As aves, quando estão longe do seu habitat natural, se tornam mais exigentes com a alimentação. Para chegar a essa conclusão, pesquisadores investigaram o comportamento alimentar de quase 100 espécies de pássaros em seis continentes. O estudo foi realizado pela ONG americana Conservation International, em conjunto com a Universidade Estadual Paulista (Unesp) e a Universidade de Canterbury, na Nova Zelândia, além de outras instituições.
Fatores de estresse no meio ambiente podem mudar preferências alimentares das aves. E alterações nesse comportamento podem gerar grandes impactos nas florestas e em outros ecossistemas. Segundo Camila Donatti, especialista em clima da Conservation International e coautora do estudo, essa influência acontece devido à dependência ambiental dos pássaros na dispersão de sementes.
“Em geral, as aves procuram frutas que se encaixem perfeitamente no tamanho do seu bico — para que possam apenas pegar e ir embora,” disse Donatti, em comunicado. “Pensávamos que, no habitat principal das aves — onde passam a maior parte do tempo — elas seriam mais seletivas quanto às frutas que comem, já que há uma maior variedade disponível.”
Os pesquisadores descobriram que quando as aves sofrem algum tipo de estresse ambiental — o que inclui novas condições climáticas, a presença predadores diferentes ou a maior competição por recursos — uma tendência é se afastar de áreas centrais de seus habitats, procurando regiões mais às bordas. E esse hábito muda a forma de se alimentar.
“Elas têm que ser muito cuidadosas para comer as plantas exatas, que vão lhes dar o maior retorno sobre o investimento”, afirma Donatti. “Essencialmente, elas ficam mais exigentes porque não têm energia para desperdiçar. Isso significa comer a fruta maior que conseguem encaixar em seus bicos com o menor esforço possível”, acrescenta.
“As aves se reproduzem muito mais rapidamente do que as plantas — e podem voar por grandes áreas,” disse Donatti. “Diante das mudanças climáticas e da perda de habitat, a distribuição das aves pode ser alterada muito mais rapidamente do que as décadas que provavelmente levariam para as plantas se ajustarem.
As mudanças climáticas e as atividades humanas — agricultura e o avanço do desenvolvimento urbano — geram a interrupção do ciclo entre as aves e as plantas. Com isso, pode ser criado um descompasso entre os tipos de aves e a comida disponível em uma área específica.
“As aves são animais extremamente importantes para manter a saúde de um ecossistema. Quando as sementes passam pelo trato digestivo delas, elas passam por um processo químico e físico que realmente facilita a germinação e, consequentemente, o crescimento de novas plantas”, explica. “Sem as aves para dispersar suas sementes, as árvores e plantas de uma área acabarão morrendo a longo prazo, o que teria um efeito cascata dramático em ecossistemas inteiros — como as florestas que armazenam carbono e contribuem para o aquecimento climático”, acrescentou.
Para realizar o estudo, pesquisadores dedicaram milhares de horas para coletar dados. Estima-se que apenas o conjunto de material coletado por Donatti incluiu quase 900 horas de observação de aves.
“A biodiversidade é a espinha dorsal da natureza,” continuou Donatti. “E se esses sistemas saírem de equilíbrio, não funcionarão da maneira que esperamos e não fornecerão os serviços essenciais dos quais dependemos, desde alimento até água limpa e regulação do clima. Se vamos proteger isso, precisamos entender como funciona,” finaliza.
Fonte: Revista Galileu