Em meio aos incêndios no Pantanal este ano, o Parque Nacional do Pantanal Matogrossense teve entre 12 e 15 mil hectares queimados até agora, a maior área em unidades de conservação sob administração federal. Por enquanto é uma situação considerada moderada comparada a outras temporadas, como em 2023, quando pouco mais da metade dos 135 mil hectares do parque foram queimados.
Felizmente, não há observações registradas de animais feridos. O parque é lar de onças-pintadas, ariranhas, antas, sucuris e muitos outros exemplares da fauna brasileira. Outra reserva importante da região de Poconé (MT), o Parque Estadual Encontro das Águas, se mantém longe do fogo, sem registro de focos, informou o Corpo de Bombeiros do estado na quinta-feira (11).
O bioma enfrenta a pior seca em 70 anos, e a temporada crítica para incêndios, quando baixam os níveis dos rios da região, está apenas começando. O auge costuma ser o mês de setembro, segundo monitoramentos de anos anteriores. Apesar do anúncio do governo do Mato Grosso do Sul sobre o controle dos incêndios no estado, o momento é considerado cedo demais para comemorações.
“O satélite não está captando, mas tem fogo. Com o frio há uma semana na região, diminuiu a intensidade”, afirma o chefe do parque, Nuno Rodrigues, analista ambiental do ICMBio que atua na região há 20 anos. O monitoramento espacial da região, assim como de incêndios em todos os biomas do país, é feito pelo Inpe (Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais).
No último fim de semana, três quilômetros de trincheiras foram cavadas em pouco mais de 24 horas na porção nordeste do parque, local acessível apenas por helicóptero. Eliminar parte da vegetação com aceiros, nome dado às valas, forma uma barreira contra a dissipação das chamas, que nessa região viajam por baixo da terra, o chamado “fogo subterrâneo”.
“Esse ano, até agora não temos um combate intenso com fumaça, é mais incêndio de turfa, fogo subterrâneo e menos intenso, apesar de ter fumaça também”, explica Nuno.
Incêndios desde o ano passado
O incêndio que hoje se espalha por milhares de hectares no parque mudou de forma desde o ano passado, conta o chefe da unidade de conservação. Na época de chuvas, nos meses de outubro e novembro, o fogo causado por raios começou, e ao contrário de outras temporadas de cheia, desta vez a chuva não foi suficiente para apagar o incêndio ou alagar a região onde ele se encontrava.
Entre 2023 e 2024, o Pantanal praticamente não teve cheia, aponta estudo com imagens de satélite feito pelo WWF-Brasil. O tempo quente e seco, intensificado por dois anos de fenômeno climático El Niño, fez com que a seca deste ano se adiantasse, e o fogo está encontrando áreas onde haveria rios, mas hoje estão apenas detritos no fundo dos cursos secos.
“Esse incêndio estava sem combate, pois no parque era uma pequena ilha de material aceso que ficou durante o período da chuva, que tivemos pouca, e também pouco alagamento, o que manteve a turfa acesa. Quando a seca deu combustível ao fogo para se espalhar, começou a queimar por dentro dos corixos secos [valas deixadas pelos rios do Pantanal]. Os cursos de água com material orgânico acumulado no leito foi por onde o fogo se propagou, e permanece ativo até hoje. A partir do final do mês passado, passamos a fazer combate com equipes e aeronaves, e temos uma diminuição significativa da quantidade de focos ativos no parque. Estamos atuando em três focos, a situação hoje é muito melhor do que era no início de junho”, afirma Rodrigues.
Hoje os trabalhos de combate ao fogo envolvem 64 profissionais de ICMBio, Força Nacional e Ibama. Reforços são esperados a partir desta semana, com expectativa de chegarem mais 20 brigadistas.
Especialistas em socorro de animais
No último dia 9, iniciaram-se os trabalhos para organizar o Comando de Incidente da Fauna na região, estrutura do ICMBio voltada ao monitoramento de impactos e atendimento à fauna atingida pelos incêndios florestais na região da rodovia Transpantaneira, que vai de Cuiabá a Cáceres (MT).
A iniciativa colocará em campo profissionais das áreas de medicina veterinária e biologia para avaliar as consequências do incêndio florestal no Pantanal para a fauna silvestre e realizar atendimento de animais resgatados.
Segundo dados do ICMBio, répteis e roedores são os animais mais atingidos em grandes incêndios no bioma.
O Parque Nacional do Pantanal Matogrossense está em local isolado, sem acomodações ou hospedagens na região, que tem visitação mais intensa do turismo de pesca, em barcos-hotéis. Ainda assim, cerca de 600 visitantes passam pela unidade de conservação todos os anos, e podem fazer passeios de barco e trilhas em sítios arqueológicos. Os incêndios não impedem até agora a visitação, pois as áreas de fogo estão distantes dos locais acessados por turistas.
SGB alerta sobre nível do rio Paraguai
Boletim de monitoramento, divulgado pelo Serviço Geológico do Brasil (SGB) nesta quarta-feira (10) afirma que a seca que atinge a Bacia do Rio Paraguai, no Pantanal, é uma ameaça real à segurança hídrica de municípios dos estados de Mato Grosso e Mato Grosso do Sul. “Os níveis dos rios devem alcançar os menores valores já registrados para o período”, afirma o relatório.
De acordo com o boletim, a situação é crítica desde o município de Cáceres (MT), que fica localizado próximo às nascentes do rio, até a região de Porto Murtinho (MS), na saída do curso de água do território brasileiro.
As medições feitas pelo SGB mostram que o rio está com medições negativas que variam de um a quase quatro metros abaixo do esperado para esta época do ano. “Temos níveis próximos ou abaixo das mínimas históricas para o período em praticamente todas as estações monitoradas na bacia”, alerta o pesquisador em geociências do SGB, Mauro Campos Trindade.
Na última semana, o acumulado de chuva na Bacia do Rio Paraguai foi considerado “insignificante”. O boletim ainda aponta que os trechos do rio em Barra do Bugres (MT), Cáceres (MT) e Miranda (MS) já apresentam os níveis mais baixos registrados no histórico de monitoramento para o mês.