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“Foi o maior caso de tráfico de animais do mundo em todos os tempos.”
A fala icônica da personagem Cecília, interpretada por Maeve Jinkings no remake da novela Vale Tudo, não é apenas um momento dramático de ficção, é uma denúncia direta e urgente sobre um dos crimes mais cruéis, impunes e devastadores do país: o tráfico de animais silvestres.
Cecília é uma ativista ambiental destemida. Investiga, denuncia, enfrenta interesses poderosos. Na cena, ela confronta o próprio irmão, Marco Aurélio, que, visivelmente apreensivo, tenta convencê-la a recuar. Ele sabe exatamente com quem ela está lidando. O grupo é próximo a ele, e o próprio Marco Aurélio foi alertado pelos envolvidos sobre os riscos que a irmã corre. Como tantos já fizeram na vida real, ele tenta protegê-la do sistema — um sistema que mata, silencia e corrompe.
Mas Cecília não se cala. Fala com firmeza, coragem e razão.
Sua fala faz referência direta ao escândalo ocorrido em 2021, quando dezoito girafas foram traficadas da África do Sul para um resort de luxo no Rio de Janeiro, sob o falso pretexto de um projeto de “conservação”. Três delas morreram pouco depois da chegada, uma quarta faleceu meses depois. As sobreviventes foram confinadas em um espaço minúsculo, insalubre, longe de qualquer dignidade. Apesar da comoção internacional, das denúncias fundamentadas, das provas documentadas e da repercussão na imprensa, o caso permanece impune até hoje.
Infelizmente, não é uma exceção: é regra. O tráfico de animais é o quarto maior crime do mundo, atrás apenas dos tráficos de drogas, armas e pessoas. No Brasil, estima-se que 38 milhões de animais silvestres sejam capturados todos os anos. Muitos morrem antes mesmo de chegar ao destino. Para cada animal que sobrevive ao transporte clandestino, outros nove morrem no caminho — vítimas de estresse, maus-tratos, sede, fome e asfixia.
A cena entre Cecília e Marco Aurélio já entrou para a história da dramaturgia brasileira porque retrata com fidelidade um caso real e o que acontece diariamente no país. Enquanto alguns enriquecem, ativistas são ameaçados, perseguidos, assassinados. Quem ousa dizer a verdade enfrenta o abandono institucional e a omissão das autoridades.
Cecília representa todos os defensores da vida que arriscam tudo para proteger os animais e o meio ambiente. Sua voz é o grito de alerta de uma geração que não aceita mais que a ganância humana se sobreponha à dignidade das outras espécies. Que não tolera mais que a natureza seja reduzida a cifras. Que exige justiça.
A dramaturgia, ao assumir esse papel, transforma a ficção em instrumento de consciência. A cena educa, emociona e, incomoda porque expõe o que muitos preferem esconder.
O tráfico de animais é uma indústria cruel, violenta e altamente organizada. Movimenta bilhões de dólares por ano, envolve redes internacionais e corrompe agentes públicos. Funciona com a mesma estrutura de qualquer outra máfia: aliciadores, transportadores, atravessadores, compradores finais. É alimentado por vaidades, colecionadores particulares, zoológicos privados e até mesmo supostos projetos de proteção de espécies.
E está acontecendo agora, neste exato momento, enquanto você lê estas linhas, animais estão sendo arrancados de seus habitats, embalados em caixas, dopados, escondidos em malas, vendidos como troféus, adornos ou objetos exóticos. Animais não humanos não são mercadorias. São indivíduos com consciência, sensações e histórias próprias. Eles têm direito à vida, à liberdade, à integridade física e emocional. Têm, como nós, o direito de viver sem sofrimento, o direito de ser felizes.
Em uma realidade onde a vida dos animais e da natureza ainda vale tão pouco diante da ambição e do lucro desmedido, cada voz como a de Cecília é um ato de resistência. E também de esperança. A cena de Vale Tudo é, também, uma homenagemao medo e não se calaram diante das ameaças. aos que se recusaram a ceder ao medo e não se calaram diante das ameaças.