Por Patricia Tai (da Redação)
Na seqüência da série “Carne de cavalo”, nesta semana, a rede varejista sueca Ikea anunciou que estava retirando almôndegas de comercialização na Tailândia, em Hong Kong e na República Dominicana depois de carne de cavalo ter sido encontrada nestes produtos. De acordo com reportagem da Care2, a Ikea também informou que irá parar de vender salsichas no Reino Unido, França, Irlanda, Portugal e Espanha, pois também foi identificada a presença de carne de cavalo (atribuída ao fornecedor sueco Familjen Dafgard). Além disso, a Rússia encontrou carne de cavalo em salsichas importadas da Áustria.
Agora, na África do Sul, outros tipos de carne, incluindo de burro, estão sendo encontradas em produtos cujas etiquetas informam conter carne bovina.
Cientistas da Universidade de Stellenbosch, da África do Sul, realizaram testes que identificaram “espécies não declaradas nos rótulos” em 68% dos produtos que incluíam hamburgueres, salsichas, e outros produtos à base de carnes. Especificamente, os cientistas encontraram soja, gluten, aves e porcos em produtos que informavam ter carne, bem como “espécies não convencionais” que incluíam burros, cabras e búfalos.
“Nossas descobertas levantam preocupação significativa sobre o funcionamento da cadeia de abastecimento de carne na África do Sul”, diz o professor Louw Hoffman, da Universidade de Stellenbosch. Segundo ele, enquanto não há “regulamentos locais” para proteger os consumidores, as regras não estão sendo claramente observadas ou aplicadas.
A Shoprite Holdings, maior cadeia de supermercados da África, declara que realiza rotineiramente testes de DNA em produtos de seu departamento de carnes. A porta-voz do departamento de saúde pública da África do Sul, Maja Popo, disse à Bloomberg que a investigação “deve focar menos as redes de lojas, e mais os matadouros e frigoríficos”.
Enquanto isso, o escândalo continua na Europa e em todo o mundo. A reportagem da Care2 informa que os açougueiros locais tiveram aumentos nas vendas, enquanto os fazendeiros estão preocupados com o iminente aumento na burocracia que prováveis novas regulamentações irão trazer.
Ainda de acordo com a reportagem, é dito que, no que diz respeito ao lado ético da questão, algumas pessoas já estão questionando o que há de errado em se consumir carne de cavalo.
Prova disso é que, em recente edição do programa Fantástico, da rede Globo de Televisão, os apresentadores levaram ao ar uma matéria na qual colocavam pessoas para provar pratos feitos com carne de cavalo.
“Eu não como carne e o escândalo da carne de cavalo (e agora de burro, cabra, búfalo, etc) me trouxe outra razão para ter orgulho em ser vegetariana”, anuncia Kristina Chew, da Care2. Ela lembra que as descobertas de carne “errada” em embalagens “erradas” relembra o romance “The Jungle”, de Upton Sinclair, e recomenda a releitura. No capitulo 14, Sinclair inclui o relato de um personagem que trabalha em uma fábrica de salsichas, que dizia que tudo o que era descartado dos animais e que não poderia ser usado para nada mais, era aproveitado para a fabricação de salsichas. Um século depois, comenta Kristina, a vida imita a ficção.
Do consumo de carne de bois, vacas, aves e peixes pelos humanos, pode-se dizer que dois caminhos podem ser tomados: o da abolição do consumo dessas carnes, ou a insensibilização tamanha, perpetuada pela continuidade do consumo dessas carnes, que pode levar à aceitação de se consumir a carne de outros animais – leia-se, de quaisquer outros animais. As recentes notícias parecem deixar dúvidas com relação a essa bifurcação da mudança de atitudes.
Do lado dos animais, nada muda. A exploração cruel e desumana continua, independente da espécie – e agora, pelo que parece, indo além das espécies que eram tradicionalmente criadas para consumo humano.
“Se antes bovinos, suínos e aves eram servidos como alimento, por que tanto assombro em se consumir cavalo?” – é a pergunta da vez. A grande questão é que, com o tempo, ao invés das sociedades se voltarem contra a criação daquelas espécies para consumo humano, ocorreu a banalização e a aceitação deste hábito secular, e a falta de sensibilidade diante deste hábito está fazendo com que, se algo não mudar, outras espécies comecem a integrar o cardápio cultural de uma grande parcela da humanidade que ainda se alimenta da carne de outros seres.