“Cães não precisam de carros luxuosos, casas grandes ou de roupas chiques. Um cachorro não liga se você é rico ou pobre, esperto ou não. Dê o seu coração e ele dará o dele. De quantas pessoas podemos dizer o mesmo?”. A frase final do filme “Marley e Eu” simboliza a importância e estima que os animais assumiram na contemporaneidade. Entretanto, na hora em que eles morrem, o que fazer?
Apesar de Bauru contar com algumas opções, nenhuma delas são satisfatórias para quem considera o animal como um membro da família. Um problema que desemboca em desde desovas criminosas, como a do último domingo (leia mais abaixo), até enterros nos quintais das residências.
Atualmente, Bauru conta com uma população aproximada de 80 mil cães e gatos. Quando algum desses animais morre, a alternativa é levar o animal/ ao Centro de Controle de Zoonoses (CCZ), localizado na no Jardim Redentor. O órgão, entretanto, não busca os animais nas casas.
Já aqueles que morrem nas ruas, a alternativa é ligar para a Empresa Municipal de Desenvolvimento Urbano e Rural de Bauru (Emdurb), que irá agendar e recolher os corpos. “O recolhimento começa às 13h. Porém, as pessoas podem ligar antes e agendar”, explica o gerente de resíduos sólidos e ambiental da Emdurb Nivaldo Aparecido Rio Peres.
Todavia, a empresa municipal só faz o recolhimento em vias públicas. “Se o animal morrer em casa, a pessoa deve embalar direitinho, colocar na calçada e agendar com a Emdurb. Não podemos pegar de dentro das casas”, explica o gerente.
Colocar um animal na rua e esperar a coleta, porém, não é sequer cogitado por aqueles que enxergam neles membros da família. Aliado a esse pensamento, está o destino final desses animais. Tanto aqueles levados para CCZ quanto os recolhidos pela Emdurb são descartados no aterro sanitário da cidade, em uma vala séptica. De acordo com Nivaldo Peres, no próximo contrato de licitação, já está previsto um serviço crematório.
Nas ruas, a população se demonstra avessa a deixar os corpos de seus animais nas calçadas ou mesmo à simples ideia de que eles serão levados ao lixão. Assim, a única alternativa é enterrá-los nos quintais das casas ou terrenos baldios. Algo que, apesar de demonstrar afeto, pode ser perigoso.
Em Bauru, por várias vezes discutiu-se a criação de um cemitério de animais. Entretanto, o estudo não decola porque a destinação atual é, em padrões técnicos, considerada satisfatória e também porque os rigores para a criação desse local são muito elevados.
Clínicas
A problemática sobre o que fazer com o animal morto possui outra faceta importante. Muitos tutores acionam clínicas veterinárias para fazer o serviço. Entretanto, as próprias clínicas reclamam da destinação.
Até fevereiro deste ano, a Emdurb recolhia os animais nos consultórios e os encaminhava ao aterro sanitário. Após um decreto municipal, para atender uma resolução do Conselho Nacional do Meio Ambiente (Conama), a empresa municipal deixou de fazer esse serviço.
Desse modo, as clínicas precisam contratar empresas com essa finalidade. O veterinário Newton Jarussi explica que utiliza uma empresa de Botucatu, que pega os animais de sua clínica em Bauru e os leva para a incineração. Para tanto, a empresa cobra por quilômetro rodado.
“Em Bauru, existe uma empresa que faz o serviço. Mas ela cobra pelo peso de cada animal e, para mim, não compensa. Na semana passada, o custo para a destinação de um cachorro morto aqui foi de R$ 100,00. Esse custo, nós temos que repassar para os clientes”, conta.
O perigo que se instala é, segundo alguns veterinários e Organizações Não-Governamentais (ONGs) consultados pelo JC, que, para se livrar desse custo, algumas clínicas passem a descartar as carcaças em terrenos baldios.
De acordo com o delegado Dinair José da Silva, titular da Delegacia de Crimes Ambientais no 1º Distrito Policial (DP) de Bauru, realizar a desova de animais em terrenos impróprios é crime. Segundo ele, enquadra-se no artigo 54 da Lei Ambiental e prevê reclusão de um a quatro anos e ainda multa.
“É um perigo para o meio ambiente, com contaminações, e também para as pessoas, com a proliferação de doenças. Então, a população que ver isso, deve denunciar”, completa o delegado.
Serviço
O CCZ está localizado na rua Henrique Hunziker, sem número, no Jardim Redentor. Já o recolhimento de animais em vias públicas pode ser agendado na Emdurb pelos telefones 3233-9053 / 9050 durante a semana. Aos sábados, o órgão atende no 3233-9087.
Perigo de enterrar
Em Bauru não existem opções para a cremação dos animais e nem um cemitério para enterrá-los. Assim, alternativas ofertadas pelos órgãos públicos da cidade divergem do pensamento daqueles que enxergam o animais como membros da família. E, com isso, a única alternativa que sobra é realizar um enterro por conta própria.
Apesar de demonstrar afeto, o fato pode ser perigoso. Segundo análise de biólogos consultados, pode haver a penetração no solo e a contaminação de lençóis freáticos. Mesmo quando o animal é bem “embalado”, ainda existe esse risco.
Um outro problema é que, de acordo com a profundidade, os restos podem ser desenterrados por animais e por crianças, podendo espalhar doenças. Segundo veterinários, a melhor alternativa realmente é a cremação.
Quase 3 mil
Com uma população canina e felina estimada em 80 mil em Bauru, já foram descartados no aterro sanitário até agosto deste ano quase 3 mil animais mortos. Segundo dados da Emdurb, o órgão recolhe das ruas uma média de 40 por mês. Tal número se soma aos 2,4 mil que já foram levados do CCZ para o lixão em 2011.
Cães mortos são desovados na B. Olinda
A questão da destinação de animais mortos se escancarou no último domingo, quando um morador do bairro Quinta da Bela Olinda denunciou um descarte de corpos de cães próximo à sua residência. A reportagem do JC esteve no local e ainda encontrou algumas carcaças jogadas em um terreno baldio na rua Neme Saleme Neme cobertas por mais de dez urubus.
“Estava caminhando de manhã quando vi um bando de urubus, mais de 30, cobrindo uma árvore. No local, vi três sacos pretos e mais cinco cães já estraçalhados. Me revolto com isso. Não quero me identificar porque sei que esses animais devem ser de alguma clínica veterinária e que foram desovados aqui sem nenhuma higiene ou respeito”, desabafou o homem, que mora há mais de 5 anos no bairro.
Ainda não se sabe se realmente foi uma clínica veterinária que fez a desova dos corpos. Porém, a presidente da ONG Naturae Vitae, Fátima Schroeder, afirma ser uma possibilidade. “O fato de a Emdurb ter parado de recolher os animais das clínicas é um incentivo para aqueles profissionais irresponsáveis fazerem o descarte irregular. Para não pagarem, eles podem fazer isso”, conta.
Ela ainda indica outra realidade assustadora na própria Quinta da Bela Olinda. “Há cerca de um mês, fui informada de que estavam jogando corpos de cachorros lá”, conta Fátima, abrindo a suspeita de que seja comum a desova de corpos de animais na área.
Apesar da possibilidade, em ambos os casos não foram registrados boletins de ocorrência (BO). Entretanto, informado pelo JC, o titular da Delegacia de Crimes Ambientais, Dinair José da Silva, garante que irá apurar. “Iremos verificar para saber se é algo esporádico ou um costume. Também precisamos ver se todo esse contexto está estimulando essa prática. Tentaremos encontrar os responsáveis e puni-los”, afirma.
Fonte: JC Net