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Dilema de tutores

8 de setembro de 2013
3 min. de leitura
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Tirei a Filó da rua em 2010 e, num mundo fantástico, queria que nós duas falássemos a mesma língua. Hoje em dia até consigo entender alguns de seus miados, que mudam conforme a vontade – de ser acariciada, de brincar, de beber água na torneira… Mas a comunicação é bem limitada. Meu desejo era de ser capaz de conversar com ela para poder perguntar: “você queria ter ficado na rua ou está bem aqui comigo?”. É uma pergunta que me faço quase todos os dias.

Talvez ela seja mais razoável do que eu, que a castrei, a vacinei, a microchipei e a fiz viajar 16 horas de avião quando me mudei para a Itália. Talvez ela me dissesse que nós poderíamos ser amigas, desde que eu não interferisse na sua capacidade de caçar, de subir em árvores, de procriar, de ser livre… Inutilmente, fico imaginando tudo isso porque no fundo, minha única certeza é a de que eu a violentei e alienei suas habilidades naturais, mesmo a amando muito.

Mas, infelizmente, esse processo de alienação dos gatos (e dos cães) não começa em 2010, quando eu levei a Filó pra casa. Começa muito tempo atrás, coisa de 10 mil anos antes, quando a moda era domesticar tudo – espécies animais e vegetais. Claro que nada disso justifica o que fiz com a Filó, que para a minha conveniência ganhou nome próprio e passaporte – mas em quais condições ela viveria na rua, se já estava na qualidade de felino não selvagem? E se eu me dispus a tirá-la da rua, não é correto ser uma tutora responsável e cuidar dela até sua morte? São perguntas que me faço sempre e que compartilho com meu marido e com meus amigos porque acredito que o debate pode levar a uma evolução.

Um desses meus amigos, Roberto Festa, é jornalista, vegetariano e há nove anos adotou um Beagle, que nunca foi castrado, por exemplo. “Mesmo que os veterinários digam que a castração deixa o cão mais tranquilo e evita doenças na velhice, como câncer de próstata, resolvi não castrá-lo por respeito à sua essência. Eu não queria interferir mais ainda na sua natureza”, me disse uma vez. Mas, em Nova York, pra onde Roberto viaja frequentemente junto com seu Beagle para cobrir a política americana, o fato de o cão não ser castrado causa estranheza entre os nova-iorquinos, que sempre questionam Roberto sobre isso. Como se fosse uma obscenidade ver o saco intacto do Scout, o cão.

Em outra dessas conversas sobre a domesticação animal, surgiu o tema “ração vegetariana”. Mesmo sendo vegetariana há sete anos e ciente de que existe ração sem carne, não acho justo impor também minha filosofia alimentar para um animal que é naturalmente carnívoro, como o gato. Obviamente, fui pesquisar na internet sobre isso e encontrei esse post (http://www.papacapimveg.com/2013/02/06/e-certo-estender-o-veganismo-ao-seu-animal-de-companhia/) da Sandra Guimarães, do blog Papacapim, que me deu uma luz sobre a alimentação dos felinos. Mas mesmo com todas essas conversas e leituras, continuo sem saber se a minha intromissão na vida da Filó foi boa ou ruim. De um jeito ou de outro, sou da opinião de que como sua tutora, devo (e faço com amor) cuidar para que ela tenha saúde e receba carinho sempre. Seus ronrons me dizem que muito provavelmente não estou totalmente errada.

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