Os pesquisadores estão começando a identificar como as nuvens estão mudando à medida que o mundo se aquece. No estudo de Goessling, publicado em dezembro na revista Science, os pesquisadores analisaram como as nuvens mudaram na última década.
Eles descobriram que a cobertura de nuvens de baixa altitude caiu drasticamente —o que também reduziu a refletividade do planeta. O ano de 2023 —que estava 1,48°C acima da média pré-industrial— teve o albedo mais baixo desde 1940.
Em resumo, a Terra está ficando mais escura.
Esse baixo albedo (fração de radiação solar refletida por uma superfície), Goessling e seus coautores calcularam, contribuiu com 0,2°C de aquecimento para as temperaturas recorde de 2023 —uma quantidade aproximadamente equivalente ao aquecimento que até agora não foi explicado. “Esse número de cerca de 0,2°C se encaixa bastante bem nesse ‘aquecimento ausente'”, disse Goessling.
Os pesquisadores ainda não têm certeza exata do que explica essa diminuição. Alguns acreditam que pode ser devido a menos poluição do ar: quando partículas estão no ar, pode facilitar para as gotículas de água se aderirem a elas e formarem nuvens.
Outra possibilidade, disse Goessling, é um ciclo de retroalimentação a partir do aquecimento das temperaturas. As nuvens requerem umidade para se formar, e nuvens estratocúmulos úmidas ficam logo abaixo de uma camada de ar seco a cerca de 1,6 km de altura. Se as temperaturas aumentarem, o ar quente de baixo pode perturbar essa camada seca, misturando-se com ela e dificultando a formação de nuvens úmidas.
Mas essas mudanças são difíceis de prever —e nem todos os modelos climáticos mostram as mesmas mudanças. “É realmente complicado”, disse Goessling.
Outros cientistas também encontraram uma diminuição na cobertura de nuvens. Em um estudo preliminar apresentado em uma conferência científica em dezembro, um grupo de pesquisadores da Nasa (agência espacial americana) descobriu que algumas das zonas mais nubladas da Terra têm encolhido nas últimas duas décadas.
Três áreas de nuvens —uma que se estende ao redor do equador da Terra e duas ao redor das zonas de médias latitudes tempestuosas nos hemisférios Norte e Sul— diminuíram desde 2000, baixando a refletividade da Terra e aquecendo o planeta.
George Tselioudis, cientista do clima no Instituto Goddard de Estudos Espaciais da Nasa e autor principal do estudo preliminar, disse que essa diminuição na cobertura de nuvens pode ajudar a explicar por que o desequilíbrio energético da Terra tem crescido nas últimas duas décadas. No geral, a cobertura de nuvens nessas regiões está diminuindo cerca de 1,5% por década, aquecendo a Terra.
Tselioudis disse que o aquecimento pode estar restringindo essas regiões ricas em nuvens —aquecendo assim o planeta. “Sempre entendemos que o feedback das nuvens é positivo —e pode muito bem ser forte”, disse ele. “Isso parece explicar em grande parte por que as nuvens estão mudando da maneira como estão.”
Se as mudanças nas nuvens fazem parte de um ciclo de feedback, os cientistas alertam que isso poderia indicar mais aquecimento vindo pela frente, com calor extremo para bilhões de pessoas ao redor do globo. Cada ano quente fortalece a ideia que alguns pesquisadores agora abraçaram, de que o aumento da temperatura global atingirá o limite superior do que os modelos haviam previsto.
Se assim for, o planeta poderia ultrapassar 1,5°C ainda nesta década. Pesquisadores agora dizem que estão correndo para entender esses efeitos à medida que o planeta continua a se aquecer.
“Estamos meio que em um momento crítico”, disse Goessling. “Temos um sinal climático muito forte —e a cada ano está ficando mais forte.”
Fonte: Folha de S.Paulo