O plantio começou em fevereiro. A fazenda Santa Bárbara, em Urubici, Santa Catarina, já recebeu mudas, orientações sobre manejo e deverá ser paga por serviços ambientais para restaurar 80 hectares como piloto de testes do Conservador das Araucárias, projeto que prevê recuperação de 7 mil hectares da Mata Atlântica nos próximos dez anos. O projeto visa proteger a biodiversidade, restaurar a qualidade do solo e manter a disponibilidade de água da região.
A ideia é formar uma teia com corredores de biodiversidade, áreas de propriedades rurais contíguas que facilitem o desenvolvimento das espécies que vivem nas cercanias do Parque Nacional São Joaquim, em SC. Assim se espera reduzir o risco de desaparecimento de plantas e de animais ameaçados de extinção como a gralha-azul, o papagaio-do-peito-roxo, o papagaio-charão, o veado-campeiro e o gato-do-mato-pequeno.
“A Mata Atlântica tem 2 mil espécies e é um dos biomas mais ameaçados do mundo. Só existem 12,5% da sua área original. Das araucárias, sobraram apenas 3%. Esse foi um dos motivos da escolha”, diz Valéria Michel, diretora de sustentabilidade da Tetra Pak, que patrocina o projeto, desenvolvido em parceria com a Apremavi, ONG fundada há 35 anos para desenvolver projetos de restauração e recuperação de florestas.
“É nossa primeira iniciativa ligada à natureza. Além de o bioma estar ameaçado, a empresa tem uma fábrica em Ponta Grossa, no Paraná. Globalmente temos metas de neutralização de emissões próprias até 2030 e na cadeia de valor até 2050”, diz Valéria. A Tetra Pak é a maior fornecedora de caixas longa vida do mundo. A empresa vai financiar a restauração com a compra de mudas, a capacitação de mão de obra e o pagamento pelos serviços ambientais. “Estamos estudando uma forma de remunerar pela biodiversidade”, afirma Valéria.
Além desses 7 mil hectares, o Conservador deve preparar uma estrutura de certificação para atrair outras empresas a recuperarem uma área total de 13,7 milhões hectares da chamada Floresta com Araucárias, que alcança Santa Catarina, Paraná e São Paulo. Nessa macrorregião, há 107 Unidades de Conservação, 23 Quilombos, 47 Terras Indígenas e 220 Assentamentos de Reforma Agrária.
Entre 2019 e 2020, Santa Catarina perdeu 887 hectares da Mata Atlântica, de acordo com a SOS Mata Atlântica. O estado conserva apenas 3% do bioma, em 2,1 milhões de hectares de áreas remanescentes com restingas, manguezais e campos de altitude. Segundo o ICM Bio, há 71 Reservas Particulares do Patrimônio Natural (RPPNs) federais e 18 estaduais, em uma área de 35 mil hectares.
Os estudos para o Conservador das Araucárias começaram há 3 anos. Foi feita avaliação de certificação de carbono voluntário e de biodiversidade pela plataforma Verra (Verified Carbon Standard – VCS e Climate, Community and Biodiversity Standard – CCB). Há também o acompanhamento da Conservation International (CI), da The Nature Conservancy Brasil (TNC) e da Klabin, fornecedora de matéria prima da Tetra Pak.
“Uma das belezas do projeto é que ele vai trabalhar com uma grande variedade de tipos de produtores rurais, em terras de variados tamanhos e com possibilidades também variadas de adesão”, conta Valéria. “A Apremavi está mapeando o território. Ela conversa com esses proprietários, verifica qual o potencial. Em algumas terras é o plantio, em outras, a recuperação de mata secundária”, completa.
O proprietário será incentivado a fazer a adequação ambiental de toda a propriedade, restaurando as matas ciliares, o entorno das nascentes e a reserva legal.
Apesar do nome, o projeto não se resume ao plantio de araucárias, símbolo e espécie endêmica da região, junto com o xaxim e o palmiteiro. “O objetivo é trabalhar com as outras espécies da floresta. No piloto, estamos usando de 25 a 30 espécies, como o pinheiro bravo, erva-mate, gabiroba, uvaia e goiaba da serra, por exemplo”, diz Miriam Prochnow, conselheira e co-fundadora da Apremavi. “Nas áreas de replantio, um terço das mudas será de araucária, o que significa umas 600 mudas por hectare”, diz Miriam.
“Os ineditismos do projeto são o tamanho da área e o pagamento de serviços ambientais agregado. Não temos nenhum com esse modelo”, diz a representante da Apremavi.
O Conservador das Araucárias deve seguir o modelo de pagamento de serviços ambientais usado hoje pelo Conservador da Mantiqueira, que atua desde 2015 para restaurar áreas de 425 municípios em São Paulo, Rio e Minas. Lá os contratos são de 10 anos e, durante os cinco primeiros, os proprietários recebem um valor fixo (R$ 300 por hectare por ano) para isolar as áreas e não permitir a presença de gado, a caça de animais silvestres e outras atividades que gerem impactos negativos nas águas e no solo.
“Chamamos atenção ao momento que estamos vivendo de emergência climática. Precisamos que todo mundo coloque seu compromisso na mesa. Todo o setor privado poderia estimular projetos desse tipo”, diz Miriam.
Fonte: Ecoa uol