EnglishEspañolPortuguês

RELATÓRIO

Crise global de água irá se intensificar com colapso climático

Inundações, estiagens, e incêndios florestais irão se agravar enquanto o aquecimento global perturba o ciclo da água

29 de agosto de 2021
Kaique Pettini Binatti | Redação ANDA
5 min. de leitura
A-
A+
Foto: Ilustração | Pixabay

Problemas de água – estiagens, com incêndios que as acompanham, e inundações – irão provavelmente se agravar muito ao redor do mundo enquanto o colapso climático acontecer, de acordo com a maior avaliação de ciência climática de todos os tempos.

Aquecimento global de ao menos 1.5C provavelmente ocorrerá dentro das duas próximas décadas, de acordo com o Painel Intergovernamental de Mudanças Climáticas (IPCC). O aumento de temperatura será acompanhado de grandes mudanças do ciclo d’água, com áreas que já vem se tornando muito mais úmidas, e áreas áridas cada vez mais secas. Chuva extrema se intensifica em 7% para cada 1C de aumento de temperatura global, o relatório descobriu.

O professor Mike Meredith, líder de ciências na Pesquisa Antártica Britânica (“British Antarctic Survey”) e autor importante do IPCC, disse: “Enquanto a atmosfera continuar a esquentar devido ao aquecimento global, ela pode reter e transportar mais umidade – então, na grande escala, esperamos ver uma aceleração do ciclo hidrológico: evaporação mais fortes nos trópicos, e chuva mais intensa em altas latitudes e em algumas regiões equatoriais. Isso causará chuvas extremas mais frequentes em áreas já úmidas, e uma maior incidência e nível de inundação.

“Já há fortes evidências de que estamos tendo tais mudanças. Em algumas regiões secas, os períodos de estiagem têm piorado e estão durando muito mais. Tais riscos são aumentados por algumas consequências indiretas, como o maior risco de incêndios, que já estamos vendo.”

O professor Ralf Toumi, co-diretor do Instituto Grantham em Mudança Climática do Colégio Imperial de Londres, disse: “O princípio de um mundo mais quente é que mais água será evaporada, exacerbando as secas, e esse maior número de água na atmosfera vai aumentar a quantidade de precipitação quando chove.”

Os efeitos serão sentidos através do mundo, dos EUA, onde a seca é um crescente problema no oeste e no sul, até a Índia, onde as monções poderão variar muito. A África Subsaariana também irá enfrentar um maior período de estiagem em muitas áreas, enquanto inundações e secas irão atingir a China e a Europa.

Ilan Kelman, professor de desastres e saúde da Universidade Colégio de Londres, disse: “A mudança climática fará regimes secos e úmidos mais extremos. A umidade do solo irá cair e a seca vai aumentar em regiões que já são áridas, como o Mediterrâneo e o sul da África. A variabilidade de chuvas sazonais irá crescer, com menos dias de chuva com uma maior quantidade de precipitação”

Mudanças nos padrões de chuva naturais do planeta são um dos maiores impactos da crise climática, e o relatório marco do IPCC, que foi publicado semana passada, contém mais de 200 páginas somente nesse problema. Uma descrição mais completa dos impactos esperados da crise climática na água será publicada no próximo fevereiro, na segunda parte do relatório – o sexto de autoridades mundiais em mudança climática desde 1998 – mas os achados até agora contém severas advertências de problemas que o mundo já enfrenta.

A monção no sul da Ásia – que é chave para as vida e a agricultura de mais de um bilhão de pessoas – é uma particular fonte de preocupação, assim como são áreas abastecidas por geleiras, onde inundações seguidas de períodos de escassez de água provavelmente começarão a ficar mais comuns enquanto as geleiras diminuem e algumas geleiras menores desaparecem.

O IPCC foi cauteloso nos potenciais impactos das monções, com alguns estudos apontando para um potencial enfraquecimento e outros para um fortalecimento. As Monções provavelmente ficarão mais variadas no futuro. “De um lado, nós sabemos que para determinados padrões de ventos de uma monção, haverá mais chuva, mas os padrões de vento da monção podem enfraquecer”, disse Toumi.

O Dr. Andy Turner, professor associado em sistemas de monções na Universidade Reading, e importante autor da IPCC, disse: “Particularmente para as monções no sul da Ásia, sudeste da Ásia, leste da Ásia e no Sahel central [na África], a precipitação das monções está projetada para crescimento no final do século. Porém, mudanças de monções em curto período de tempo serão dominadas por variabilidade interna. Cada grau adicional de aquecimento irá exacerbar a frequência e severidade de eventos extremos em regiões de monções, como períodos de chuva pesada, inundação, e estiagem.”

Centenas de milhões de pessoas também são dependentes diretas de geleiras para água e agricultura, e estes provavelmente serão os sistemas piores afetados. Roger Braithwaite, pesquisador honorário sênior da Universidade de Manchester, disse: “Medições mostram que geleiras em muitas partes do mundo têm um balanço negativo de massa mesmo com as temperaturas médias globais presentes. Geleiras portanto não estão “seguras” sob o Acordo de Paris [que limita o aquecimento a 1.5C como uma ambição, e 2C como o limite superior].”

Meredith acrescentou: “Geleiras mundialmente têm recuado desde os anos 90; isso é algo sem precedentes em ao menos dois milênios. Para muitas comunidades “rio abaixo”, geleiras de altas montanhas são fundamentais para seus estilos de vida, providenciando uma fonte segura de água limpa para beber e irrigar plantações. Enquanto essas geleiras continuam a recuar, o derretimento mais forte causará maior risco de inundações, avalanches e deslizamentos de terra inicialmente – perigos diretos para aqueles vivendo rio abaixo. Nesse curso, a redução de água fresca mudará o risco para um de seca. Há milhões de pessoas vivendo rio abaixo de grandes sistemas de geleiras montanhosas, como os Himalaias; isso é de extremo interesse para as suas vidas e bem-estar.”

Esses impactos em sistemas de água já estão causando devastação para milhões de pessoas ao redor do mundo, piorando a pobreza, rompendo sociedades e tornando a vida em uma batalha diária para alguns dos mais vulneráveis, disse Jonathan Farr, analista sênior de política em mudança climática na associação WaterAid.

Ele apontou particularmente para Malawi, onde o segundo maior lago, o Lago Chilwa, é central para as vidas de 1.5 milhão de pessoas. “Enquanto seus níveis sempre flutuaram, agora está acontecendo mais frequentemente e em maiores extremos, afetando as comunidades locais. Mulheres, mais frequentemente responsáveis por assegurar água para suas famílias, podem frequentemente se enfileirar em poço por horas, por vezes através da noite, esperando os níveis se reabastecerem ao ponto que elas possam retirar água.”

Governos se reunindo para a cúpula da conferência de Mudança climática da ONU em Glasgow em Novembro devem agir não somente em emissões de gás carbono, mas em prover fundos à nações pobres para poderem se adaptar aos impactos da crise climática que já estamos vendo, ele acrescentou.

    Você viu?

    Ir para o topo