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EGOÍSMO HUMANO

Cãezinhos vivem em condições degradantes em "fábricas de filhotes"

Cães podem chegar doentes até a mão dos compradores

7 de outubro de 2021
Beatriz Silva | Redação ANDA
6 min. de leitura
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Foto: Reprodução | Daily Mail

Na Irlanda, contrabandistas estão lucrando com a crueldade animal. Filhotes estão sendo criados em condições insalubres e sendo vendidos para famílias na Grã Bretanha através da internet e de criações de família que parecem ser legítimas. O problema se acentuou com a pandemia devido à procura das pessoas por animais domésticas no período em que estiveram em casa. Segundo dados liberados pelo governo na última semana, a importação legal de cachorros da Europa, incluindo a Irlanda, aumentou cerca de 75% por cento desde janeiro deste ano, mas especialistas acreditam que isso seja apenas uma pequena parte, comparada ao tráfico.

O chefe executivo da RSPCA, uma associação que atua na Inglaterra e em Gales em defesa dos direitos animais, diz que há a probabilidade de milhares de cachorros estarem sendo contrabandeados para o Reino Unido e sendo vendidos no mercado ilegal, a maior parte vinda da Irlanda.

De acordo com a DSPCA, associação de Dublin, na Irlanda, que realiza resgate e reabilitação de animais, cerca de 30.000 cachorros vindos de fazendas legais e ilegais de criação de cachorros irão chegar ao Reino Unido ainda este ano. Ainda assim, mesmo as fazendas legalizadas podem oferecer condições ruins para os filhotes.

Os animais ficam amontoados em jaulas em meio a sujeira. | Foto: DailyMail

Muitos filhotes são aprisionados em galpões sem janelas e com sistema de segurança. Devido a superlotação, os animais acabam adquirindo doenças, como parvovírus, que ataca o intestino e que pode levar até a morte. Além disso, alguns filhotes desenvolvem problemas psicológicos como o comportamento destrutivo, devido ao tempo em que ficaram presos. O caso é ainda pior para as fêmeas que passam o tempo todo presas e são utilizadas como uma máquina, dando à luz filhotes que são retirados delas muito cedo. Muitas não chegam a ver a luz natural.

A importação de cachorros para revenda na Grã-Bretanha é regulamentada, mas muitos criadores alegam que os animais são domésticos e da família. Esse comércio cruel também é conhecido por utilizar gangues criminosas no contrabando dos filhotes, colocando os pequenos e inocentes animais em situações inadequadas, sem comida, água, o que leva a morte de alguns deles no meio do caminho ou ao chegarem em suas novas casas.

O crime organizado torna difícil de saber quais são essas fazendas, mas considerando a quantidade enorme de cães levados do mar da Irlanda para a Grã-Bretanha, é fácil dizer que há um número grande de fazendas participando dessa criação.

O portal Daily Mail tentou visitar algumas fazendas de filhotes e fez algumas perguntas. Logo na primeira abordagem, ao sul de Dublin, foi possível ver o tipo de situação que eles enfrentariam.

Filhotes vivem em situações que colocam sua saúde em risco. | Foto: DailyMail

Em uma fazenda, foi possível ver cães adultos e filhotes misturados e amontoados em gaiolas pequenas e sujas. E os animais possuíam um olhar desamparado. O fotógrafo do portal tirou algumas fotos, e um homem aparece os confrontando, gritando, e ordenando que saíssem de lá. Ao ser perguntado sobre seu nome e sobre as condições encontradas na fazenda, o homem recusou-se a falar e anotou a placa do carro da equipe.

De acordo com um porta-voz do conselho, que recebeu as fotos retiradas pelo jornal, a fazenda foi inspecionada em agosto e que as instalações estão em conformidade com a lei, segundo o conselho.

Tim Kirby, um importante veterinário Irlandês, analisou as imagens tiradas pelo Mail, e disse que infelizmente a situação é típica dessas criações em grande escala, já que o criador tenta aumentar o número de cães privando os animais de bem-estar e saúde. O veterinário acrescenta que a expressão de medo que é possível ver nos animais indica a não socialização dos mesmos, aumentando as chances deles virem a ser medrosos ou agressivos.

A situação pode ser ainda pior. A criação industrial de filhotes em números de grande escala é licenciada em algumas fazendas que podem ter centenas de fêmeas reprodutoras. Por ano, podem ser gerados milhões em receita.

Outra fazenda visitada pelo portal Daily Mail, e que possui licença industrial para esse tipo de reprodução, anunciou no ano passado centenas de filhotes, mas que listados representavam um número bem menor do que a licença permite, ou seja, o restante dos animais pode estar indo para outro lugar.

A matriarca da família responsável pelo local, recusou-se a falar com a equipe do jornal. Logo depois, outros dois homens apareceram querendo expulsá-los até que uma mulher apareceu e após ordenar que não tirassem fotos do local, conversou com a equipe. Segundo ela, a família não exporta cachorros para o Reino Unido, sendo todos os filhotes vendidos na Irlanda. Mesmo negando tudo, ela não permitiu que a equipe visse os cães da fazenda.

Essa foi apenas uma amostra da crueldade deste tipo de negócio. Em entrevista ao Mail, o CEO da DSPCA, Brian Gillen, relatou que sabe-se que os contrabandistas estão pela parte rural da Irlanda, e que essas fazendas ilegais são “invisíveis”, muitas com ligações a gangues criminosas. A possibilidade de dobrar o preço na venda desses cachorros no Reino Unido, é o que torna o negócio atrativo para eles. Ainda de acordo com Gillen, sua organização já cumpriu vários mandados contra esses contrabandistas, mas ainda é difícil controlar a situação. Os travellers, alguns nômades que acabam ajudando esses contrabandistas, conseguem se esconder com facilidade, sem deixar pegadas.

A venda desses animais por preços altos é o grande atrativo para criadores e contrabandistas. | Foto: Ilustração/Pixabay

Devido ao aumento do preço dos cachorros, as recompensas dos contrabandistas também subiram. O preço de dez buldogues franceses, por exemplo, pode chegar até 40.000 euros na Grã-Bretanha, quase o mesmo preço de um quilo de cocaína. Apesar dessa semelhança, somente o tráfico internacional de drogas tem penas rígidas, podendo levar à prisão perpétua.

Em Londres, no mês de fevereiro um contrabandista de cachorros foi condenado a apenas uma pequena multa e uma ordem de serviço comunitário. Outro caso, também em Londres, levou a gangue de contrabandistas para a prisão, e a carga importada por eles estava avaliada em 2,5 milhões de euros. A RSPCA precisou sacrificar muitos dos cães, enquanto outros já estavam praticamente morrendo.

As autoridades Irlandesas parecem relutantes em assumir controle dessa situação. Na Grã-Bretanha, a Lei de Lucy tornou ilegal a venda a terceiros, ou seja, as fazendas britânicas de filhotes não podem mais vender os animais através de revendedores e pet shops sem enfrentar algum tipo de processo. O governo britânico também planeja proibir a importação de cachorros com menos de seis meses de vida, mas ainda pode levar um tempo até que a lei saia do papel.

Na Irlanda, somente uma mudança e ação radical das autoridades é que pode ajudar e salvar os cães da situação cruel em que são colocados. Esses animais merecem um mundo muito melhor que esse.

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