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ESPERANÇA

Cada vez mais agricultores estão abandonando a criação de animais para focar no cultivo de vegetais e cogumelos

Por diversos motivos como desonestidade das empresas de produção de carne, preocupação com os animais e sustentabilidade, e péssima qualidade de vida, famílias de agricultores estão optando por mudar de ramo

4 de março de 2024
Júlia Zanluchi
5 min. de leitura
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Foto: Ilustração | Freepik

Alguns agricultores têm parado de criar animais para a indústria da carne e migrado para o cultivo de plantas, com o intuito evitar as armadilhas financeiras da agricultura industrial e o sofrimento dos animais. O agricultor Tom Lim criou galinhas por 20 anos quando a empresa para a qual trabalhava como contratado o demitiu sem aviso prévio, deixando-o endividado e sem saber o que fazer. “Meu coração simplesmente afundou”, disse ele. “Eu não sabia onde conseguir dinheiro para pagar nossos empréstimos.”

Lim, nasceu em uma área rural do Camboja, onde seus pais cuidavam de campos de arroz com búfalos d’água, criavam algumas galinhas e cultivavam vegetais ao redor de sua casa. Quando se tornou adulto continuou no meio da agricultura, mas dessa vez criando em massa para a indústria da carne.

Tom criava 540 mil galinhas por ano na Carolina do Norte, nos Estados Unidos, para a Pilgrim’s Pride, um dos maiores produtores de carne dos EUA que abastece empresas grandes, como Walmart e KFC. Quanto mais tempo ele permanecia na criação de galinhas em grande escala, mais consciente Lim ficava de que feria o meio ambiente e que “muitos criadores de aves ficam doentes devido à respiração dentro da casa [das galinhas]”, referindo-se à maneira como a amônia nos resíduos de frangos de criação industrial prejudica ecossistemas e a saúde humana.

No entanto, ele não sentia que tinha outras opções. Cada temporada parecia exigir um novo empréstimo do banco para pagar uma atualização que a Pilgrim’s Pride exigia, mas não ajudava a pagar. “Eles nos disseram que se não pudermos fazer a atualização que eles querem, perderíamos o contrato”, disse Lim. O resultado foi um ciclo interminável de dívidas que tornava impossível sair do negócio.

Hoje em dia, após o fim do contrato, Lim está fazendo a transição da agricultura animal industrial para o cultivo de vegetais e cogumelos. Ele e sua esposa, Sokchea, estão atualmente convertendo seus antigos galpões que abrigavam galinhas em estufas onde podem cultivar vegetais, e já transformaram uma antiga caçamba refrigerada em uma câmara de cultivo de cogumelos especializados.

“Fazer uma vida cultivando vegetais em minha terra é meu sonho”, disse ele em entrevista ao The Guardian. “Esta é a maneira saudável de produzir alimentos. Na casa das galinhas, você lida com amônia, o cheiro, insetos, tudo isso. Em comparação, a estufa é fresca e saudável.”

Fazer esse tipo de transição não é fácil, mas Lim recebeu ajuda de uma organização chamada Transfarmation, que fornece apoio técnico e pequenas bolsas de 10 mil a 20 mil dólares para agricultores em sua jornada de transição para longe da criação industrial.

A Transfarmation é um projeto do grupo de defesa dos direitos animais Mercy for Animals e surgiu da relação de sua presidente, Leah Garces, com o agricultor Craig Watts, um delator que se tornou famoso nos Estados Unidos depois de para a criação de frango após 20 anos. Segundo o diretor da Transfarmation, Tyler Whitley, os líderes da organização perceberam que, se quisessem ajudar a acabar com a criação industrial, precisavam criar recursos para ajudar os pequenos agricultores a fazerem algo diferente.

“Fomos informados pelos agricultores com quem trabalhamos que a maior barreira é uma lacuna de conhecimento. É muito diferente criar galinhas em comparação com cultivar frutas e vegetais frescos, muito diferente trabalhar para grandes empresas em vez de ter que encontrar seus próprios clientes”, disse Whitley.

A Transfarmation está se associando diretamente a pequenos agricultores para fazer a transição de suas fazendas, além de pagar a eles uma pequena bolsa para coletar dados sobre sua transição, que serão disponibilizados gratuitamente online para outros agricultores que desejam fazer uma mudança semelhante.

Tanner Faaborg cresceu em uma fazenda no Iowa rural, onde seus pais contratavam uma operação de criação de porcos comerciais, enchendo dois celeiros com 1.100 porcos cada. No entanto, assim como os Lims, os Faaborgs logo se viram presos em uma “esteira” financeira, onde a operação sempre exigia que investissem dinheiro para melhorar ou consertar algo, mas nunca proporcionava retornos altos o suficiente.

Quando foi para a faculdade e começou a se interessar por sustentabilidade e direitos animais, Faaborg ficou incapaz de se imaginar trabalhando na fazenda, a menos que algo mudasse. “Eu simplesmente não conseguia escapar do impacto ambiental que isso estava tendo com essas operações de criação de animais concentradas”, relatou.

Pesquisas mostraram que viver perto de fazendas industriais de suínos pode encurtar a vida não apenas dos agricultores, mas também de seus vizinhos, devido à poluição do ar e da água que elas criam. “Não acho coincidência que o Iowa [estado dos EUA] tenha uma das taxas de câncer mais altas do país, e temos poços constantemente contaminados”, disse Tanner.

“Então, comecei a conversar com meus pais sobre isso”, contou ele, primeiro convencendo-os a instalar um conjunto solar em suas terras e, mais recentemente, a sair do negócio de porcos e começar a cultivar cogumelos. A fazenda começou recentemente a vender seus cogumelos frescos especiais, além de produtos de cogumelos como tinturas e sais de cogumelos.

Ainda é cedo demais para declarar qualquer uma dessas transições agrícolas um sucesso retumbante, e apenas o tempo dirá se os Faaborgs, Watts e os Lims conseguirão encontrar o mercado para apoiar financeiramente suas novas empreitadas. Mas todos eles parecem encorajados com o que poderia ser possível e apreciam a solidariedade que vem de saber que não estão sozinhos, além de ver a sua qualidade de vida melhorando.

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