A biodiversidade angolana corre o risco de desaparecer. O alerta é do diretor nacional da Biodiversidade, do Ministério do Ambiente de Angola. Em entrevista, Soki Kuedikuenda queixou-se da poluição dos mares pelas empresas petrolíferas e da caça. Soki Kuedikuenda lembrou que está em vigor, desde 2007, a Estratégia e Plano Nacional para a Biodiversidade, que marca o início de uma nova fase na conservação e uso sustentável da biodiversidade no país.
O que a Direção Nacional da Biodiversidade tem feito para a preservação das espécies?
Para a preservação das espécies, estamos trabalhando em duas direções, a primeira para conhecer as espécies e saber em que estado se encontram. Precisamos conhecer a densidade das populações, a sua dinâmica e as pressões que essas espécies sofrem por parte da população. Outra direção consiste na preservação ativa. Estamos também trabalhando no sentido de criar novas áreas de conservação. Não há melhor forma de preservar as espécies do que criar áreas de conservação.
E quanto à proteção nos parques nacionais?
O Ministério do Ambiente tem um projeto que consiste na criação de novas áreas de conservação. Já foram escolhidas as áreas ou províncias ecológicas onde vão ser criadas essas áreas. São, sobretudo, as províncias onde temos florestas. Angola tem seis parques nacionais, mas esses encontram-se em três biomas.
O que são biomas?
São conjuntos de diferentes ecossistemas, comunidades biológicas ou populações de organismos da fauna e da flora, o que quer dizer que há mais de três biomas que não têm áreas de conservação ou parques nacionais. O objetivo é ter uma área de conservação em cada bioma. Os biomas mais necessários são as províncias do Norte e os das montanhas no Planalto Central. Já estamos fazendo os trabalhos na província de Cabinda, e também estamos elaborando os termos de referência para as províncias do Zaire, Uíge, Kwanza-Norte, Huambo e Huíla. Estas foram escolhidas como cidades ecológicas de Angola.
Em 2002, o Ministério do Ambiente aprovou o projeto da Palanca Negra Gigante. Atualmente, qual é a situação?
As buscas da Palanca Negra Gigante continuam. Os animais já foram colocados no santuário que se encontra no interior do Parque Nacional de Cangandala (Malange). Felizmente, estão evoluindo positivamente. O mesmo acontece com as palancas que se encontram na Reserva Natural do Luando (Malange/Bié). Do ponto de vista técnico, ainda há muito que fazer, para a preservação das áreas que são o habitat natural do animal e da preservação da própria espécie. O Ministério do Ambiente, com os seus parceiros, elaborou um novo projeto em colaboração com vários setores, projeto este que consiste numa maior e melhor conservação desta importante espécie. Atualmente temos no Parque Nacional de Cangandala oito fêmeas e um macho, onde se reproduzem, enquanto na reserva do Luando ainda estamos identificando o número de fêmeas e machos.
A biodiversidade marinha e costeira está sendo preservada?
Existe um acompanhamento ativo da parte do Instituto Nacional de Investigação Pesqueira (INIP) para a descrição do meio e a avaliação das espécies. Felizmente, esta é uma área onde fortes medidas foram tomadas contra os que atentavam contra as espécies marinhas e contra os poluidores da costa, as companhias petrolíferas. Não temos muitos problemas nessa área, porque a gestão por parte do setor das pescas tem sido muito rigorosa.
Quais são as principais ameaças à biodiversidade em Angola?
No que toca à biodiversidade marinha, temos as atividades da pesca, poluição intensa, atividades petrolíferas e o próprio transporte marítimo. Na biodiversidade terrestre existe a agricultura e a urbanização agrícola, que constituem grandes ameaças à flora e à fauna. O nosso país tem um desenvolvimento populacional muito célere em detrimento da biodiversidade. A espécie humana vai ocupando espaços úteis à biodiversidade. São instaladas indústrias e fábricas nas florestas, o que também é considerada uma ameaça à biodiversidade angolana. Temos ainda a desmatação, atividades de exploração de madeira e a fabricação de carvão. São atividades que têm um grande impacto sobre a biodiversidade.
Que medidas são tomadas contra as empresas que praticam estas atividades?
O Ministério do Ambiente tem exigido que em cada atividade seja feito um estudo de impacto ambiental para avaliar se a atividade pretendida vai ou não causar consequências ao ambiente.
E no caso das construções ou prática da agricultura dentro das áreas protegidas?
Até agora, existem mais de 18 mil pessoas vivendo nas áreas de conservação, apesar de estar em curso um trabalho de senso habitacional. O Parque Nacional do Bicuar (Huíla) é um exemplo concreto de pessoas residindo no seu interior. Estamos trabalhando no sentido de educar estas populações para utilizarem de forma sustentável as áreas protegidas e os seus recursos naturais. Mas a tarefa não é fácil, por isso damos prioridade à conservação nas áreas onde a atividade humana é inexistente ou reduzida.
A caça e a pesca têm causado drásticas reduções nas espécies das áreas protegidas e nas espécies da biodiversidade marinha. Que medidas estão sendo tomadas contra os praticantes destas atividades?
A caça continua porque não temos ainda um sistema eficaz da fiscalização dentro das áreas de conservação. Para preservar as espécies existe uma medida tomada pelo Ministério da Agricultura, que proíbe a caça em todo o país. O ministério não está mais emitindo licenças de caça. Hoje, a grande caça tem sido feita pela população do interior das províncias, o que tem preocupado muito as autoridades. Face a esta situação, já foi elaborada uma nova lei que estabelece as regras de gestão das florestas e das áreas de conservação, que brevemente vai ser aprovada em Conselho de Ministros.
Quais as áreas onde frequentemente se registam casos de caça?
Em todas as províncias há prática de caça. Infelizmente, as pessoas vão também caçar nas áreas de conservação. Como exemplos práticos, temos os casos dos parques nacionais do Yona, Bicuari e Quissama. Animais como o bambi, a vaca do mato, chimpanzé, gorila, chita, elefante, hipopótamo, entre outras espécies, são as principas vítimas dos praticantes da caça.
A comercialização de animais de espécies raras está interferindo no crescimento da biodiversidade angolana?
O Departamento Nacional da Biodiversidade tem informações sobre casos de comercialização de animais vivos. Temos feito um grande esforço para controlar o comércio de animais vivos. Também existe uma grande pressão sobre muitas espécies para fazer artefatos. Publicamos um livro sobre espécies de animais cuja caça e o comércio são proibidos em Angola, para sensibilizar as pessoas que não sabem que esses animais são protegidos. A fiscalização do Instituto Defesa Florestal (IDF) sanciona as pessoas que violam as leis.
A estratégia para a Biodiversidade aprovada em 2007 já tem resultados?
A Estratégia marca o início de uma nova fase para a conservação e uso sustentável da biodiversidade em Angola, que tem como pano de fundo o contexto atual e a necessidade da conservação da biodiversidade. Esta estratégia tem como objetivo incorporar nas políticas e programas de desenvolvimento medidas para a conservação e o uso sustentável de diversidade biológica e a distribuição justa e equitativa dos recursos biológicos em benefício de todos os angolanos.
Qual o papel das comunidades na gestão da biodiversidade?
Entre 50 e 60 por cento da população de Angola reside em áreas rurais, sendo dependente dos recursos naturais para a sua sobrevivência. Além de serem as mais afetadas pelos fenômenos naturais, são também as que melhor conhecem a biodiversidade angolana, particularmente em relação à sua distribuição. Os seus conhecimentos são importantes para as atividades de pesquisa científica. As comunidades locais devem ter um papel chave a desempenhar na gestão e conservação da biodiversidade, o que está fortemente relacionado com o uso sustentável dos recursos. O envolvimento comunitário é importante no acesso à partilha de benefícios dos recursos da biodiversidade.
Porque foi declarado 2010 como o Ano Internacional da Biodiversidade?
Este ano foi declarado pela Assembleia Geral das Nações Unidas como o Ano Internacional da Biodiversidade por várias razões. Uma delas é sensibilizar as pessoas sobre a proteção da biodiversidade e outra é para alertá-las sobre as ameaças à biodiversidade e reforçar a importância de conservar a biodiversidade, para o bem-estar do homem para o desenvolvimento sustentável. As atividades culminam com a realização da Convenção sobre a Diversidade Biológica, que será realizada em Junho, em Nagoia, no Japão.
Fonte: Jornal de Angola