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DESEQUILÍBRIO

Desova das tartarugas inicia com atraso pelo segundo ano consecutivo em Rondônia

Tartarugas só começaram a desova no início de outubro, dois meses após o período habitual. Mudanças climáticas, queimadas ilegais e caça predatória ameaçam o maior berçário de tartarugas de água doce do país, alertam especialistas.

15 de outubro de 2025
Jainni Victória
11 min. de leitura
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Foto: Ibama/Divulgação

O Vale do Guaporé, no Sul de Rondônia, na fronteira com a Bolívia, é palco de um dos maiores espetáculos da natureza amazônica: a desova das tartarugas. Todos os anos, milhares de fêmeas saem da água para colocar seus ovos nas praias de areia ao longo do rio Guaporé, garantindo que a espécie continue viva. Mas, nos últimos anos, a situação mudou.

Em 2024, pela primeira vez em mais de 20 anos, houve um atraso na desova. Em 2025, isso aconteceu novamente. Especialistas dizem que o problema está ligado a condições desfavoráveis, como chuvas fora de época, fumaça das queimadas e aumento do nível do rio. Além disso, a caça predatória também ameaça a sobrevivência das tartarugas.

A espécie Podocnemis expansa, a maior tartaruga de água doce da América do Sul, está entre as mais afetadas.

Segundo a Associação Comunitária Ecológica do Vale do Guaporé (Ecovale), que monitora os quelônios da região, em 2022 nasceram cerca de 12 milhões de filhotes. Em 2023, esse número caiu para 1,4 milhão, uma queda de quase 88%. No ano passado, apenas 350 mil filhotes sobreviveram. A previsão para 2025 continua preocupante.

Normalmente, a desova dessa espécie ocorre entre agosto e setembro. Mas, neste ano, as tartarugas só conseguiram começar a desova no início de outubro, cerca de dois meses após o período habitual.

“Talvez em 2025 tenhamos um número menor do que 2024. A desova deste ano iniciou de forma pequena e não contínua, como geralmente costuma ser, e isso é muito preocupante”, relata José Soares Neto, conhecido como “Zeca Lula”, um dos fundadores da Ecovale.

Lutando pela sobrevivência

Os quelônios são répteis pecilotérmicos, ou seja, não mantêm a temperatura corporal constante e dependem do calor externo para regular o metabolismo. As fêmeas utilizam as praias para se aquecer, e esse processo de termorregulação estimula a ovulação, favorecida pelo aumento da temperatura ambiente. Assim, o ciclo reprodutivo é diretamente afetado por eventos climáticos extremos.

O biólogo Deyvid Muller explica que as queimadas e mudanças climáticas influenciam no atraso da desova, uma vez que a fumaça das queimadas bloqueia a luz solar e altera a temperatura da areia das praias, onde as tartarugas realizam a postura dos ovos.

Ainda de acordo com Deyvid, para este ano estima-se que mais de 33 mil ninhos tenham sucesso, porém, o número exato de nascimentos dos filhotes ainda é um mistério.

“Caso esse cenário se torne algo comum, haverá uma drástica diminuição na quantidade de filhotes. Até o momento a desova está acontecendo, mas, de forma atípica. Geralmente existe uma desova contínua, mas este ano elas seguem esperando as condições ideias para continuar. Não é possível estimar a perda. Porém, o clima já é de tristeza pela possível perca”, afirma o biólogo.

O Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) Ibama, por meio do Programa Quelônios da Amazônia (PQA) em Rondônia, realiza cercamento e monitoramento das praias, escavação de ninhos alagados para salvar filhotes, apoio a pesquisas científicas e ações de educação ambiental com comunidades locais. Com isso, o objetivo é aumentar a taxa de sobrevivência.

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