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Caxixé, Serelepe, Esquilo: uma espécie de muitos nomes e poucos estudos

7 de setembro de 2009
6 min. de leitura
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Não é à toa que as estripulias de Tico e Teco, a dupla de personagens de Walt Disney, são as primeiras imagens que vêm à cabeça, quando se ouve a palavra esquilo. Até a denominação mais comum desses roedores, no Brasil, remete à sua principal característica: nosso serelepe é um mamífero pequeno, esguio e muito, muito ágil. Ao contrário de seus parentes norte-americanos e europeus, porém, os esquilos tropicais são ‘tímidos’ diante do homem e raramente passeiam em áreas tão movimentadas como o Central Park de Nova York, o Museum Mall de Washington ou o quintal das casas.

No Brasil, eles vivem em áreas de floresta da Amazônia e remanescentes da Mata Atlântica e, felizmente, não estão ameaçados de extinção. As diversas espécies de esquilos das nossas florestas têm grandes olhos e orelhas pequenas, com pelagem macia e cauda peluda e longa.

Roedores, potentes e incansáveis, necessitam gastar os dentes, de crescimento contínuo. Os incisivos são fortes, assim como os músculos das mandíbulas, o que lhes permite abrir sementes muito duras. Os indivíduos mais hábeis logo descobrem que a maneira mais eficiente de retirar a polpa de coquinhos, por exemplo, é fazendo um corte em triângulo, conforme conta o zoólogo Ivan Sazima, da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp): “Entre as cascas de coquinhos jerivá (Syagrus romanzoffiana) é comum verificarmos tanto cortes perfeitos, feitos pelos serelepes mais experientes, como as tentativas desajeitadas dos inexperientes”.

Foto: EPTV
Foto: EPTV

Os frutos predados são facilmente encontrados no pé das palmeiras, que os esquilos escalam com grande facilidade. Essencialmente arborícolas, eles vivem nas copas das árvores, onde há vegetação de porte elevado e abundância de palmeiras, castanheiras ou, no sul do Brasil, araucárias. Têm grande facilidade para se movimentar pelos troncos e estão entre os raros animais capazes de descer de frente, na vertical, desafiando a gravidade com uma habilidade ímpar.

A mata não precisa ser nativa. Eles suportam certa proximidade do homem e vivem em áreas de vegetação alterada, desde que sejam mais ou menos densas, como em áreas plantadas com árvores de corte, de exploração de resina ou agroflorestas. Das cerca de 20 espécies de esquilos que existem no Brasil, a maior parte vive na Amazônia, em regiões como as dos rios Negro, Juruá e Tapajós, onde são também chamados de quatipurus ou acutipurus, palavras indígenas que querem dizer quati enfeitado e cutia enfeitada, respectivamente, numa alusão à cauda que os diferencia desses dois animais.

A espécie mais comum ou, ao menos, a mais conhecida, é o Sciurus aestuans, encontrada desde o norte da Amazônia até a costa brasileira. É o único esquilo da Mata Atlântica, mas algumas subespécies (ou raças) são reconhecidas como espécies separadas, caso do Sciurus ingrami, que vive do sul da Bahia ao Rio Grande do Sul. Além de serelepe, esta espécie é conhecida ainda como caxixé e caxinguelê, nomes de origem africana, que querem dizer ‘rato de palmeiras’.
Enquanto boa parte das espécies amazônicas tem cerca de 15 cm, sem contar a cauda, o S. ingrami chega até 25 cm e sua cauda pode atingir o mesmo tamanho do restante do corpo. Sua pelagem é uniforme, em tons que vão do marrom ao acinzentado, as orelhas são levemente peludas e os olhos amarelados. A cauda possui tons brancos, amarelos, vermelhos e pretos, o peito pode ser alaranjado e a região da garganta é cinza pálida ou branca.

De hábitos diurnos e muito ativos, os serelepes passam seu tempo nos troncos e galhos de árvores, de onde descem apenas para procurar alimentos, já que seus predadores podem estar à espreita. Felinos, pequenos carnívoros, aves de rapina e macacos estão entre esses predadores.

Foto: EPTV
Foto: EPTV

Para escapar deles, é capaz de saltar até 5 metros de comprimento, sem temer a queda. Seus principais trunfos de defesa são a visão e a audição apuradas, além da agilidade, na qual a grande cauda tem um importante papel. “Sem ela, eles teriam dificuldade de se equilibrar e pular de um galho para outro”, diz o biólogo José Roberto Miranda, pesquisador da Embrapa Monitoramento por Satélite.
Esses pequenos animais vivem sózinhos ou aos pares e podem chegar aos 15 anos, atingindo a maturidade sexual ao completar o primeiro ano de vida. A fêmea fica prenha uma vez por ano e tem de um a dois filhotes. Além das copas altas, o caxinguelê escolhe locais onde exista vegetação de idade avançada, para que haja ocos nas árvores, onde habitam, se reproduzem, guardam os filhotes e estocam comida.

A base de sua alimentação é composta de frutos secos, bastante energéticos, como sementes de palmeiras e sapucaias. Na região Sul, seu alimento preferido são os pinhões de araucária. Eventualmente, pode comer também larvas de insetos e brotos de árvores. Justamente por estocarem comida, os serelepes são considerados dispersores de sementes – animais que ao se alimentarem ajudam a espalhar as sementes na mata. Ao carregar as sementes para a sua toca, entre os galhos de árvores, às vezes elas caem e nem sempre ele está disposto ou pode voltar para procurá-las. Outras vezes, enterra as sementes, mas muda de território ou esquece onde as deixou. E pode ainda morrer, predado por um gavião, por exemplo, dando chance à semente de germinar.

Segundo Miranda, no entanto, os esquilos são mais conhecidos como predadores do que como dispersores de sementes. “Os serelepes comem o embrião da planta, como o coquinho das palmeiras e o pinhão da araucária. A anta, por exemplo, só digere a parte externa do fruto e expele o coco através das fezes, deixando a parte interna intacta para poder germinar. O esquilo também come a parte externa, mas fura o coco para comer a parte branca”, explica.

Além disso, segundo Mauro Galetti, professor do Departamento de Ecologia da Universidade Estadual de São Paulo (Unesp/Rio Claro), os esquilos comem araucárias e algumas palmeiras, mas não há nenhuma planta que só eles estoquem. “Entre os animais que guardam alimentos, a cotia é a principal dispersora, pois come mais de 100 espécies, só da Mata Atlântica, e enterra frutos que outros animais não conseguiriam, como a castanha-do-Pará, da qual apenas ela consegue abrir o ouriço para pegar a semente.”

A presença do caxinguelê pode também ser um indicador do estado da mata. Quanto uma floresta está bem preservada, sua população costuma ser pequena. “Mata com muito esquilo indica que estão faltando predadores do topo da cadeia alimentar, como jaguatirica, onça-pintada, gato-do-mato. Por isso, em fragmentos florestais pequenos, sua densidade aumenta muito”, diz Galetti, que é também diretor científico da ONG Instituto de Biologia da Conservação.

Seja como for, a falta de pesquisas sobre sua Ecologia e evolução em áreas de matas fragmentadas certamente limita a possibilidade de ações em favor de sua conservação.

Fonte: EPTV.com

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