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Cães e gatos rejeitados e doentes são acolhidos por abrigo de Brasília

30 de junho de 2010
7 min. de leitura
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(Foto: Reprodução/Correio Braziliense)

A recepção é calorosa para quem chega à casa da taxidermista Eliane Zanetti, 47 anos, e do escultor Rafael Estevão de Oliveira, 32 anos, no Jardim Ingá, em Luziânia. Quando o visitante se aproxima do portão logo vê os 235 cachorros que vivem ali em liberdade. Os cães — a maioria é vira-lata — saem correndo ao menor sinal da presença humana e se aproximam do portão verde que os separa da rua. Eles vêm todos de uma vez e entoam um coro de latidos poderoso. Segundos depois, em meio aos caninos, surge a tutora de todos os animais, Eliane. Sem medo, ela caminha entre os bichos agitados para abrir a porta. Conhece cada um pelo nome e cria ainda 67 gatos, em um ambiente separado, é claro.

Eliane e o marido, Rafael, transformaram a própria casa em um abrigo para animais em situação de risco, o Augusto Abrigo. O local respeita um padrão e não recolhe qualquer bicho abandonado. Ali, as cadelas grávidas, cachorros atropelados ou que sofreram tortura, por exemplo, têm preferência. O local conta com ambulatório, dormitórios, berçário e, em breve, terá uma maternidade. Quando recebem uma denúncia de abandono, eles recolhem as vítimas das ruas.

Doações ajudam a sustentar o projeto. Porém, o custo de reabilitar bichos com saúde tão debilitada é alto. Todo domingo, os donos do local organizam um bazar. Mas a maior parte dos 12 mil investidos a cada mês em ração, remédios e outras dezenas de cuidados vem do bolso do casal. Eles mantêm ainda uma parceria com uma clínica veterinária da Asa Sul, a Pet Health, que atende os animais do Augusto Abrigo a preço de custo. Uma cirugia de grande porte pode custar até R$ 1,8 mil.

A paixão pelos animais começou quando Eliane ainda era criança, em Votorantim (SP). O pai dela, Augusto Zanetti, era mecânico de profissão, mas veterinário de coração. Havia cursado até a 4ª série primária, mas era capaz de socorrer qualquer animal com seus remédios feitos de ervas, benzeção e muito carinho. “Nunca vou me esquecer de quando vi meu pai costurando o pescoço de uma galinha. Ficou perfeito e depois a galinha andava atrás dele o tempo todo, como se fosse um cachorro. Ele amava os animais e tinha um dom. Eu aprendi isso com ele”, explicou Eliane. “Eu trabalhava em um zoológico em São Paulo e quando o veterinário dizia que ia sacrificar um bicho eu levava o doente para o meu pai e o animal saía de lá curado.”

Em 2004, Eliane se mudou para Brasília, para trabalhar no zoológico. Aqui conheceu o marido. Ela era professora, Rafael o aluno. No começo, era só o casal sem nenhum cachorro ou gato por perto. Mas Eliane começou a recolher cachorros de outras instituições protetoras dos animais. Seria temporário, garantiu ela ao marido. Mas pouco depois o vasto quintal da chácara estava cheio de cachorros e gatos. Nessa época, Eliane recebeu uma proposta de trabalho em São Paulo. Teria de devolver os animais para outra instituição. Mas ninguém apareceu para buscá-los. Eram menos de 10. Mesmo assim, ela jamais poderia abandoná-los. “Recusei a oferta de emprego por conta deles e fiquei aqui”, lembrou. Depois disso, os bichos não pararam de chegar.

Casamento ameaçado

Não demorou muito e a família estava completa: 235 cães, 67 gatos e duas pessoas. Rafael, que até então estudava para ser mecânico de aviões, não estava tão satisfeito. “Eu sempre gostei de cachorro. Mas não desse tanto, é uma quantidade absurda. Era muito difícil no começo. Mas a gente acaba se envolvendo”, relatou Rafael. Eliane quase perdeu o marido por conta desse amor animal. “Ele chegou a sair de casa, mas depois voltou. Se conformou que não tem como.” Hoje, Rafael estuda veterinária e é o principal incentivador do projeto da mulher. “Quando eu conheci minha mulher, ela usava salto alto e roupas de marca. Abrimos mão de todos os luxos para cuidar deles”, contou Rafael.

A rotina não é fácil. É preciso alimentar os bichos, dar banho, remédio e muito amor àqueles que entram pela porta do abrigo com comportamento arredio por terem sido torturados. Dias depois de ganhar um lar caloroso e comida da melhor qualidade, todos estão mais calmos. Os latidos não incomodam o tempo todo. “Eles só fazem muito barulho 6h, quando o sol fica mais forte, e 18h, que começa a escurecer”, garante Eliane. Às vezes, porém, ela precisa acordar várias vezes no meio da noite para dar mamadeira aos filhotes órfãos. São 18 pequenos sem pais, atualmente.

Sob terapia do carinho

Foto: S/C

Sabugo
Basset hound
Idade: Pela dentição, aparenta ter 16 anos.

Dócil e de patas curtas, é um dos mais velhos do abrigo. Foi abandonado na porta de um clube no Lago Sul, com uma placa pendurada ao pescoço, na qual estava escrito: “Adote-me”. Ele tem um tumor testicular e precisa de cirurgia. mil.

(Foto: S/C)

Antonela
Vira-lata.
Idade: Faz 1 ano em setembro.

Ficou vários dias dentro de uma lata de lixo, recém-nascida, na Asa Norte. Quando foi encontrada e levada para o abrigo, estava quase morta. Recebeu Pet milk, um leite especial que custa R$ 36 a lata. Ela estava acompanhada de mais dois irmãos, que não resistiram.

(Foto: S/C)

Apolo
Fila brasileiro.
Idade: 5 anos.

Foi encontrado no Recanto das Emas com duas patas quebradas. Passou meses com pinos nos membros inferiores para conseguir voltar a andar. Provavelmente foi atropelado depois de ser abandonado pelo dono. É aparentemente um cão reprodutor que envelheceu, perdeu a serventia e foi descartado.

Adoção com responsabilidade

Todos os animais do Augusto Abrigo podem ser adotados. O candidato a “pai ou mãe” deve preencher um cadastro completo e apresentar vários documentos. No contrato de adoção, o novo tutor se responsabiliza, inclusive judicialmente, a responder por possíveis maus-tratos e abandono. O problema é a matemática da entrada e saída dos animais do abrigo. Por volta de 15 ganham um novo lar todo mês, mas outros 30 chegam. “As pessoas querem filhotes saudáveis. Temos 18 cães cegos que talvez nunca sairão daqui. Sabemos que não vamos resolver o problema dos animais abandonados. Só no DF são mais de 40 mil. Mas vamos salvar algumas vidas”, afirmou Eliane.

Entrar no abrigo significa ter uma vida nova. As histórias de maus-tratos são assustadoras. Alguns cachorros sofreram até mesmo abusos sexuais. Há os que têm os olhos queimados por cigarro e outros a pele ferida com água quente. Um dos cachorros teve a metade da cabeça esmagada por espancamento, mas sobreviveu graças aos cuidados de Eliane.

O basset Sabugo foi largado na rua por ter um tumor no testículo. “Ele estava com uma placa no pescoço escrito: adote-me. Um outro, o Barão, da raça bernese, foi jogado na rua pelos filhos do tutor dele, depois que o tutor morreu.”

Os bichos sentem ciúmes de Eliane e Rafael. Os dois conversam com os animais como se eles fossem seus filhos pequenos. O mais incrível: eles parecem entender e obedecem a cada ordem. Eliane tem lúpus, doença na qual o sistema imunológico se volta contra o próprio organismo e pode afetar qualquer parte ou órgão do corpo. Antes de criar o abrigo, ela tinha crises, com dores fortes e períodos em que ficava acamada. “Me vejo obrigada a levantar todos os dias para cuidar de cada um dos animais. Eles salvaram a minha vida, são os melhores médicos do mundo”, disse.

Augusto Abrigo
Local: Jardim Ingá, Rua Mato Grosso, Quadra 5, Lote 18, Chácara Vera Cruz, Setor Industrial, Distrito Federal.
Dias para adoção: segunda-feira a sábado, das 14h às 17h.
Informações: (61) 3603-1774 e (61) 9156-4441.

Fonte: Correio Braziliense

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