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MUDANÇAS CLIMÁTICAS

Conheça, antes que acabe, a praia do Rio que está sendo engolida pelo mar

Entre as razões estão centenas de barragens no rio, ocupações desordenadas e, é claro, o aquecimento global

18 de maio de 2025
Julinho Bittencourt
3 min. de leitura
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São João da Barra. Foto: Divulgação/Defesa Civil

Se você está procurando por um destino de férias que esteja sumindo diante dos seus olhos, talvez queira conhecer Atafona, no município de São João da Barra (RJ). A cada ano, essa praia no norte fluminense perde cerca de cinco metros de território para o mar. Um espetáculo da natureza — ou da nossa teimosa negligência — com ingressos cada vez mais escassos.

Ruínas de casas, clubes, escolas e até ruas inteiras hoje fazem parte da paisagem submarina. Cerca de 500 edificações já foram engolidas. Mas, se quiser saber como era antes de o mar fazer check-in permanente, só conversando com moradores como a aposentada Sônia Ferreira. Ela, que perdeu não uma, mas duas casas — uma levada pelo mar, outra soterrada pela areia — resume a situação com um misto de nostalgia e resignação:

“Minha casa era aqui”, diz, apontando para o nada.

Há 45 anos, a visão da casa de Sônia incluía quarteirões, calçadão e um montinho de areia entre ela e o mar. Em 2019, o oceano resolveu dispensar a burocracia e fez a curva direto no terreno da aposentada. E assim segue a história em Atafona, onde a maré não sobe — ela muda de CEP.

Mas o que está acontecendo, afinal? A pesquisadora Thaís Baptista, da Universidade Federal Fluminense (UFF), estuda o fenômeno há duas décadas. Segundo ela, a erosão costeira ali é quase uma tradição milenar. Só que, nos últimos tempos, os seres humanos decidiram colocar um turbo no processo com um combo que inclui: centenas de barragens no rio Paraíba do Sul, ocupações desordenadas e, claro, o aquecimento global.

“A planície erodia, mas depois se recuperava. Agora… bom, agora está complicado”, resume Thaís, com a serenidade de quem já cansou de avisar.

Barragens

O rio Paraíba do Sul, que atravessa três estados, é hoje refém de 943 barragens. O resultado? Menos sedimentos chegando à foz, e mais areia sendo carregada pelo mar sem reposição. É tipo um caixa eletrônico que só faz saques — uma hora o saldo acaba. Some a isso o nível do mar subindo (13 cm entre 1990 e 2020, com promessa de mais 21 cm até 2050), ondas mais fortes e ventos mais intensos, e temos uma tempestade perfeita — e literal.

“A gente tem mais energia na atmosfera, mais vento, mais onda. Então o mar avança mais. Simples assim”, explica o geógrafo marinho Eduardo Bulhões, também da UFF. Simples e assustador.

A ONU, inclusive, já colocou Atafona na lista das 31 localidades mais ameaçadas do mundo pela elevação dos oceanos. E, como em toda boa tragédia anunciada, a solução óbvia — retirada e realocação das famílias — segue enfrentando resistência. Afinal, como admitir que a natureza está vencendo, com ajuda expressa de nossa própria teimosia?

“A gente não cuidou direito do planeta e agora estamos pagando a conta”, reconhece Sônia. Mas ela garante: não vai assistir de camarote. Enquanto o mar segue cobrando juros sobre a dívida ambiental, os moradores resistem como podem, tentando evitar que Atafona vire apenas mais uma lenda contada entre escombros.

Fonte: Revista Fórum

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