Por Patricia Tai (da Redação)
A demanda crescente pelo tecido conhecido como cashmere, ou casimira (lã obtida a partir da pelagem de caprinos montanheses) está ameaçando seriamente o futuro dos leopardos-das-neves e outras espécies da Ásia Central, de acordo com um novo estudo publicado no Jornal Conservation Biology. As informações são da Care2.
O estudo, que foi conduzido pela Wildlife Conservation Society (WCS) e pela Snow Leopard Trust, revelou que o número de cabras domésticas criadas para produção de cashmere na Mongólia triplicou nas últimas duas décadas para atender ao mercado.
Infelizmente, conforme a demanda no Ocidente continua a crescer, assim também crescem os números de rebanhos de cabras explorados a ocupar um habitat que foi outrora abundante de animais selvagens. Segundo o estudo, herbívoros selvagens ficaram com menos de 5% da terra disponível, enquanto ovelhas e cabras foram deixadas nos outros 95% das terras silvestres ao longo das áreas estudadas que incluem a planície tibetana da China, a Mongólia e a Índia.
Uma consequência imediata disso é que a espécie dos leopardos-das-neves e outras menos conhecidas como as dos iaques selvagens, antílopes tibetanos, saigas, camelos bactrianos, kiangs, takhis (esses dois últimos são cavalos selvagens raros) e gazelas estão sendo prejudicadas por terem cada vez menos espaço para sobreviver. Não menos grave é que algumas dessas espécies ainda se tornam vítimas de ataques de cães que são explorados para cuidar de rebanhos, e outras acabam ficando vulneráveis a doenças contagiosas que vêm dos rebanhos domesticados.
Para piorar a situação, os leopardos-das-neves – que já são considerados altamente ameaçados de extinção – com menos habitat e menos presas, estão se voltando a esses rebanhos na procura por alimento, o que tem causado conflitos cada vez maiores com os pastores e terminado em mortes retaliatórias aos animais.
“As consequências são tão dramáticas e negativas para espécies emblemáticas que os próprios governos assinaram legislação se comprometendo a proteger, ao mesmo tempo em que a vida selvagem está continuamente sendo espremida em uma situação sem saída, sem vitória”, disse Joel Berger, autor do estudo, biólogo da WCS e professor da Universidade de Montana. “Pastores estão fazendo o que nós deveríamos fazer – apenas tentando proteger seus rebanhos, e quem pode culpá-los?”, questionou o pesquisador (pergunta esta que é altamente passível de reflexão, diga-se de passagem).
De acordo com a reportagem, a WCS deixou claro que o ponto central do estudo não é lutar pelo fim do comércio de cashmere, mas descobrir formas de trabalhar com as comunidades para preservar os rebanhos domésticos e também proteger a vida selvagem, assim como elevar a consciência entre os consumidores a respeito da origem do cashmere e do quanto a sua produção impacta as espécies selvagens.
“Os autores sugerem que o estudo deve servir como começo de diálogo entre a indústria de vestuário, criadores de rebanhos e conservacionistas no sentido de endereçar e mitigar estes impactos”, declarou a organização.
Charudutt Mishra, um dos autores, disse ao The Guardian que algumas ações estão sendo testadas, como a oferta de bônus para bens produzidos por comunidades que não matam leopardos ou caçam animais selvagens, bem como a melhoria das cercas aos rebanhos para reduzir mortes predatórias, e a vacinação dos rebanhos para evitar disseminação de doenças, o que, segundo o pesquisador, pode eventualmente resultar em um esquema de “etiqueta verde” para os produtos.
“Melhorando nosso entendimento da relação entre rebanhos, ecologia local e mercados globais, podemos implementar políticas em níveis nacional e internacional que sejam melhor desenhadas para proteger a biodiversidade, ao mesmo tempo em que deem suporte à criação de rebanhos por comunidades locais”, disse Mishra à BBC.
A WCS acrescentou que estará trabalhando com a Plataforma de Ecossistemas Responsáveis (RESP), uma iniciativa público-privada que trata de questões referentes à sustentabilidade de cadeias produtivas.
Nota da Redação: A postura dos condutores do estudo é tendenciosa, bem-estarista e pende para a indústria de cashmere. Trabalhar para estabelecer um acordo entre criadores de rebanhos, comunidades e indústria do vestuário é equivalente a “enxugar gelo” e não terá efeito, quando tão mais simples e talvez a única solução seja a consciência global imediata de que não vale a pena continuar a produzir e consumir cashmere, sendo que há tantas opções de vestuário disponíveis e que não são produzidas a partir de crueldade com os animais.
Para salvar a natureza que morre a cada segundo a olhos vistos, não há chance de meio-termo, não há tempo para espera, não há espaço para proteger os animais “pela metade”. Ou se para de explorá-los e se conserva seu habitat, ou em breve estarão todos mortos, inclusive os humanos. Talvez o que conforte – equivocadamente – esses que vivem da exploração dos animais não-humanos seja a crença de que eles não colherão as consequências de seus atos vis, sem perceberem que talvez já estejam colhendo.