Em um período de seis meses, moradores de Itu (SP) tiveram encontros com onças-pardas duas vezes na cidade. O último caso foi na segunda-feira (13), quando uma delas foi encontrada dentro da garagem de uma casa em um condomínio.
Os responsáveis pelo resgate do animal foram os veterinários do Centro de Reabilitação Animal Silvestre (Cras) Núcleo da Floresta, que fica em São Roque (SP). Após avaliação, a onça foi microchipada e solta na natureza.
Esta é apenas uma parte do trabalho realizado pelo Cras. Ao todo, a equipe monitora atualmente 12 felinos que foram resgatados desde 2016 em áreas urbanas no interior de São Paulo.
Rafael Mana, biólogo da equipe de veterinários do Cras Núcleo da Floresta, explica que o resgate das onças é feito quando o felino está em chamados “locais de conflito”, ou seja, dentro ou próximo de residências, condomínios, chácaras e empresas.
“Locais com outros animais em volta, cães. Se não tirar a onça de lá, a chance de dar problema é grande”, explica. Mas, apesar do medo que a população tem das onças-pardas, Rafael ressalta que a espécie é tranquila e não busca proximidade com os seres humanos.
“O animal está ali simplesmente por uma ocasião, pode ser fugindo de uma queimada, pelo desmatamento de áreas verdes. A maioria das resgatadas são filhotes, ou seja, são animais jovens, que têm aquele ímpeto de estabelecer território, de conhecer limites, até para saber aonde ele pode ir.”
A busca por alimento também é um fator que atrai onças para ambientes urbanos, explica o biólogo.
“Em alguns condomínios, os moradores têm um costume de usar a área verde, as áreas de proteção permanente, para colocar galinheiro, para criar animais. E, normalmente, são áreas coladas com a área de mata. Então, as onças vêm pela área de mata, beirando os cursos d’água, e acabam atacando os galinheiros, atacando ovelhas, cabritos. Na verdade, é tudo uma questão da intervenção humana no ambiente natural.”
Acompanhamento e captura
Segundo Rafael, as equipes do Cras são informadas sobre a aparição desses animais. A partir daí, começa o trabalho para tentar descobrir por qual área a onça está passando.
“O nosso trabalho começa quando um morador nos avisa que avistou uma onça e nos passa uma possível localização. A partir disso, colocamos algumas câmeras de monitoramento na região por onde o animal está circulando e começamos a acompanhar a sua movimentação”, relata o biólogo.
Para garantir uma captura segura, os veterinários que atuam nos resgates aplicam um sedativo na onça. “Assim não corre risco de ela se machucar ou machucar alguém. Fica mais seguro e menos estressante para o animal”, explica Rafael.
E depois do resgate?
Depois da captura, os veterinários precisam ser ágeis. Isso porque geralmente são animais grandes, fortes e selvagens, que podem se machucar ou desenvolver algum estresse se permanecerem muito tempo em cativeiro.
“Esperamos passar totalmente o efeito da sedação para que o animal recupere totalmente seus sentidos e fique seguro na natureza. Se o animal está em boas condições de saúde, depois do resgate, da microchipagem e desse tempo de recuperação, ele já é levado para a área de soltura”, explica Mana.
Banco de dados
O microchip que é colocado no corpo da onça-parda não é rastreável, mas permite que seja criado um banco de dados com informações de animais já resgatados.
“A gente coloca um microchip nessas onças que estão resgatadas que permite a identificação do animal. Então, se caso a gente resgatar esse animal em um outro local, posteriormente, conseguimos verificar os dados dela, se já foi resgatada, quando foi, onde foi solta. É uma base de dados que ajuda em situações de reincidência”, pontua o biólogo.
Atualmente, o CRAS em São Roque monitora 12 onças-pardas no interior de São Paulo. São:
Cinco resgatadas em Itu;
Duas em São Roque;
Uma em Ibiúna;
Uma em Cerquilho;
Uma em Porto Feliz;
Uma em Salto;
Uma em Salto de Pirapora.
Soltura segura
Para a soltura dos animais resgatados, a equipe do Cras conta com áreas espalhadas em todo o estado de São Paulo.
“O núcleo prioriza áreas próximas de onde o animal foi resgatado, pois é o mesmo tipo de vegetação, é o mesmo tipo de ambiente, a temperatura é semelhante. Então, o animal se adapta de uma forma mais rápida, mais fácil. E isso é importante para a conservação daquela genética regional. Não adianta tirar o animal daqui, levar o animal para o Pantanal, levar o animal para a Amazônia, foge do propósito.”
🐆 Cruzei com uma onça. O que faço?
Alexia Gazzola Steiner, veterinária especializada em animais silvestres, que participou do resgate da onça-parda que apareceu em um condomínio em Itu na segunda-feira, ressalta que, em geral, as onças são animais dóceis e que sentem medo de humanos.
“É uma espécie da nossa região. Com o crescimento urbano, aumento na incidência de queimadas, a espécie vai se aproximando cada vez mais da cidade. Temos que aprender a coexistir com elas com total respeito e saber o que fazer quando um animal desse aparece”, reforça Alexia.
Ao avistar uma onça-parda, as orientações são:
Não tente correr, pois o animal pode se sentir ameaçado e atacar;
Não grite;
Mantenha distância para que o animal siga o caminho dele;
Quando estiver mais distante do animal, siga devagar, em direção oposta, sem virar as costas para o felino.
“A população não pode tentar capturar o animal, em nenhuma hipótese. Deve chamar autoridades competentes, que vão fazer este trabalho”, explica Rafael.
Para os moradores de propriedades rurais, a orientação dos especialistas é para que recolham animais que vivem no local, principalmente as aves que têm uma tendência a dormir em árvores e se tornam presas fáceis das onças-pardas.
Situação cada vez mais comum
Mana comenta que a aparição de onças-pardas nas cidades é algo cada vez mais comum e que é necessário que as instituições e prefeituras façam trabalhos educativos sobre como agir corretamente nessas situações.
“Não são mais casos isolados, como era antigamente. A expansão urbana faz com que cada vez mais esses animais cruzem com os seres humanos. Por isso, é importante educar sobre o real perigo que a onça representa, que é muito menor do que a população costuma achar. A onça não vai comer um cachorro, por exemplo, ela não tem nenhum tipo de interesse em animais domésticos. E também não tem comportamento de entrar em conflito com seres humanos. Só ataca quando se sente ameaçada”, pontua Rafael Mana.
O Cras Núcleo da Floresta é uma instituição particular que atua no resgate e reabilitação de animais silvestres. Para continuar realizando o trabalho pelo interior de São Paulo, o centro conta com doações financeiras. Quem quiser contribuir, pode entrar em contato pelo site da instituição.
Pelas redes sociais da instituição, é possível obter informações de contato e conhecer mais sobre o trabalho feito pelas equipes.
Fonte: G1