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ABANDONO E SOFRIMENTO

Denúncias de maus-tratos contra animais no Parque da Água Branca (SP) exigem ação imediata

Entre as queixas estão as mortes de galos, aves feridas e ambiente insalubre

17 de setembro de 2024
Redação
10 min. de leitura
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Foto: Divulgação

A situação alarmante das aves no Parque da Água Branca, em São Paulo, tem gerado preocupação entre defensores dos direitos animais e membros da sociedade civil. Relatos de aves doentes, feridas e até mesmo mortas tem se multiplicado. E tudo isto tem acontecido sem receber a devida atenção da administração que tem sido negligente com o bem estar dos animais.

O caso veio à tona após denúncias feitas diretamente aos tratadores do parque por integrante do Grupo “Perdizes Acontece” e, posteriormente, em uma reunião realizada em julho de 2024 com representantes da Secretaria do Meio Ambiente e Infraestrutura Logística (SEMIL) e da Agência Reguladora de Saneamento e Energia do Estado de São Paulo (Arsesp). Apesar das advertências, nenhuma providência foi tomada até o momento.

As denúncias apontam para uma série de problemas graves no manejo das aves, que são de responsabilidade da concessionária Reserva Novos Parques, empresa que administra o Parque da Água Branca desde 2021. Entre as queixas, estão as mortes de galos que permaneceram no viveiro por dias sem que os cuidadores sequer notassem que estavam sem vida, aves com ferimentos na cloaca em decorrência do ambiente inadequado, e a morte de um galo d’angola, que já apresentava sinais de doença sem que medidas fossem tomadas a tempo para salvá-lo.

Foto: Divulgação

Integrantes do conselho, que representa a sociedade civil na preservação do parque, reclamam quem não têm voz e que as decisões são tomadas e executadas sem consulta prévia aos membros. E que quando questionam a concessionária recebem respostas evasivas e prontas sem relatórios comprobatórios.

“Estamos acompanhando o desmonte do Parque da Água Branca e a destruição de suas características rurais. Era o único espaço na cidade em que as crianças podiam interagir com aves soltas. As aves foram aprisionadas com a desculpa obscura de gripe aviária, a fase da gripe passou e elas continuam sofrendo no confinamento. Um outro ponto é o estado do tanque dos peixes, que está visivelmente malcuidado, com acúmulo de sujeira que causa problemas sérios para a saúde e bem estar das carpas e outros animais aquáticos que já vivem aprisionados”, relatou Sonia Vergueiro.

Foto: Divulgação

“A manutenção precária é justificada pela concessionária com a alegação de que o contrato prevê um prazo de 72 meses para a realização das conservações necessárias, uma resposta que tem sido recebida com indignação por todos os frequentadores. Além disso, o espaço de leitura ao ar livre, que antes oferecia um ambiente excelente está atualmente abandonado. Estruturas como estantes e mesas estão em ruínas, enquanto uma sala fechada, com Wi-Fi, foi criada como substituição. Muitos visitantes questionam a utilidade de um espaço fechado em um parque que deveria proporcionar contato com a natureza, expressando descontentamento com a nova configuração”, relata Sonia.

O público também tem expressado crescente insatisfação com o aumento abusivo e repentino dos preços das atrações e produtos no Parque da Água Branca. O tradicional passeio de trenzinho, que anteriormente custava R$ 5,00, agora é cobrado a R$ 30,00. Itens como água de coco, que antes eram acessíveis, passaram a custar R$ 15,00. Os visitantes dizem que a nova gestão do parque tem adotado uma política claramente orientada para o lucro, o que tem forçado os comerciantes a elevarem seus preços. Como resultado, a população de baixa renda, que antes frequentava o local, agora enfrenta dificuldades para acessar esses serviços, levando a uma exclusão econômica que contraria a essência de um espaço público destinado a todos.

Aprisionamento e mortes

Em junho de 2023, a concessionária Reserva Novos Parques confinou as aves que viviam soltas no Parque da Água Branca, em espaços cercados e reduzidos para a quantidade de aves, usando como justificativa a normativa do Ministério da Agricultura e Pecuária (MAPA) para enfrentamento da gripe aviária. O aprisionamento das aves causou uma grande comoção nos visitantes do Parque da Água Branca, por retirar a convivência com estes animais, característica do parque que atrai adultos e crianças.

“Estamos lutando pelos animais e pelo parque desde que a concessão foi passada para a iniciativa privada, há dois anos,” afirmou Vera Almeida, frequentadora e integrante do grupo Perdizes Acontece. “Eles confinaram 2.600 aves em um recinto inadequado e, recentemente, fomos informados de que essas aves foram doadas, mas não temos conhecimento sobre o destino ou condições atuais delas. A direção do parque deve uma explicação clara sobre o paradeiro e o bem-estar dessas aves,” enfatizou Vera, destacando a urgência de respostas por parte da administração.

E a situação só piora. Após o assassinato de dois gatos, mortos a pauladas, há alguns meses, a concessionária responsável arquivou inquérito para apurar o caso, deixando a comunidade indignada e sem respostas. “Queremos as aves livres, os peixes bem cuidados, e que os gatos e todos os animais silvestres que moram no parque sejam respeitados. A tristeza que sentimos é imensurável”, desabafou Vera.

Uma outra questão preocupante é a falta de equilíbrio no número de machos e fêmeas no espaço onde estão confinados que está resultando em situações de extremo estresse e desgaste para as aves. Galos estão sendo mantidos em maior número do que o recomendado, levando a copulações excessivas e frequentes com as poucas galinhas disponíveis, o que tem causado debilitação e sofrimento visível nos animais. Em um caso particularmente preocupante, galos começaram a copular com patas devido à ausência de galinhas, ferindo e estressando ainda mais os animais.

Entre as espécies bastante afetadas, estão os pavões. Essas aves, conhecidas por sua beleza e porte imponente, possuem um comportamento natural que exige, como todos os animais, liberdade e espaço para se locomoverem e expressarem seus comportamentos. No entanto, no Parque da Água Branca, eles estão sendo mantidos em um ambiente que não proporciona essas condições. O confinamento inadequado resulta em estresse, brigas e, em alguns casos, até ferimentos graves. Pavões são aves que, na natureza, gostam de andar livremente, explorando seu território, exibindo suas penas em rituais de acasalamento e mantendo distância de outros machos para evitar conflitos. Quando privados dessas condições, eles sofrem tanto física quanto psicologicamente.

Outros problemas relatados incluem patos com dificuldades de locomoção, resultado de patas feridas, além de uma alimentação inadequada e recipientes de água sujos, que favorecem a disseminação de doenças. Também foi citado um tanque improvisado, inadequado para as aves, e constantemente sujo, onde um galo morto foi encontrado e removido apenas após vários dias.

Diante dessa situação, o vereador Professor Toninho Vespoli (PSOL), que acompanha de perto as questões relacionadas ao Parque da Água Branca, expressou profunda indignação com o descaso das autoridades e da concessionária responsável, que não respondeu ao e-mail enviado pelo gabinete. “É inaceitável que, mesmo após tantas denúncias e reuniões, nenhuma ação concreta tenha sido tomada para garantir o bem-estar das aves do parque. Estamos lidando com seres sencientes que estão sofrendo e morrendo devido à negligência. A vida desses animais precisa ser respeitada e protegida, e exigimos uma resposta imediata das autoridades competentes”, afirmou Vespoli.

Promessas

Representantes da sociedade civil também pedem que a Reserva Novos Parques cumpra com as promessas feitas em reuniões anteriores, quando garantiram que as aves receberiam tratamento adequado com a supervisão constante de veterinários. Entretanto, o cenário diário do parque revela uma realidade alarmante: animais em sofrimento, carência de cuidados básicos e um ambiente que claramente não atende às necessidades mínimas de bem-estar das aves. Entre as reivindicações está a implementação de um relatório detalhado, que registre os horários de alimentação, a limpeza dos recipientes de água, as visitas dos cuidadores e a higienização dos tanques.

Este relatório deve ser acessível ao Conselho que representa a sociedade civil. A falta de transparência e de ações concretas por parte da administração tem contribuído para o sofrimento e morte das aves, algo que poderia ser evitado com medidas simples e eficazes.

Ministério Público

Na representação feita no Ministério Público de SP, Perdizes Acontece, relembra que “Uma das riquezas do Parque da Água Branca é a sua fauna, considerando tanto espécies as residentes como as não residentes no local. Os animais residentes vivem soltos, o que faz com que sejam atração e um dos motivos de visita ao Parque. Crianças são atraídas por eles e os adultos também sentem prazer nessa relação,uma vez que se trata de um parque urbano, mas com características rurais, fazendo com que as pessoas saiam do universo urbano em essência e vivenciem uma realidade diferente, ainda que parcialmente. Os animais do Parque fazem parte da sua identidade,remetendo, inclusive, ao seu histórico.”

E complementam: “Apesar da Secretaria da Agricultura e os Pavilhões para Exposição de Animais terem sido transferidos, o Parque continua sendo reconhecido por apresentar características peculiares em relação aos demais parques urbanos da cidade de São Paulo, como feira de produtos orgânicos, aulas de equitação adaptada, animais soltos (galinhas, pavões, gansos, patos e felinos)”.

As representantes da sociedade civil no Conselho de Orientação do Parque da Água Branca, em todas as reuniões realizadas desde então, apresentaram questionamentos sobre esse confinamento, comprovando que estas aves não se enquadravam nos critérios da portaria do MAPA, assim como demonstraram que as aves estavam sofrendo com o confinamento, pois estavam amontoadas em locais pequenos, expostas ao calor extremo e às chuvas fortes, ocorridas em 2023 e 2024. Em 14 de fevereiro de 2024, por meio de votação, o Conselho de Orientação deliberou, por unanimidade, pela soltura das aves, fato ignorado pela Concessionária.

“O Decreto n° 68.341, de 29 de fevereiro de 2024, estabeleceu até 08 de agosto de 2024, o estado de emergência zoossanitária no Estado de São Paulo. Nesse meio tempo, a concessionária fez uma doação de 947 aves (carta da concessionária datada de 04/07/2024, em resposta aos questionamentos formulados pelo Conselho em 17/06/2024, também sem o conhecimento prévio do conselho. Hoje, o Parque conta com cerca de 900 aves”, explica Vera Almeida.

A demanda central é a libertação das aves, acompanhada da implementação de rigorosos controles e tratamentos sanitários para garantir a saúde e o bem-estar dos animais.

Imóveis tombados

Além das questões envolvendo a fauna, há uma crescente preocupação com o estado dos 94 imóveis tombados presentes no parque. Segundo documentação do CAEX (Centro de Apoio Operacional à Execução), muitos desses edifícios encontram-se em condições precárias e degradadas, o que foi detalhado em um inquérito que também destacou as ações encaminhadas pela concessionária aos órgãos de tombamento.

Apesar da falta de medidas adequadas de restauração, alguns desses imóveis estão sendo locados, colocando em risco tanto os usuários quanto a própria integridade das construções. Em resposta, ativistas e membros da comunidade exigem que o uso dos imóveis só seja permitido após sua completa restauração e que sua destinação seja voltada para atividades que priorizem a função pública, como iniciativas ligadas à cultura, educação, ciência e à preservação do patrimônio histórico do parque.

A solicitação foi formalmente apresentada ao CONPRESP (Conselho Municipal de Preservação do Patrimônio Histórico, Cultural e Ambiental da Cidade de São Paulo), reforçando a importância de manter o ambiente natural e cultural do parque.

Essas ações são fundamentais para garantir a proteção e valorização do Parque da Água Branca, um espaço de grande importância cultural e ambiental para a cidade de São Paulo.

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