadorias”.