Várias cidades turísticas do Nordeste proibiram veículos de trações animal nos últimos tempos. Com isso, surge uma série de dúvidas relacionadas ao trato desses animais e à subsistência dos trabalhadores que dependem deles. Porém, para o professor Francisco Figueiredo, de Direito Animal na Universidade Federal da Paraíba (UFPB), há uma certeza: “Não existe hoje nenhuma justificativa para que os veículos de tração animal continuem se perpetuando.”
Figueiredo, que também é coordenador do Núcleo de Justiça Animal da UFPB (NEJA), frisa que não conhece nenhuma possibilidade de existir a tração animal sem dor e sem sofrimento. “Os atestados por parte de médicos veterinários, ou mesmo de zoologistas, em laudos que são produzidos para que a gente ingresse com ações próprias para defender esses seres atestam que em todas as vezes eles são submetidos a uma quantidade de sofrimento, inclusive em relação ao peso das cargas”, explica o professor.
Os municípios de Cairu e Jijoca de Jericoacoara, na Bahia e no Ceará, respectivamente, proibiram a prática depois que um vídeo de um cavalo morrendo em uma praia da ilha de Morro de São Paulo viralizou na internet.
Para Figueiredo, não é preciso chegar a esse extremo, em que o animal venha a óbito, para evidenciar os maus-tratos ali sofridos. Segundo ele, o desconforto animal começa desde a preparação para a montaria, quando, por exemplo, são postos o bridão ou freio –ferramenta presa na boca do cavalo para controlá-lo.
“É um ferro que entra na boca do animal. À medida que vai sendo utilizado, com o passar do tempo, desgasta os dentes do animal, então fica no nervo. Imagina o tamanho da dor que o animal sente quando ele é freado? Por isso que ele freia, ele é freado pela dor”, diz.
E os trabalhadores?
Para muitos, o uso de cavalos, burros e outros animais para levar carroças é um meio de sobrevivência. A principal pergunta que fica com a proibição dos veículos de tração animal é relacionada a esses trabalhadores: como irão se manter?
O decreto que proíbe a prática em Jericoacoara diz que “a Autarquia de Desenvolvimento do Turismo, Mobilidade e Qualidade de Vida de Jericoacoara – ADEJERI deverá providenciar o diagnóstico e cadastro dos operadores afetados pela proibição do caput deste artigo para verificação de possibilidade de inserção em outras atividades.”
Já em Cairu, a prefeitura afirma que promoverá diálogos com as representações de transportes que utilizam tração animal e demais representações, para construção de solução definitiva e segura para a resolução da questão.
O Terra buscou contato com ambas as prefeituras para saber detalhes sobre os efeitos da proibição nesses municípios, mas não conseguiu contato ou retorno delas até o fechamento da reportagem. O espaço segue aberto.
O professor Francisco defende que o Estado atue de forma direta nessa situação para que os trabalhadores não fiquem desamparados. Na prática, porém, nem sempre é o que acontece.
O direito animal
O NEJA, projeto de extensão para alunos da UFPB, já existe há quase 10 anos. Ainda assim, o professor Francisco considera que o nicho do direito animal ainda é muito incipiente. “É um direito emergente, é um direito novíssimo que está em formação”, considera. A própria nomenclatura “direito animal” ainda é muito discutida.
Atualmente, há cerca de 80 pessoas integrando o NEJA, entre estudantes de direito, veterinária, zootecnia e áreas correlatas. O projeto lida com denúncias de maus-tratos animal e ingressam com ações defendendo os bichos.
Fonte: Terra