Apesar de satélites do Inpe (Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais) alertarem para o aumento recorde de queimadas e áreas desmatadas na floresta amazônica no governo Jair Bolsonaro (PL), o Ministério das Comunicações anunciou hoje a intenção de negociar com o bilionário Elon Musk o fornecimento de “tecnologia avançada” de “monitoramento” para “a preservação da floresta amazônica”.
Em encontro com Musk, o presidente afirmou “contar” com o empresário para que a “a Amazônia seja conhecida por todos” e, de acordo com o governante, combater supostas informações inverídicas sobre a região. Bolsonaro disse ainda que a floresta é “preservada”.
Os dados, porém, dementem o mandatário. Os 13.235 km² de floresta amazônica desmatada entre 1º agosto de 2020 e 31 de julho de 2021 —o Inpe mede o desmatamento de agosto de um ano a julho do ano seguinte— equivalem à área de nove cidades de São Paulo e representam aumento de 75% sobre os desmates de 2018, um ano antes de Bolsonaro assumir a presidência. Na ocasião, 7.536 km² de mata foram ao chão.
O recorde, no entanto, vem sendo batido ano após ano: Em 2019, foram 10,1 mil km² desmatados, no ano seguinte, 10,8 mil km². A menor taxa de desmatamento nos últimos dez anos foi registrada em 2012 (4,5 mil km²).
Procurados, os ministérios das Comunicações e do Meio Ambiente não responderam até a publicação desta reportagem.
Novo recorde à vista
Apesar da promessa de Bolsonaro feita no ano passado na ONU de combater os desmatamentos no país, um novo recorde está prestes a ser batido: entre janeiro e abril deste ano, 5.070 km² de floresta amazônica foram derrubados.
“É 5% a mais do que no mesmo período do ano passado”, diz relatório do Observatório do Clima com os dados do Inpe. “Desde agosto passado, os alertas vêm batendo recordes: em outubro, janeiro, fevereiro e agora em abril.
” Apenas em abril —em plena estação chuvosa, historicamente com menos desmate—, a área derrubada na Amazônia foi de 1.012 km², 74% acima do recorde anterior para o mês, batido no ano passado (580 km²).
Desmatamento na Amazônia em abril:
2016: 439,32 km²
2017: 126,85 km²
2018: 489,52 km²
2019: 247,39 km²
2020: 407,2 km²
2021: 579,98 km²
2022: 1.012,5 km².
Para o Observatório, “a magnitude do dado sinaliza que a taxa de desmatamento de 2022 deverá ultrapassar novamente os 10.000 km²”.
“As causas desse recorde têm nome e sobrenome: Jair Messias Bolsonaro”, diz Marcio Astrini, secretário-executivo do Observatório do Clima.
O ecocida-em-chefe do Brasil triunfou em transformar a Amazônia num território sem lei, e o desmatamento será o que os grileiros quiserem que seja. O próximo presidente terá uma dificuldade extrema de reverter esse quadro, porque o crime nunca esteve tão à vontade na região como agora.
Marcio Astrini, do Observatório do Clima.
Embate com Bolsonaro
Criado há 60 anos em São José dos Campos, a 91 km de São Paulo, o Inpe é o instituto federal especializado em ciência espacial.
Depois da posse de Bolsonaro, o instituto passou a sofrer ataques do Ministério do Meio Ambiente e do próprio presidente em torno dos números de desmatamento na Amazônia, medido pelo Inpe há mais de 30 anos. No auge desse embate, Bolsonaro forçou a demissão do então diretor do instituto, Ricardo Galvão.
Antes da demissão, Bolsonaro afirmou que os dados do instituo publicados em reportagens deixavam o Brasil “malvisto lá fora”.
O Brasil precisa de mais satélites?
Essa não é a primeira vez que o governo federal tenta alternativas ao monitoramento do Inpe. Em dezembro de 2020, o Comando da Aeronáutica assinou um contrato com uma empresa finlandesa pelo qual adquiriu um satélite-radar por US$ 33,8 milhões, cerca de R$ 164 milhões em valores de hoje.
Questionado na época pelo deputado federal Alessandro Molon (PSB-RJ) sobre sua capacidade de monitorar o desmatamento na Amazônia, o Inpe respondeu que, desde setembro de 2019, complementa seu sistema de geração de alertas de desmatamento (Deter) com o uso de dados do satélite Sentinel-1, “instrumento operado pela Agência Espacial Europeia, cujas imagens são distribuídas livremente”, de graça.
O Inpe demonstra ter plena capacidade de manter o sistema de monitoramento tanto com dados óticos como com os de Radar. Além disso, o histórico do INPE demonstra que o Instituto tem capacidade técnica comprovada para conceber projetos de engenharia de satélites.”
Inpe, em resposta ao deputado Alessandro Molon.
Prodes e Deter
Atualmente, o Inpe conta com os Programas Prodes —criado em 1988 para mostrar quanto de vegetação é perdido anualmente pelo desmatamento— e o Deter, criado em 2004 para gerar alertas de desmatamento na Amazônia e Cerrado aos órgãos de fiscalização.
Eles utilizam imagens de satélites próprios e de programas que ofertam as imagens gratuitamente. Tanto o Prodes quanto o Deter fazem o monitoramento de 6 milhões de km², abrangendo todo o bioma da Amazônia e do Cerrado.
Fonte: UOL