Podem reparar:
O imbecil pega a arma e mata um monte de crianças numa escola. É o Mal, fazendo seu papel, agindo como sempre foi na história humana. Mas lá vai o Bem (meio esquecidinho, que de boas intenções o inferno está cheio) tentando entender, explicar e até desculpar o “coitado” que foi vítima de bullying na mesma escola.
O insano pega o carro e atropela ciclistas como bolas de boliche. É o Mal explícito, direto, arrogante. E o Bem (especialmente a imprensa) ouvindo psicólogos para saber suas motivações íntimas.
Torturam cavalos, bois e touros nas arenas do Brasil, Colômbia e Espanha todos os dias. É o Mal se divertindo e impune. E o Bem (antropólogos, historiadores e xeretas em geral) dissertando sobre as raízes culturais do country e das touradas.
Africanos e árabes (não todos, senão estaríamos perdidos) punindo mulheres, tirando-lhes o clitóris, adorando desmatar, acabar com os animais, chutando cachorrinhos como bolas no Afeganistão. É o Mal sabendo que vai ficar por isso mesmo. E o Bem quebrando a cabeça para decidir se deve condenar essas práticas ou “respeitar” tradições milenares.
Burocratas, políticos e governantes roubando, corrompendo e saindo da cadeia, quando pegos, agradecendo a Deus por corresponder à sua fé. É o Mal crente que “deus” é a senha para a impunidade. E o Bem reproduzindo suas palavras, em som e imagens, com o pretexto de “ouvir o outro lado”.
Adolescentes matando quando, onde e quantos quiserem. É o Mal atirando, como gosta, a torto e direito. E o Bem defendendo a necessidade de defender suas prerrogativas de terem uma nova chance.
Mulheres (muitas, já quase maioria) adorando ser apenas bundas ambulantes, putinhas midiáticas. É o Mal usando o sexo (que não tem nada de ruim) como jeito de chegar lá (leia-se: grana e fama). E o Bem (em especial as mulheres pensantes) conformando-se que o feminismo já era.
Animais (todos) sendo barbarizados em nome da ciência ou da perversidade pura e simples. É o Mal apoiado na superioridade do racional sobre irracionais. E o Bem agitando seus protestos de meia dúzia de gatos pingados.
Classe ‘mérdia’ comprando carros e mais carros, comendo carne e mais carne. É o Mal escudado na lei do aproveite antes que acabe. E o Bem elogiando a expansão da indústria automotiva e das plantações de soja e cana, do progresso, enfim.
Está mais que na hora de o Bem deixar de ser bobinho e chamar o Mal de mal. Como ele é, sem retoques.
O Mal que se explique por conta própria. Se for capaz.
Ulisses Tavares não é bonzinho com o mal que encontra em cada esquina da vida. Coisas de poeta.