Assunto polêmico e controverso. Todos já ouvimos falar que dormir com animais pode fazer mal à saúde dos humanos, e a grande maioria de médicos e veterinários concorda com essa afirmação. Mas também, humanos podem transmitir algumas doenças aos não humanos, resultantes de bactérias, fungos e vírus. E a boca de um cão pode ter menos bactérias e germes do que a boca de um humano.
Segundo o veterinário Dr. Fernando Carneiro Cavalcante, da Clínica Veterinária São Miguel: “há várias doenças que podem passar do homem para o animal e do animal para o homem – como exemplo são: raiva, brucelose, listeriose, salmonelose, tuberculose, leishmaniose, etc.. Nessas duas últimas, para a transmissão, basta o animal lamber a saliva de um humano infectado ou um mosquito palha picar uma pessoa doente e depois picar um animal. Esse elo de possibilidades existe com relação a outras doenças. Tudo depende do equilíbrio imunológico”. A Drª Débora Santoro, da mesma Clínica, afirma que cães podem ter menos bactérias na boca do que seres humanos, dependendo do caso: “Há raças de animais com predisposição à formação de tártaro (placa bacteriana), como o yorkshire, coker, lhasa apso, etc., que necessitam de escovação diária dos dentes e uso de ração específica, para evitar a formação do tártaro. Mas, de uma forma geral, apenas a escovação semanal já basta para o combate às bactérias da boca do animal”. E, ensina o Dr Fernando: “as bactérias e outros germes sediados na boca, constituem a principal fonte de infecção do organismo – isso é fato comprovado. Porém, pela conformação e disposição da arcada dentária, o animal tende a acumular menos detritos nos dentes, e isso ocasiona menos desenvolvimento bacteriano”.
Pode parecer esquisito que algumas pessoas gostem de dormir com seu bicho, mas esse comportamento, atualmente, é muito comum. Dados da pesquisa Radar Pet, realizada em 2012 pela Comac (Comissão de Animais de Companhia), do Sindan (Sindicato Nacional da Indústria de Produtos para Saúde Animal), em sete capitais brasileiras, mostrou que no Brasil 55% dos cães dormem dentro de casa. De acordo com a mesma pesquisa Radar Pet, 23% dos cães dormem no quarto dos tutores. Outros 12% têm dormitório só para eles. Há ainda 11% que dormem na sala e 9% ficam no banheiro ou lavanderia. Nos EUA, 60% dos lares têm animais de estimação (americanos gastam mais dinheiro em comida de cão do que em comida de bebê). Desse total, cerca de 78 milhões são cães e 86 milhões são gatos e, segundo o American Pet Products Association, quase metade dos cães dormem nas camas de seus tutores sendo que 62% dos tutores de cachorros pequenos dormem com o animal e 32% das pessoas que têm animais maiores admitiram dormir com o bicho.
As vantagens em conviver com um animal são inegáveis, e essa convivência traz ganhos para a saúde física e psicológica dos seres humanos. Segundo Marty Becker, médico veterinário americano, autor de “O Poder Curativo dos Bichos”: “por meio de um relacionamento íntimo com nossos animais, despertamos em nós características poderosas como lealdade, amor, instinto e jovialidade”.
Os animais oferecem companhia e amor, sem as exigências dos seres humanos, além de aceitarem seus tutores sem nenhum julgamento. Os benefícios, em termos de saúde física e/ou mental, resultantes do convívio entre humanos e bichos têm sido relatados em pesquisas científicas.
Abaixo alguns desses resultados:
– segundo relatório da Associação Americana do Coração, conviver com um animal reduz o risco de doenças cardíacas. Testes determinaram que uma pessoa que sai para passear com seu cachorro cumpre 54% dos níveis recomendados de exercícios diários, favorecendo o funcionamento do sistema cardiovascular. Nesse sentido, pesquisadores da Universidade de Sydney, Austrália, recomendam que as pessoas caminhem com seus cães no mínimo 150 minutos por semana. Além de manter o coração saudável, a caminhada melhora a disposição;
– os bichos diminuem o estresse, baixando a frequência cardíaca, a pressão arterial e o colesterol. O professor Warwik Anderson, da Universidade de Sydney, Austrália, descobriu que os tutores de cães e gatos têm taxas mais baixas de triglicérides e colesterol do que os não tutores;
– outros estudos sugerem que acariciar um animal reduz os níveis de estresse. Isso ocorre porque, ao passar a mão pelo corpo do animal, o organismo libera oxitocina, um hormônio relacionado ao vínculo emocional. Esse processo gera uma sensação de calma e bem estar em ambos, tutor e animal;
– estudos recentes apontam que crianças entre cinco e doze anos que convivem com animais, possuem mais sensibilidade e compreendem melhor os sentimentos de outras pessoas – têm mais empatia;
– segundo o médico Ganesha Wegienka, do Henry Ford Hospital, que conduziu uma pesquisa, em entrevista ao jornal Daily Mail: “a exposição de crianças a animais de estimação no primeiro ano de vida reduz pela metade a chance do bebê desenvolver alergias respiratórias”;
– pesquisadores do Sistema de Saúde Henry Ford em Detroit concluíram que crianças com idades entre seis e sete anos reagiam menos à agentes alergênicos comuns se elas foram expostas a dois ou mais gatos ou cachorros quando essas tinham um ano de idade. Eles também descobriram que crianças, durante a fase de bebê, que estiveram em contato com animais de estimação, tinham melhor funcionamento pulmonar. O contato com gatos ou cães faz com que bebês tenham menos chance de desenvolver doenças alérgicas tais como, asma, eczema e rinite alérgica;
– pesquisadores da Finlândia comprovaram que crianças que mantinham mais contato com animais gozavam de um sistema imunológico mais forte e corriam menos riscos de sofrer de doenças respiratórias infecciosas;
– em seu livro “La Ronron Thérapie”, a jornalista francesa Véronique Aïache, devidamente baseada em trabalhos científicos, explica: o veterinário francês Jean-Yves Gauchet testou o poder do ronrom dos gatos em 250 voluntários, submetidos a uma gravação de 30 min do ruído de Rouky, o gato do veterinário. Ao fim do estudo, os participantes declararam sentir mais bem estar, serenidade e uma facilidade maior para dormir. No ano passado (2012), a Apple lançou em parceria com o veterinário Gauchet um aplicativo para iPhone que usa o ronrom para amenizar os efeitos que a diferença de fuso horário provoca em viagens;
– outros estudos mostraram que pessoas com hipertensão ou obesidade também podem se beneficiar da companhia dos bichos e até crianças com autismo, surdez e gagueira se desenvolveram melhor ao lado de cães e gatos;
– segundo um estudo publicado no British Medical Journal, quem convive com um animal tem mais disposição. 82% dos tutores declararam que seu cão ou gato os faz sentir melhor quando estão tristes. Brincar com os animais eleva os níveis de serotonina e dopamina e diminui os de cortisol;
– tutores de animais possuem oito vezes mais probabilidades de sobreviver um ano após um infarto. Um estudo realizado por Érika Friedman e Sue Thomas, 1995, identificou que, tutores de cães tinham sobrevida maior depois de um ataque do coração do que não tutores. Para esses pacientes, a ideia de voltar para casa e contar com a companhia e afeto de seus bichos aumentava a sensação de bem estar, que se traduzia em uma maior expectativa de vida;
– de acordo com outros estudos, animais podem ensinar e orientar as crianças que sofrem de transtorno do déficit de atenção com hiperatividade (TDAH), ao criar uma rotina de atividades diárias. Alimentar os animais, banhá-los e levá-los para passear, pode ajudar essas crianças a relaxar e a aumentar a interação social.
Além dos muitos benefícios que trazem à vida dos tutores, os animais estão, cada vez mais próximos dos seres humanos, e esses fazem de tudo para agradá-los. Esses estreitos relacionamentos criam vínculos fortes e duradouros e pode até haver dependência do humano em relação ao bicho. Num estudo da “My Social Petwork” com 2000 pessoas na Inglaterra, a maioria dos tutores prefere a companhia dos seus bichos à dos seus amigos humanos. Além disso, 90% preferem trocar carinhos com seus animais e um em cada cinco tutores já cancelou compromissos para ficar com seu cão ou gato. Para os tutores da pesquisa é natural fotografar e compartilhar fotos dos bichinhos.
Sendo assim, os animais estão deixando os quintais para participarem do dia a dia das pessoas dentro de seus lares. E quanto a dividir a cama com o bicho de estimação? O Dr. Fernando Carneiro Cavalcante afirma que “do ponto de vista médico, não é recomendado dormir com animais na cama, mas desde que haja higiene rigorosa dos bichos, é possível conviver dessa forma”. Segundo a Drª Débora Santoro: “eu, como pessoa e como veterinária aceito que o animal durma na cama do tutor, e receba muito amor e carinho, desde que haja higiene adequada do bicho e do ambiente – limpeza das patinhas (cães e gatos); vermifugação correta; aplicação de antipulgas e carrapatos mensal; vacinação correta anual; banhos semanais nos cães e mensais nos gatos”.
Grande parte dos tutores afirma que adora dormir com seu cão ou gato! Caso o tutor decida dormir com seu animal, os veterinários alertam para a verificação da saúde do animal: sem pulgas ou carrapatos, a vacinação deve estar em dia, banhos com a frequência indicada pelo veterinário (com limpeza dos ouvidos) e os vermífugos precisam ser aplicados no prazo correto. Outra providência é trocar as roupas de cama todos os dias. E, deve-se lavar e secar muito bem as patinhas do bicho depois do passeio na rua, no caso de cães – no caso de gatos, lavar as patinhas após o uso da bandeja sanitária. E, obviamente, o animal deve passar por consultas periódicas com o veterinário. Portanto, seguindo essas regras, dormir com o animal é uma atitude pessoal, levando-se em conta que as vantagens e desvantagens também passam por questões emocionais.
Porém, a consequência de amar profundamente o animal de estimação, vai muito além de dormir com ele – mas tratá-lo com respeito, cuidar dele responsavelmente no âmbito de sua própria espécie, castrar, vermifugar, vacinar, telar janelas, levá-lo ao veterinário, passear, brincar, afagar, prover a limpeza dos dentes e banhos, escovar, cuidar da alimentação e, principalmente, jamais abandoná-lo sob nenhuma circunstância: ampará-lo na doença e na velhice.