Um casal de amigos de Dennis Cosmo Marin, de 37 anos, que morreu após ser atingido por um bloco de gelo em Ushuaia, Argentina, na quarta-feira (2), vai ficar com a gata dele, Lince, até ela ser levada para a família em São Paulo. Dennis viajava desde 2018 de Kombi com sua gatinha.
Adriana Fagundes e o marido Rafael estão acampados no mesmo camping que Dennis estava com sua Kombi, na Argentina.
No vídeo publicado no canal deles, usado para compartilhar viagens feitas ao redor do mundo com motorhome, foram colocadas imagens desde o primeiro encontro com o paulistano, no Chile, e até os últimos momentos dele em Ushuaia.
“Essa é a nossa homenagem que a gente tem. São momentos bons juntos. Tivemos muito momentos bons, não só quando a gente estava gravando. A Lince já ficou muitas vezes no nosso carro. Uma amizade muito boa que a gente criou”.
“Parecia que éramos amigos de infância. Uma pessoa muito boa, amigável. Estava sempre pronto para ajudar. Tivemos momentos muito felizes e maravilhosos. Todos os momentos com o Dennis foram maravilhosos”, ressalta o casal.
O casal ainda relatou que após o susto com a notícia, comunicada por policiais, já pensaram na Lince, que estava dormindo dentro da Kombi.
“A gente sabia que ela estava ali dormindo, tranquila. Então, os policiais começaram a falar que iam levar ela para uma espécie de abrigo municipal. A gente não aceitou. Dissemos que íamos ficar com a gata”.
“Ai fui entender o procedimento deles. A Kombi, eles lacraram para fazer perícia. Com isso, eles começaram a falar que a gata ia para esse local e eu não deixei, sabe lá onde iam levar. Conversei com o policial e o policial entrou em contato com pessoas, falando que ia fazer um termo de responsabilidade, que assinei. Policiais permitiram que eu só tirasse a ração da Kombi. A caixa dela, roupas, casinha, não foi possível retirar”, ressaltou Rafael.
Rafael ainda usou o espaço do canal para relatar como ficou sabendo da morte de Dennis, que foi atingido pelo gelo em uma área de acesso proibido conhecida como “Cueva de Jimbo”, ou Caverna de Gelo, dentro do Parque Nacional da Tierra del Fuego.
“Ontem a gente passou o dia no camping sozinhos e o Dennis já havia comentado que queria fazer essa trilha. Nem sabíamos que trilha era, nem fazia ideia. A gente só ficou sabendo quando os policiais vieram com a chave da Kombi dele. Eu vi que os policiais apertavam a chave e vi que a luz piscou. Aí pensei ‘como eles tinham a chave?’. Fui tentar saber, e o policial apontou a mão para o carro e fez assim [mão apontado para o céu]. Foi um impacto muito grande. A Adri estava no vidro bem quando ele apontou para o céu. Ela despencou, ficou sem chão. Eu também. A gente estava sozinho”, contou.
Desde outubro de 2018, Dennis e a gata Lince estavam viajando de Kombi pela América do Sul, o que chamava atenção dos internautas pelo animal ter “espírito aventureiro” e se adaptar facilmente nos novos lugares.
O brasileiro tinha um perfil no Instagram chamado ‘Ô de Kombi’, onde se apresentava como contador de “stories” e mensageiro “natural de coisas naturais”. Além disso, dizia que estava “em busca de autonomia”.
Ele relatava com frequência nas redes sociais como sua gata Lince, de 10 anos e nascida em Sorocaba, interior paulista, era uma “companheira única” de viagem e tinha a Kombi como sua casa.
Quatro meses após iniciar a jornada pelas estradas, Dennis compartilhou que a gata tinha a Kombi como casa muito antes dele de começarem a viajar. No relato, ele ainda revela que o portão da ‘casa’ passou a ser a porta traseira do veículo.
“Nascida em Sorocaba, aos 6 anos embarcou em uma grande aventura de kombi. Antes disso, o costume de Lince era dormir quase o dia todo, comer um montão, tomar um solzinho logo cedo e no meio da madrugada espiar o movimento da rua por debaixo do portão, sentindo os cheiros e atenta aos barulhos orquestrados por gatos, ratos e cães na madrugada. Desde o dia que estacionamos a kombi pela primeira vez, antes das reformas, a Lince já entrava nela e dormia em todos os cantos, além de subir no teto”, contou.
“Com 4 meses de estrada, seu portão passou a ser a porta traseira da kombi, que vira e mexe está aberta durante as noites. Dali ela observa o movimento noturno de diversos lugares por onde estamos passando. Entre galinhas, pintinhos, lagartos, gatos, cachorros, banhos de rio, essa gata só nos surpreende entre nossas chegadas e partidas. Na Kombi, assim que damos a partida para pegar a estrada, ela vem pulando e se acomoda na almofadinha que fica no banco da frente”.
Dennis também costumava compartilhar como fazia para que Lince se adaptasse nos novos lugares.
“Se chegamos de noite, só a soltamos no dia seguinte, para devagarinho ela ir se ambientando e sentirmos qual é o movimento por ali. Quando ela sai, uma das primeiras coisas que faz é rolar no chão. Achamos que é para camuflar o próprio cheiro. Sai sempre a procura de um piso gelado pra enredar aquela soneca. Gostamos de deixá-la solta, mas nem sempre rola, por conta de outros bichos”.
“Sempre que chegamos onde vamos ficar, ela percebe um pouco antes, já apoia suas patinhas no vidro da janela e coloca a cabeça para fora observando com ares de novidade e balançando o rabinho caramelo”.
Guadalupe Rausch Tomazzoli é terapeuta comportamental de gatos e conheceu Dennis e Lince no período que ficaram em São Francisco de Paula (RS). Ao g1, ela contou que chamava atenção a maneira como o paulistano adaptou Lince para o novo estilo de vida.
“Eles moravam em apartamento, e para o processo de adaptação, primeiro adaptou ela para a Kombi. Deixava a Kombi aberta para ela entrar e se acostumar. No início foi mais difícil, até entender as necessidades mais específicas da Lince e adaptar a Kombi e a viagem ao ritmo dela. Logo, a Kombi é a referência de casa que a Lince tem, com o cheiro dela”.
Dennis passou por cidades do estado do Rio de Janeiro, da região sul do Brasil, Guiana Francesa, Suriname e Uruguai. Na última semana, ele chegou a compartilhar vídeos e fotos do Ushuaia, inclusive de caminhadas feitas já na Tierra del Fuego.
Em nota, o Itamaraty afirmou que o Ministério das Relações Exteriores, por meio “do Consulado-Geral do Brasil em Buenos Aires, vem prestando a assistência cabível à família da vítima, em coordenação com as autoridades locais e em conformidade com os tratados internacionais vigentes e com a legislação local.”
A Comissão de Auxílio do Ushuaia, um grupo civil dedicado a resgates na região, publicou um comunicado nas redes sociais alertando que “o acesso a esta caverna é proibido devido ao perigo representado pela possível queda de gelo ou pelo colapso da caverna, situação que está indicada no outdoor perto da caverna.”
Segundo relato postado no Instagram, o grupo civil disse que recebeu o pedido de resgate por volta das 16h de um turista que sofreu um traumatismo grave na cabeça.
A brigada foi acionada, mas quando chegou ao local a vítima já foi encontrada sem vida. Após uma operação de mais de 6 horas, os socorristas desceram o corpo e os outros turistas até uma base de operações.
Responsáveis pelo resgate conversaram com o g1 e disseram que a Justiça da Argentina está conduzindo uma investigação sobre o acidente.
A guarda nacional da Argentina informou que o turista viajava sozinho pelo país e que morava em uma kombi em um acampamento municipal.
O Ministério das Relações Exteriores disse, por meio de nota, que o Consulado-Geral do Brasil em Buenos Aires “vem prestando a assistência cabível à família da vítima, em coordenação com as autoridades locais e em conformidade com os tratados internacionais vigentes e com a legislação local”.
Fonte: G1