Destruição de habitat, mudança no uso da terra e eventos climáticos extremos, entre outras ameaças de origem humana, estão reduzindo a diversidade genética de espécies de todos os reinos, o que coloca em risco uma variedade de animais, plantas, fungos e algas em todo o planeta. No maior estudo global já realizado sobre o tema, um grupo internacional de pesquisadores descobriu que dois terços das populações analisadas em três décadas já foram impactadas, embora menos da metade receba alguma estratégia de conservação.
Liderada pela Universidade de Sydney, na Austrália, a equipe avaliou dados de 628 espécies de 141 países, incluindo o Brasil. “A perda de diversidade genética ocorre globalmente e é realidade para muitas espécies, especialmente pássaros e mamíferos. Nossas descobertas ressaltam a necessidade urgente de intervenções de conservação para deter esse fenômeno”, escreveram os autores, em um estudo publicado na revista Nature.
Em nota, a autora correspondente, Catherine Grueber, destacou a importância da diversidade genética para a adaptação das espécies. “Se uma nova doença surgir, ou houver uma onda de calor, alguns indivíduos na população podem ter certas características que os habilitam a tolerar essas novas condições. Essas características serão passadas para a próxima geração, e a população persistirá em vez de se extinguir”, escreveu.
“É preciso ter em mente que a perda da variabilidade pode ser o primeiro passo para o declínio e extinção de uma espécie e que cada eliminação, mesmo que local, altera o funcionamento do sistema de relações em que cada espécie opera e, portanto, aumenta a probabilidade de colapso de todo o sistema”, reforça o ecólogo Jorge M. Lobo, especialista em biogeografia e mudanças climáticas, que não participou do estudo.
Eliminação em massa
O ritmo da perda da biodiversidade nas últimas décadas não tem precedentes na história, e alguns cientistas acreditam que a Terra enfrenta a sexta extinção em massa, dessa vez, causada por atividades humanas. Os acordos internacionais reconhecem a diversidade em três níveis: ecossistema, espécie e genética. Essa última é, segundo Grueber, “crítica para a aptidão individual e populacional e, portanto, para a sobrevivência a longo prazo de populações e espécies, o que garante a resiliência dos ecossistemas”. Na Conferência da Biodiversidade de 2022, a COP15, em Montreal, foram definidas, pela primeira vez, metas para garantir a variedade de genes de todos os organismos vivos.
O problema é que a atividade humana, como degradação de habitat e colheitas insustentáveis, estão acentuadas, e não apenas entre espécies raras e ameaçadas. Um estudo recente publicado na revista Evolutionary Applications detectou cerca de 6% de perda de diversidade genética em populações de 91 tipos de animais ao longo do último século. O Índice Planeta Vivo, um indicador da biodiversidade global gerido pela Sociedade Zoológica de Londres, estima que muitas plantas e animais já estão 10% menos adaptáveis a perturbações ambientais.
Ao mesmo tempo, os esforços de conservação têm se mostrado insuficientes, constatou o estudo, que avaliou políticas específicas para os mais de 600 animais e plantas incluídos no artigo. Entre as principais medidas que podem ajudar a preservar a diversidade genética, os autores apontam translocações — quando espécimes são movidos entre populações para beneficiar uma espécie ou ecossistema; restauração de habitat, controle populacional e monitoramento de pragas e espécies invasoras.
Os autores também ressaltam as ações bem-sucedidas. Eles destacam a reintrodução do marsupial bandicoot-dourado (Soodon auratus) em áreas na Austrália Ocidental, a liberação de raposas árticas de programas de reprodução em cativeiro na Escandinávia, a translocação de galinhas-da-pradaria maiores para populações na América do Norte e o tratamento eficaz de doenças em populações de cães-da-pradaria de cauda preta, o que melhorou a saúde das colônias nos Estados Unidos.
Sem complacência
A coautora, Robyn Shaw, da Universidade de Canberra, porém, diz que há muito mais a se fazer. “Apesar dos sucessos, não podemos ser complacentes. Dois terços das populações analisadas estão enfrentando ameaças e, entre essas populações, menos da metade recebeu qualquer tipo de gerenciamento de conservação. É vital que aprendamos com o que está funcionando para que possamos proteger as espécies a longo prazo.”
Ainda assim, Jesús Muñoz Pajares, professor de Genética na Universidade de Granada, na Espanha, diz que “ainda há algum espaço para esperança, apesar do futuro incerto dos seres vivos em nossos planetas”. “Primeiro, porque os protocolos existentes para monitoramento de espécies são eficazes e permitem identificar perdas de diversidade com antecedência suficiente para tomar medidas”, diz. Ele também lembra que, quando recomendações dos especialistas são seguidas, é possível interromper ou reverter a biodiversidade genética.
“Com os resultados fornecidos pelos pesquisadores, podemos, portanto, confirmar que sabemos que a biodiversidade está em perigo, que sabemos como monitorá-la e que sabemos como conservá-la”, diz Pajares. “A ciência fez a sua parte, mas ainda exige ações urgentes para salvar (pelo menos parte) da fabulosa diversidade da vida na Terra.”
Intervenções científicas
“A biodiversidade continua a ser perdida em todo o mundo a uma taxa sem precedentes. Manter a diversidade genética é essencial para proteger a biodiversidade contra futuras mudanças ambientais. Prevenir a perda de diversidade genética é um grande desafio global para a biodiversidade. Esse fenômeno está ocorrendo globalmente, uma descoberta que ressalta a necessidade urgente de intervenções de conservação ativas e baseadas no conhecimento científico genético para deter a perda de diversidade genética”, reforça Pablo Orozco-terWengel, pesquisador da Universidade de Cardiff, no País de Gales.
A biodiversidade continua a ser perdida em todo o mundo a uma taxa sem precedentes. Manter a diversidade genética é essencial para proteger a biodiversidade contra futuras mudanças ambientais. Prevenir a perda de diversidade genética é um grande desafio global para a biodiversidade. Esse fenômeno está ocorrendo globalmente, uma descoberta que ressalta a necessidade urgente de intervenções de conservação ativas e baseadas no conhecimento científico genético para deter a perda de diversidade genética.
Fonte: Correio Braziliense