Humanos têm uma fraqueza: quando os cães erguem as sobrancelhas e mostram seus olhos grandes e arredondados pedindo por comida ou atenção, fica difícil não se encantar. A expressão, que pode ser conhecida popularmente como “carinha de coitado”, é apontada como anterior à domesticação desses animais e pode aparecer em coiotes (Canis latrans). Essa descoberta aparece em um estudo da revista Royal Society Open Science publicado na última quarta-feira (2).
A expressividade dos cães é resultado de um músculo bem desenvolvido ao redor de seus olhos, que se chama levantador do ângulo do olho medial (LAOM). Um estudo anterior, de 2019, indicou que esse músculo é subdesenvolvido (ou, por vezes, sequer existe) no parente vivo mais próximo dos cães domésticos, o lobo-cinzento (Canis lupus). Isso levou os pesquisadores a pensarem que os “olhos de cachorro” poderiam ter surgido com a domesticação desses animais, que ocorreu há mais de 10 mil anos.
Uma equipe do Departamento de Biologia da Universidade Baylor, nos Estados Unidos, optou por explorar essa hipótese, analisando a anatomia de um parente ainda mais distante: o coiote. Para isso, os pesquisadores dissecaram 10 animais que morreram atropelados, garantindo que fossem testados geneticamente para confirmar que não eram resultado do cruzamento entre cães selvagens e domésticos.
Embora pareça uma tarefa simples, dissecar o músculo LAOM é uma tarefa complicada. “Este músculo em particular é incrivelmente próximo e muito firmemente preso à pele. Então, é muito fácil não vê-lo”, disse Sarah Kienle, bióloga e líder da pesquisa, em entrevista a revista Science. “Removendo o pelo e a pele, você tem que ser incrivelmente cuidadoso, quase um artista, para prestar muita atenção onde as fibras musculares estão.”
A resposta está no músculo LAOM
As análises mostraram que todos os coiotes possuíam o LAOM, tão bem desenvolvido em comparação com o cão doméstico usado em comparação. Com esse achado, aliado a outros estudos que também demonstram a presença desse músculo em parentes distantes, como os cães-selvagem-africano (Lycaon pictus), a equipe chegou à conclusão de que a expressão pode ter se desenvolvido ao longo da evolução desses animais, e não a partir da domesticação pelos seres humanos.
Isso tornaria o lobo-cinzento uma exceção entre os canídeos. A perda dessa característica ao longo do tempo poderia ser explicada pela sua forma de comunicação, que acontece predominantemente por vocalizações de longa distância.
Limitações do estudo
No entanto, os pesquisadores fazem uma observação: não está claro se os coiotes realmente exibem a expressão de “olhos de coitado.” Como não há registros em vídeo ou fotografias dessa expressão em coiotes, ainda não é possível afirmar com certeza se eles são capazes de produzi-la e utilizá-la em sua comunicação.
Além disso, não se pode descartar uma certa influência do processo de domesticação na execução dos ‘olhinhos’. Um outro estudo, publicado em 2013, revelou que os cães que recorriam ao levantar das sobrancelhas eram adotados com mais rapidez do que aqueles que não apresentavam esse comportamento. Dessa forma, mais estudos e observações na natureza são necessários para melhor compreender esse olhar tão querido pelos humanos.
Fonte: Galileu