Encontrados nas ruas de Palmas, três cães filhotes esperam adoção dentro de uma gaiola sem água no Centro de Controle de Zoonozes (CCZ) de Palmas, no Tocantins. Se não forem adotados, em menos de uma semana os filhotes serão encaminhados para a câmara de gás, onde serão sacrificados com outros cães errantes adultos. Na porta da câmara, um aviso: “eutanásia”, que, segundo definição do dicionário Aurélio, significa “morte serena sem sofrimento; prática, sem amparo legal, pela qual se busca abreviar sem dor ou sofrimento a vida de um doente reconhecidamente incurável”.
Esta reportagem foi ao CCZ verificar a denúncia de maus-tratos a animais feita ao O Girassol. O descaso do órgão não se restringe apenas ao mau uso da palavra eutanásia. Os cães apanhados nas ruas são vítimas de erros primários, como falta de água e limpeza dos canis. “Isso não é controle de doença, isso é matança. Os animais morrem de fome e de sede e sem contar que a maioria é sadia”, indigna-se a advogada Alessandra Assunção, da Associação Vida – Valorização e Integração dos Animais, que acompanhou a reportagem.
Cerca de 400 animais são mortos pelo CCZ todos os meses na Capital. Segundo o veterinário responsável pelos canis, Volney Aires, os animais errantes capturados pela carrocinha passam por uma triagem para a realização de exames que detectarão se o animal é portador de alguma doença. “Se eles forem soropositivos [no caso da leishmaniose] os animais são ‘eutanasiados’ no mesmo dia. Se não tiverem nenhum problema, ficam três dias esperando o tutor vir buscar e mais três dias esperando adoção, para então serem mortos”, detalhou Roney.
Para provar se o cachorro tem ou não leishmaniose (calazar), o CCZ realiza os exames de imunofluorescência e ELISA, que de acordo com o gerente de vigilância ambiental do órgão, Heguel Sousa, possui apenas 60% de confiabilidade. “Nenhum exame é 100% confiável”, diz Heguel.
Recolher animais para matá-los em câmaras de gás como forma de controlar as zoonoses e a população de animais é um método ineficaz, conforme aponta a Organização Mundial da Saúde (OMS) no 8º Informe Técnico apresentado em 1992. A capital mais nova do país segue as ultrapassadas recomendações da OMS datadas de 1973.
Hoje, está provado que o controle deve ser feito por esterilização e vacinação dos animais, além da educação da sociedade. No caso do calazar, já existe vacina que impede o desenvolvimento da doença e a forma mais eficaz no combate, assim como a dengue, seria a prevenção. “Muitos se esquecem de que o principal responsável é a população e o poder público que acumula lixo e permite a proliferação do mosquito. Quem deveria ser eliminado é o mosquito [vetor], não o cão [hospedeiro], tão vítima quanto o homem”, alerta Alessandra.
O Decreto Federal nº 24645 / 34, que declara que todos os animais existentes no País são tutelados do Estado, considera “maus-tratos não dar morte rápida, livre de sofrimentos prolongados, a todo animal cujo extermínio seja necessário para consumo ou não”. A mesma lei também diz serem maus-tratos “abandonar animal doente, ferido, extenuado ou mutilado, bem como deixar de ministrar-lhe tudo o que humanitariamente se lhe possa prover, inclusive assistência veterinária”, além de manter os animais em lugares anti-higiênicos.
Dessa forma, a prática de maus-tratos é considerada crime conforme a Lei Federal nº 9605, de 1998, que estabelece conduta delituosa “praticar atos de abuso, maus-tratos, ferir ou mutilar animais silvestres, domésticos ou domesticados, nativos ou exóticos”. O jornal O Girassol entrou em contato com o Ministério Público para repercutir o caso junto ao promotor responsável pelo Centro de Apoio Operacional de Apoio as Promotorias (CAOP) do Meio Ambiente, mas não obteveretorno.
A castração de animais é um método de prevenção que rende resultados positivos, porém, atualmente o CCZ não realiza as cirurgias. No ano passado, apenas 18 animais foram esterilizados. Segundo nota da Secretaria Municipal de Saúde (Semus), “as cirurgias foram interrompidas neste ano, em função do pedido de demissão do veterinário do setor. No entanto, uma nova contratação já foi solicitada e assim que for efetivada, as cirurgias de esterilização serão retomadas”.
CCZ
Segundo o gerente de vigilância ambiental, Heguel Sousa, os animais já chegam ao CCZ em “estado deplorável”. “Estamos tomando as devidas providências para acabar com o método da câmara de gás. Já adquirimos o equipamento necessário para fazer a eutanásia humanizada”, explica Heguel.
A Secretaria Municipal de Saúde (Semus) esclareceu através de nota, que o CCZ segue a resolução nº 714, do Conselho Federal de Medicina Veterinária, para realizar a eutanásia humanizada: “O método é a sedação do animal, seguido de exposição ao monóxido e dióxido de carbono, como consta no anexo I da referida resolução. No entanto, a Semus informa que esse método será adequado à eutanásia química injetável, nos próximos dois meses e será a primeira secretaria da região Norte do País a adotar o novo método”.
Sobre a higienização e manutenção do canil, a Semus informou que “o canil é higienizado todos os dias, às 8 horas da manhã, inclusive aos sábados domingos e feriados. Nas baias de adoção, alimentos são colocados diariamente, duas vezes ao dia e a água é reposta sempre que os reservatórios se esvaziam. Nas baias em que os animais sofrerão eutanásia, não são colocados alimentos ou água pois os animais precisam estar em jejum alimentar e hídrico”.
Associação Vida
Apesar da pouca idade, três anos, a Associação Vida – Valorização e Integração dos Animais, em Palmas, no TO, vem realizando ações que já salvou 236 animais (registrados) dos canis do CCZ. “Não temos sede e nem canil, nosso trabalho é ajudar os animais errantes a acharem um dono e dar qualidade de vida às esses seres”, explica o presidente da associação Allan Cheque.
Um dos objetivos da associação é desenvolver programas de educação sobre a posse de animais domésticos. “Não se pode querer um animal pensando que ele é um objeto. Quem adquire um cachorro ou um gato deve ser responsável por ele até a sua morte. Deve vacinar, castrar e dar boas condições de vida”, diz Allan, que completa: “se existem filhotes nas ruas, a culpa é do dono que não cuidou”.
Todos os animais registrados são vacinados e castrados para depois seguirem para adoção. Quem quiser se tornar um parceiro da associação, ajudando os animais de rua a acharem um dono, poderá entrar em contato com a associação, que divulgará o animal para adoção. Os interessados devem procurar nos telefones (63) 3213-1418 / 3217-2626 ou através do blog http://miaaudote.blogspot.com
Fonte: O Girassol