Um sino toca às 11h para avisar que o velório está prestes a começar. Ao entrar na capela, a família encontra o corpo em cima de uma mesa, coberto por flores de plástico e por uma manta branca. Atrás dele, há uma imagem de são Francisco de Assis, protetor dos animais.
Debruçados sobre Dara, da raça dogue alemão, Marcos Colombo, 56, e sua mulher, Malena, 50, choram no velório a perda do bicho doméstico que adotaram há dez anos.
“Quando dormia, ela ocupava todo o sofá da sala. Era parte da família. Por isso decidimos preparar o velório, mandar cremá-la [processo que queima o corpo num forno, até virar pó] e guardar as cinzas”, conta Marcos, que levou o corpo de Dara para o Memorial Pet, em São Bernardo (SP). O local oferece o serviço por até R$ 4.500.
Se a despedida do animal doméstico é difícil para adultos, para as crianças pode ser pior. Muitas vezes, é o primeiro contato delas com a morte.
“Sinto falta da Jhully. Lembro que chorei muito quando fui visitá-la pela última vez no veterinário. Até hoje não deixo minha mãe jogar fora os brinquedos dela”, diz Isabelly Miranda, 6, ao lembrar de sua cachorrinha, uma mistura de poodle e lhasa apso, que morreu em março.
Com apenas cinco meses, o filhote de Isabelly teve cinomose, doença grave que pode levar à morte, e precisou ser sacrificado (tomou uma injeção para morrer e não sofrer com a doença). Mas Jhully não teve velório nem cerimônia. Assim como grande parte dos animais que morrem, seu corpo foi recolhido por um serviço gratuito da prefeitura para ser cremado.
Lixo
Nem todos os bichos de estimação são cremados ou enterrados quando morrem. “Quando a Juli partiu, minha mãe colocou o corpo em uma caixa, coberta com um paninho, e deixou-a na rua para o lixeiro”, diz Yuri Rian Teixeira, 9.
Para o vereador Roberto Tripoli (PV-SP), jogar os bichos no lixo não é a melhor solução. Ele fez um projeto de lei que, se aprovado, autoriza o enterro de animais em cemitérios públicos da cidade de São Paulo.
“Dizem que isso pode poluir o lençol freático [água subterrânea]. Mas jogar no lixo polui também. A diferença é que essa lei vai permitir que os animais sejam enterrado como parte da família”, diz Tripoli.
Depois de decidir o que fazer com o corpo do bichinho, chega a hora mais difícil: aprender a lidar com a saudade do amigo.
Velório de cachorro
Quando as pessoas morrem, costumam ser veladas antes de enterradas ou cremadas. O corpo passa algumas horas dentro do caixão, em uma sala, para que a família e os amigos possam se despedir. Com bichos isso não é nada comum.
Mas o Memorial Pet, empresa que crema animais, oferece o serviço. Dara, que morreu velhinha na semana passada, foi velada. Como era grande (da raça dogue alemão), não coube nos caixões da empresa e foi velada em uma mesa.
Depois foi cremada, e as cinzas serão guardadas pelos tutores em uma caixa.
Casa vazia
“Parece que a casa está mais vazia”, diz Yuri Rian Teixeira, 9, quando fala sobre a cachorrinha Juli, que morreu em agosto do ano passado.
“Ela era bastante obediente. Ainda temos a mãe dela, a Nina. Mas sinto falta da Juli”, conta o garoto. O animal doméstico morreu quando tinha três anos. Na rua, foi vítima de maus-tratos. Ele adorava brincar com o garoto e com sua irmã Yasmin dos Santos, 11.
“Estava na casa da nossa tia quando minha mãe ligou e contou que Juli tinha morrido. Chorei muito”, lembra a menina.
Outro nome
Os passatempos preferidos de Jhully eram dormir embaixo da escada, correr atrás de sua bolinha favorita e assistir a desenhos animados com Isabelly Miranda, 6. “Até que ela começou a ficar doente.
Já não enxergava, não mexia as patinhas de trás. O veterinário precisou sacrificá-la [dar uma injeção para o animal morrer e não sofrer]. Chorei bastante”, diz a menina.
Essa não foi a primeira vez que Isabelly perdeu um cachorro com esse nome. “Tinha outra que também se chamava Jhully. Mas ela fugiu. Se eu tiver mais um cachorro, não vou dar o mesmo nome. Vai que isso acontece de novo…”
Fonte: Folha de S. Paulo