EnglishEspañolPortuguês

ESTUDO

Cresce o número de famílias que preferem adotar cães e gatos em vez de filhos

21 de junho de 2023
4 min. de leitura
A-
A+
Foto: Ilustração | Freepik

Nos últimos anos, tem-se observado um número crescente de pessoas que optaram por tutelar animais domésticos em vez de filhos. Esse movimento, conhecido como “pet parenting” ou parentalidade de animais domésticos, reflete uma mudança nos padrões de vida e nas prioridades das pessoas.

O “pet parenting” envolve a adoção consciente e responsável de animais domésticos, como cães e gatos, e a criação de um vínculo emocional forte e duradouro com esses companheiros de quatro patas. Para muitas pessoas, os animais tornaram-se membros da família, recebendo amor, cuidado e atenção semelhantes aos que seriam dedicados a uma criança, a tal ponto que os animais são batizados com nomes de pessoas.

Raiane Mantovani, veterinária e influencer, escolheu essa forma não convencional de ser “mãe”. Abriu mão de ter filhos e adotou Coraline, uma cachorrinha SRD. “A maternidade obriga a gente a abdicar de muitas coisas das quais eu não estou disposta. É a minha carreira, meus sonhos, minhas metas”, relata Raiane. “Hoje eu sou casada e meu marido tem os mesmos objetivos e sonhos, e a nossa cachorrinha Coraline está incluída em todos eles.”

Com 149,6 milhões de animais domésticos, segundo o censo do Instituto Pet Brasil (IPB) de 2021, o Brasil é o terceiro país em número de animais domésticos. Considerando os 215 milhões de brasileiros, pelo menos 70% da população tem um animal em casa ou conhece alguém que tenha.

Assim, a demanda por ambientes “pet friendly”, amigos de animais, tem se tornado crescente, junto à necessidade de uma ampla gama de produtos, como enxovais, carrinhos para passeio e até mesmo berços e creches para os animais de estimação.

Amor incondicional

Raiane afirma ser essencial que Coraline esteja com ela e seu marido em todos os momentos importantes. “Ao pensar em viagens, hotéis ou até mesmo restaurantes, é fundamental que eles sejam ‘pet friendly’ e que ela possa aproveitar conosco.”

A veterinária ainda aborda os preconceitos que enfrenta por ser tutora de animais, lidando com comparações sobre as responsabilidades maternas de ter um filho e cuidar de um animal. “Muitas pessoas têm preconceito com o termo ‘mãe de pet’ porque acreditam que os desafios da maternidade são diferentes dos desafios de cuidar de um animal doméstico. No entanto, acredito que a maternidade não se trata apenas de enfrentar desafios, mas sim sobre o amor incondicional que a gente sente por aquele serzinho que a gente cuida com tanto zelo e com tanto carinho, seja ele um pet ou um filho”, relata Raiane.

O professor Sérgio Kodato, da Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras da USP de Ribeirão Preto, acredita que os tutores de animais podem adquirir um forte vínculo emocional pelos seus animais, uma vez que esses animais passam a ocupar o lugar de um filho, tornando-se membro da família, criando hábitos, alterando rotinas de seus donos e até mesmo modificando o financeiro de um lar, fatores que alimentam uma dinâmica familiar.

O amor incondicional pelos animais acaba gerando um desafio significativo, segundo Raiane. Ela acredita que o maior obstáculo é saber que o tempo de vida de um animal é menor comparado ao da vida humana: “O tempo deles é tão curto, por isso procuro sempre proporcionar o melhor para eles, às vezes até exagero”.

Crescimento do fenômeno “pet parenting”

Wlaumir Souza, sociólogo e psicanalista, explica que o fenômeno “pet parenting” está se tornando cada vez mais comum, devido às condições financeiras e ao encarecimento de ter um filho, além de uma mudança no modelo familiar. “Nós estamos saindo do modelo da família nuclear familiar para a família pet familiar, isso significa maior isolamento humano diante da incapacidade de comunicação e diálogo.”

Souza explica que os animais não respondem, não questionam e são fiéis aos seus tutores e, portanto, são mais fáceis no convívio. “Para ser exato, o tutor do animal não quer uma pessoa independente, com opiniões únicas e pensamento crítico, ele quer alguém que não o questione.”

Kodato chama esse fenômeno moderno de humanização de animais e desumanização de crianças. “Essa perspectiva traz à tona uma série de reflexões e questionamentos sobre a maneira como estamos moldando nossas relações com os animais domésticos e os impactos que isso pode ter no desenvolvimento das crianças.”

O professor ainda informa que, à medida que a atenção e os recursos são desviados dos filhos para os animais, pode ocorrer uma diminuição da interação familiar e da convivência entre pais e filhos. “Algumas famílias podem concentrar seus esforços emocionais e financeiros no cuidado dos animais, negligenciando aspectos fundamentais do desenvolvimento infantil, como a educação, o apoio emocional e as experiências sociais.”

Fonte: USP

    Você viu?

    Ir para o topo