As baleias têm um papel importante no fortalecimento dos ecossistemas oceânicos e, também, na preservação do planeta. E isso se deve, entre outras coisas, às suas fezes. Ricas em nutrientes, como ferro, nitrogênio e fósforo, quando em contato com a luz do sol, desencadeiam a proliferação de fitoplâncton, que é a base da maioria das cadeias alimentares marinhas.
Outro ponto é que, por meio da fotossíntese, o fitoplâncton absorve cerca de 22 milhões de toneladas métricas de dióxido de carbono a cada ano, o equivalente a quantidade emitida por cerca de 4,8 milhões de veículos em 12 meses. Além disso, quando essas plantas microscópicas morrem e afundam no mar, parte do carbono fica depositado a longo prazo.
Todo esse mecanismo parece perfeito, tanto para a vida oceânica quanto para a saúde da Terra. O problema, destaca reportagem da Hakai Magazine, é que a caça industrial ocorrida no século XX contribuiu para a perda de cerca de 3 milhões de baleias. E, com menos animais defecando nas águas, há menos ciclagem de nutrientes e menos sequestro de carbono.
Para mudar esse cenário, a cientista marinha Edwina Tanner e um grupo de colaboradores da WhaleX Foundation estão desenvolvendo cocô de baleia sintético, composto em grande parte de nitrogênio com um pouco de fósforo e oligoelementos, como sílica e ferro.
Uma primeira leva – de 80 galões – foi lançada em dezembro de 2021 no Mar da Tasmânia, na costa leste da Austrália. Em breve, os pesquisadores irão despejar no mesmo local cinco vezes essa quantidade. Só que desta vez, eles testarão uma nova técnica.
Há três anos, o cocô falso foi bombeado diretamente para o mar a partir de tanques a bordo de um barco. No novo experimento, que acontecerá no começo de 2025, serão utilizados dois ou três “biopods” (cilindros de cerca de 4,8 metros de comprimento cheios de água do mar e excrementos). A ideia é que o fitoplâncton cresça dentro dos biopods por quatro a sete dias. Depois disso, o conteúdo será liberado no oceano.
A Hakai Magazine explica que esses recipientes de plástico não só ajudarão a manter os nutrientes flutuando na superfície do oceano, mas também permitirão que a WhaleX meça com precisão quão bem as microalgas cresceram e calcule a quantidade de carbono capturada no processo.
Trabalho britânico segue a mesma linha
Diante da avalanche de benefícios das fezes de baleia, há outros trabalhos seguindo a mesma linha em andamento. Um deles é o projeto internacional Marine Biomas Regeneration, liderado pelo químico David King, da Universidade de Cambridge, da Inglaterra.
Sua abordagem envolve espalhar na superfície do mar poeira rica em nutrientes retirada do vulcão Hunga Tonga-Hunga Ha’apai, de Tonga, misturada com cascas de arroz cozidas. A próprio Tonga e também Tuvalu expressaram interesse em usar a técnica para tentar neutralizar o declínio local do atum e de outros peixes importantes.
“Acreditamos que se pudermos imitar a função do cocô de baleia, poderemos — ao longo de um período de talvez 40 ou 50 anos — retornar as populações de peixes, mamíferos e crustáceos do oceano para onde estavam há 400 anos”, enfatizou o químico.
Mas, apesar das boas possiblidades, há preocupações com a distribuição de fezes falsas no mar. Por exemplo, se a fertilização de nutrientes mudará a química do mar profundo. “Será essencial examinar as respostas ecológicas das águas superficiais ao fundo do oceano antes que ele seja adaptado em larga escala”, observou o biólogo conservacionista Joe Roman, da Universidade de Vermont.
Fonte: Um Só Planeta