Se você tutela um cachorro de raça, na Morada do Vale I, em Gravataí, abra o olho. Eles viraram alvo de criminosos na cidade. E o boato que corre na vizinhança é de que eles estão virando moeda de troca nas bocas de fumo da região. A situação piorou nos últimos três meses, quando são sequestrados – ou desaparecem dos pátios – pelo menos três cachorros por semana.
Ninguém ousou buscar seu cão com os traficantes até agora, mas alguns arriscam até uma tabela de preços. Seriam vendidos por R$ 20 nas bocas. Valor pago aos sequestradores em pedras de crack.
Há uma semana, o Doki – um yorkshire, amarelo -, foi levado do pátio da casa de Cleusa Deiques, 58 anos, na Rua Alfeu Leti. No sábado, outro cão da mesma raça teria sido sequestrado de uma casa a menos de uma quadra de distância. E na terça, na mesma quadra, um terceiro cachorro sumiu.
Vítimas não registram casos
“Dizem que um casal passou caminhando por aqui e pegou o Doki. A gente escuta essas histórias, mas tenho medo de ir atrás. O problema é que ele está doente”, lamenta Cleusa.
Ela espalhou cartazes pelo bairro com uma foto e as características do cachorro de quatro anos.
“Até recompensa eu já pensei em oferecer para ter o meu cachorrinho de volta”, diz.
Há cerca de um mês, no mesmo bairro, o cão da raça shiatsu, do filho da dona Cleusa, também foi sequestrado. Eles não registraram ocorrência, assim como nenhum dos vizinhos.
Três sumiços por semana
O primeiro lugar procurado por quem perde seu mascote é a pecuária de Áureo Tedesco, uma espécie de ponto de encontro para quem tutela animais na Morada do Vale I.
Lá, as paredes viraram mural para anúncio de cães desaparecidos.
“Chegamos a ter informação de até três cachorrinhos levados por semana. Sempre os de raça”, comenta Áureo.
Uma das vítimas foi o cunhado dele, na Rua Araújo Vianna. Há três meses levaram o seu yorkshire. Até hoje, ele não teve notícias do animal.
Sem denúncias, casos não são investigados
Uma das suspeitas dos moradores da Morada do Vale I é de que, levados para as bocas de fumo em troca de crack, os cachorros voltem ao mercado de cães de raça, provavelmente repassados em outros bairros. Mas nada é confirmado. Como os casos, geralmente, não são comunicados à polícia, não há investigação.
Nenhuma ocorrência foi feita na 2ª DP de Gravataí. Nos últimos meses, pelo menos duas ações foram feitas pela delegacia em pontos de tráfico da Morada do Vale I. Em nenhuma delas foram encontrados cachorros de raça.
A orientação da polícia é para que as pessoas registrem os sequestros.
Tutora buscou poodle em boca de fumo
A desconfiança dos moradores de Gravataí faz sentido para uma aposentada de 57 anos, de Guaíba. Em outubro, um mês depois de sequestrarem a Priscila, sua poodle de cinco anos, ela a resgatou na casa de um traficante na periferia da cidade. Pagou R$ 500.
“Eu sei que foi arriscado. Fui desaconselhada, mas as pessoas não imaginam o quanto isso causa de dor nas famílias”, desabafa.
A suspeita é de que um usuário de crack tenha levado o cachorro e pelo menos outros dois na mesma região.
Mulher se arriscou
O resgate de Priscila começou quando o suspeito de ter recebido o cachorro viu, em uma loja, um cartaz feito pela aposentada. Ele disse à lojista que estava com o cão e mandou a tutora dele procurá-lo.
” Quando disse ao taxista aonde iria, ele se apavorou. Eu não tinha ideia de com quem estaria lidando”, conta a mulher.
O homem alegou que os R$ 500 bancariam o que ele teria gasto com pet shop e medicação da cachorrinha, que estava doente. A aposentada não crê:
“Antes, sequestravam os cachorros porque achavam bonitinhos. Agora, viraram moeda de troca”.
Fonte: Diário Gaúcho