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Cinema Anima… o quê?

14 de junho de 2013
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Desde que comecei a pesquisa em cinema animalista observo que a maioria das pessoas se confundem, ou mesmo não compreendem, a expressão “animalista”. Curioso fenômeno. Fico me perguntando se a mesma confusão ocorre quando falamos em cinema ambientalista, alguém tem grandes dúvidas sobre o que seria?

O espantoso é que o que se convencionou chamar de “ambientalismo” começou a ser pensado, enquanto movimento socioecológico, a partir dos anos 70, sendo a Conferência de Estolcolmo o seu grande marco histórico. Nos meios acadêmicos o debate ambientalista tem início na primeira metade do século XX, enquanto que a questão animal foi inaugurada como pensamento acadêmico séculos antes. Ainda que o debate animalista tenha ficado por muito tempo restrito aos meios acadêmicos da filosofia moral e do direito, ainda assim, enquanto abordagem social, é um acontecimento anterior ao fenômeno do ambientalismo. As condições dos animais passaram a aparecer na discussão social, ainda que de forma a considerar apenas seu bem-estar e não sua relevância moral enquanto indivíduos, a partir da primeira metade do século XIX com as leis anti-crueldade. O fato de, em pleno século XXI, ainda não sabermos de imediato o que significa a filosofia, o pensamento, ou o cinema animalista, é mais um sintoma do descompasso entre o que a sociedade pensa ser moralmente em relação aos animais, e o que é.

Mas então o que é o cinema animalista? Em poucas palavras, é o conjunto de filmes ativistas pelos animais. Essa definição vem se opor ao que costumamos entender como filmes sobre animais. Os filmes animalistas não são filmes sobre animais, o cinema animalista é sobre humanos. Quer fazer um filme sobre animais? Então coloque uma câmera no seu jardim e observe os insetos, observe seu cão, ou fale sobre as girafas. Depois faça algumas perguntas à biologia, outras às ciências comportamentais, e eis um filme sobre os animais do seu jardim, da sua casa ou da savana africana. Essencialmente o cinema animalista fala sobre a humanidade, sobre quem somos nós, sobre como escolhemos considerar ou desconsiderar os não humanos moralmente, o cinema animalista é sobre nossa relação com os animais colocada sob o ponto de vista ético.

Gostaria de terminar essa coluna com mais uma reflexão: eu tenho me perguntado sobre filmes animalistas baseados na imagem da crueldade. Vamos retomar Terráqueos. Ele passa a ideia de abolição do uso de animais? Sim, foi um filme fundamental pra mim e para muitas pessoas que conheço. Não estou dizendo que o filme não é relevante. Estou abordando um aspecto dele. O problema dos filmes baseados na imagem da crueldade é que ela é tão emocionalmente pesada que se sobrepõe ao argumento. Para as pessoas que ainda não entenderam que o problema central é o uso, e não o abuso, a retórica imagética baseada na crueldade leva o espectador imediatamente para o problema do mau tratamento.
Outro ponto que acho necessário levantar é o descrédito que suscitam suas imagens. É muito fácil a pessoa ver as imagens de arquivo de Terráqueos e chegar a conclusão que são muito antigas e que não representam mais a realidade. Além disso, o bem-estarismo tem sido muito eficaz em propagar a ideia de que agora as fazendas são bastante confortáveis e humanas. Ainda que algumas sejam, se queremos o fim da escravidão animal, meu ponto é que a imagem da crueldade nem sempre é a melhor opção.

Eu também tenho me perguntado sobre o ativismo pelos animais no cinema. Será que ele estará permanentemente ligado às abordagens educativas? Ou seria possível desligá-lo dessa transmissão vertical de conhecimento, e fazer filmes mais conectados com esse mundo no qual não são mais tão aceitáveis as vozes da autoridade? Eu acredito que o nosso tempo não tem interesse em cantilenas evangelizadoras, então como usar o veículo audiovisual para trazer contribuição à causa animal? Como vamos disseminar o abolicionismo de uma forma atrativa, que desperte o interesse do público através de uma linguagem interessante e desafiadora? A abolição do uso de animais propõe uma série de desafios ao status quo, há arte revolucionária sem a revisão da sua fórmula?

Precisamos desatar o nó do cinema animalista: cineastas não estão falando sobre a questão animal e abolicionistas não estão fazendo cinema. Não que a solução simples dessa equação seja o fim do problema, talvez seja o início de outro.

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