Os níveis atuais de desmatamento e as elevadas emissões de gases de efeito estufa estão gerando riscos críticos à Bacia Amazônica. É o que alerta Johan Rockström, diretor do Instituto de Pesquisa sobre o Impacto Climático de Potsdam, na Alemanha e um dos coorganizadores do Planetary Science, o pavilhão da Ciência, que acontece pela primeira vez este ano, na COP30, em Belém.
Segundo o cientista, o cenário não ficaria retido apenas à realidade da população local, mas afetaria ainda o abastecimento de água de cidades como São Paulo, ameaçaria os modos de vidas tradicionais e colocaria em perigo grande parte da biodiversidade do planeta.
Rockström participou do painel “10 novas descobertas na ciência climática: evidências, riscos e soluções” no pavilhão científico, iniciativa inédita em conferências do clima que pretende colocar o setor no centro das negociações sobre mudanças climáticas. Durante a sessão, foi lançado um relatório com as novas perspectivas sobre os riscos e soluções encontrados para combater o aquecimento global e manter o limite de 1,5°C ao alcance para acelerar a resiliência climática.
O documento traz as avaliações mais recentes de riscos que o mundo enfrenta. De acordo com Rockström, o aquecimento global implica em sofrimento humano, em acesso a “pontos de não retorno” e a comprometimento do que traz suporte à vida das populações do mundo todo.
“Podemos ultrapassar limites que são não só inaceitáveis, mas que podem tornar fundamentalmente impossível, por exemplo, garantir acesso à água doce, conviver com níveis de calor que ameaçam a produtividade do trabalho, a economia e a segurança alimentar”, diz o pesquisador.
Acelerar a transição para uma economia de baixo carbono é, na visão de Rockström, fundamental para combater essa série de problemas. Para isso, a ciência tem exposto não apenas soluções, mas formas de as ampliar, como energia renovável e práticas agrícolas sustentáveis.
“Um ponto que é crucial nas negociações climáticas diz respeito a quais combinações de políticas podem nos levar na direção correta. As COPs tendem a concentrar grande parte do esforço em negociar compromissos — e isso é importante — mas não é suficiente. Apenas prometer não basta. Precisamos de ação”, completa.
“E ação não diz respeito apenas a tecnologias. Tem a ver também com nossas escolhas como cidadãos. Essas escolhas passam por impostos, subsídios e incentivos. Ou seja, o que faz uma pessoa escolher um carro com motor a combustão ao invés de um carro elétrico? Muitas vezes, é o preço — e isso está diretamente ligado aos subsídios para combustíveis fósseis, como o diesel. A ciência, hoje, já consegue avaliar muito bem a eficiência ou ineficiência desses instrumentos de política pública”, pontua Johan Rockström.
COP precisa avançar, afirma pesquisador
De accordo com Rockström, “se não houver progresso nesta COP, estamos avançando muito rapidamente rumo aos 1,5°C”. “Na verdade, mesmo com esforços, já devemos ultrapassar 1,5°C nos próximos 5 a 10 anos. Isso significa que o Brasil enfrentará um risco ainda maior de que a Amazônia cruze um ponto de inflexão”.
Entre as soluções apontadas no relatório lançado no pavilhão da Ciência Planetária, a redução do desmatamento e os investimentos em regeneração de sistemas florestais são elencados como principais para o Brasil. Começar a eliminar o carvão, petróleo e gás também estão entre as alternativas. “Precisamos fazer as duas coisas. As soluções já existem e, se fizermos isso, sabemos que países como o Brasil sairão ganhando”.
Oceanos correm riscos irreversíveis
Os riscos das mudanças climáticas não ficam restritos apenas à parte terrestre do planeta. As águas, segundo aponta o pesquisador, também estão em perigo. Com o mundo caminhando para eventos extremos mais frequentes, como secas, incêndios, enchentes, ondas de calor, mudanças no padrão de doenças e tempestades, os oceanos ficam mais expostos. “É como apertar um botão de ‘ligar’: o processo continua por conta própria e não conseguimos reverter”, destaca Rockström.
Esse cenário é uma realidade já existente. Recentemente, a Universidade de Exeter, na Inglaterra, lançou um relatório apontando que os recifes de corais de águas quentes chegaram ao ponto de não retorno. Timothy Lenton, precursor do conceito, também chamado de “tipping points”, e professor de Mudanças Climáticas e Ciência do Sistema Terrestre na instituição britânica, detalha que esses problemas estão se expandindo.
“Vemos claramente que estamos sob risco de um ponto de inflexão na Amazônia — de perdermos grandes partes da floresta — e também no derretimento de grandes mantos de gelo, além de mudanças importantes na circulação oceânica”.
Ainda assim, Timothy enxerga oportunidades. Os pontos de não retorno que o planeta está alcançando devem ser vistos, conforme detalha o pesquisador, como uma chance para acelerar mudanças positivas, como a transição para as energias limpas. “As mesmas dinâmicas que podem levar a mudanças perigosas no clima também podem ser usadas para impulsionar mudanças positivas e rápidas na sociedade. Por exemplo, quanto mais pessoas adotarem painéis solares, mais baratos eles ficam e mais acessíveis se tornam”, completa.
À tarde, nesta segunda-feira (10/11), no evento oficial de abertura do pavilhão ao público, Johan comentou, no entanto, que “a janela para garantir um futuro para a humanidade está se fechando rapidamente. “Por isso, estamos num momento incrivelmente importante para a comunidade científica ter essa oportunidade de dialogar sobre isso com todos vocês e ter essa plataforma em Belém para colocar a verdade nas negociações. Vamos ter muito trabalho nos próximos dias”.
O climatologista brasileiro Carlos Nobre, coorganizador do espaço, se diz otimista com a repercussão do evento. “Por que não fazer desta COP30 uma COP muito importante? Tão importante quanto ao do Acordo de Paris?”, finaliza.
Fonte: Um só Planeta