Chuva ajuda a conter fogo no Pantanal, mas situação ainda é grave
Além dos focos de incêndio com origem em ações humanas, bioma é ameaçado pela seca e fogo subterrâneo provocado por queimadas
14 de agosto de 2024
Redação CicloVivo
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No final de semana, a chuva e a queda de temperaturas no Pantanal ajudaram a conter novos focos de incêndio no bioma, mas a situação ainda é muito grave. “A chuva deu uma boa amenizada nos focos de incêndio, mas principalmente no Pantanal Norte ainda existem focos ativos e no Pantanal Sul tem outros surgindo. Agora é hora de rescaldo, porque vai voltar a esquentar e a situação pode voltar a piorar”, explica Gustavo Figueiroa, diretor de comunicação do SOS Pantanal. Rescaldo é a ação de eliminar resquícios de fogos e combustíveis para novos incêndios nas áreas queimadas.
Segundo o Corpo de Bombeiros, mesmo com a chuva, quatro regiões do Mato Grosso do Sul ainda registravam queimadas e demandavam operações contra o fogo e focos de calor, na noite de sábado. Além disso, no fim de semana ainda havia incêndios em Miranda, próximo à Salobra, ao longo da BR-262; na Serra do Amolar; nas proximidades de Paiaguás; e em Passo da Lontra, na Estrada Parque. No Mato Grosso ainda havia 3 focos ativos.
Outra grande preocupação é o fogo subterrâneo. “O fogo pode persistir em camadas mais profundas do solo, como a turfa, reacendendo em condições climáticas favoráveis”, explicou o especialista em geoprocessamento da Operação Pantanal Sul, Paulo Simeoni.
O BDQueimadas, do INPE, mostra que 2.112 focos de calor foram registrados no Pantanal nos 10 primeiros dias de agosto. Os números dos primeiros cinco dias deste mês superaram todos os focos registrados em julho. E a parcial para agosto também é superior à média histórica do mês, de 1.478 focos.
“Já foram 1,5 milhão de hectares consumidos pelo fogo, o que corresponde a 10% do Pantanal”, conta Gustavo.
Os danos à fauna e à flora continuam crescendo. O incêndio já foi contido no refúgio ecológico Caiman, em Miranda, mas a chuva e o frio do fim de semana não apagaram os troncos em brasa, que continuam ativos. Segundo matéria publicada pelo ((o))eco, o refúgio, um santuário de ararinhas azuis, teve 80% de sua área queimada.
Os incêndios no Pantanal ainda mataram a onça-pintada Gaia, uma das felinas monitoradas pela ONG Onçafari. O animal tinha 60 kg, era monitorado desde maio de 2013 e gerou quatro filhotes.
Efeitos da seca para a biodiversidade
O GRAD (Grupo de Resposta a Animais em Desastres) estima que mais de 43% do bioma pantaneiro sofre os efeitos das queimadas e secas.
Desde 2020 atuando na região Pantanal Norte, em Mato Grosso, o GRAD vem realizando pesquisas, resgates, realocações e assistência veterinária e alimentar aos animais sobreviventes. Por meio de uma parceria com o Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio) a instituição realizou um estudo para evidenciar os efeitos do baixo nível d’água nas bacias ao longo da Transpantaneira do Mato Grosso.
O grupo atua com profissionais especializados e capacitados, mas alerta para o estado de emergência e vulnerabilidade que esses animais estão expostos.
O monitoramento, utilizando armadilhas fotográficas em pontos estratégicos e a busca ativa por rastros, pegadas e animais, contribuiu para evidenciar os impactos críticos do baixo nível de água sobre a fauna local. Ao todo, foram observados 899 animais, entre aves, mamíferos e répteis.
A seca severa que assola a maior planície alagada do mundo, ameaça a sobrevivência da flora e fauna local. As precipitações e níveis dos rios abaixo do esperado e o crescimento das queimadas prejudicam a busca de água, causando desnutrição e desidratação dos animais.
Outro problema denunciado pelo GRAD é que ao buscar por focos de água os animais se atolam na lama e como estão debilitados não conseguem sair sozinhos.
Origem dos incêndios e mudanças climáticas
Na semana passada, a rede de cientistas do clima da World Weather Attribution (WWA) divulgou o 1º estudo de atribuição sobre os incêndios no Pantanal. O estudo mostrou que as mudanças climáticas tornaram as condições que alimentam o fogo – calor, seca e vento – 40% mais intensas e de 4 a 5 vezes mais prováveis no Pantanal ocidental.
Mas, para além das mudanças climáticas e condições para que o fogo se espalhe, é preciso identificar a origem dos focos de incêndio. No começo de julho, A ministra do Meio Ambiente e Mudança do Clima, Marina Silva, esteve na região no dia 1º de julho de 2024 e confirmou que a Polícia Federal está investigando a origem de pelo menos 18 focos de incêndio no Pantanal. A suspeita é de que os focos sejam decorrentes do descontrole de queimadas praticadas ilegalmente, a maior parte (85%) em áreas privadas.
Imagens de satélite do BDQueimadas, do INPE, e do Laboratório de Aplicações de Satélites Ambientais da Universidade Federal do Rio de Janeiro (LASA/UFRJ) confirmam que apenas em janeiro, fevereiro e abril houve algum incêndio que começou em razão de causas naturais – como descargas elétricas. Com esses dados, é possível apontar a ação humana, principalmente em propriedades privadas, como a origem do fogo, a partir de maio deste ano.
Infelizmente, esta é uma prática muito comum e muitas vezes coordenada. O “Dia do Fogo”, como ficou conhecido o dia 10 de agosto de 2019, aconteceu com uma ação coordenada de produtores rurais do interior do Pará que, em grupo de WhatsApp, articularam queimadas em em áreas de Floresta Amazônica, principalmente a partir das margens da BR-163.
No portal O Globo, Míriam Leitão, traz um levantamento realizado pelo Greenpeace Brasil em 478 imóveis rurais envolvidos no crime que mostra que, cinco anos depois da ação criminosa, as queimadas continuam, a pecuária cresceu, as multas não foram pagas e parte das propriedades envolvidas na destruição da floresta ainda tiveram acesso ao crédito rural, subsidiado pelo governo.