Boca espumando, fraqueza, tremores e, em seguida, a morte. Mais de dez cães de moradores do conjunto de chácaras Colina Park, na zona rural de Boa Vista, morreram apresentando os mesmos sintomas nos últimos 15 dias. Diante disso, os tutores cobram uma investigação das autoridades competentes e registraram dois boletins de ocorrência (BO).
A suspeita é de que os cães estejam sendo envenenados como estratégia para comprometer a segurança das propriedades e favorecer furtos. Os moradores começaram a notar a morte dos animais no final de novembro.
Os animais mortos viviam nas centenas de chácaras do residencial localizado na RR-205. Alguns eram criados por donos e caseiros, outros eram cuidados pela comunidade.
A professora Josélia Mendes Gomes, de 52 anos, foi a primeira a notar a semelhança entre os casos de morte dos cães em um curto intervalo de tempo. Preocupada, ela reuniu fotos, vídeos e acionou as autoridades, solicitando uma investigação detalhada sobre o caso.
O cachorro de Josélia, Estopinha, de 6 anos, foi uma das vítimas. Ele morreu no último sábado (7). Ela registrou um Boletim de Ocorrência (BO) por maus-tratos aos animais nessa sexta-feira (13) sobre o caso e também procurou a Polícia Militar pedindo segurança.
“Estamos profundamente tristes com a situação. Ver tantos animais morrendo dessa forma é devastador. Há muita especulação entre os moradores sobre o que pode estar acontecendo. Uma das suposições é que alguém esteja envenenando os cachorros para reduzir a presença deles na área das chácaras”, disse a professora.
Procurada, a PM informou que está ciente do caso, vai intensificar o policiamento na região e “colaborará com as autoridades competentes para investigar as causas das mortes dos animais”.
O g1 procurou a Polícia Civil para saber se os casos registrados serão investigados e aguarda resposta. A reportagem também procurou o loteamento Colina Park para saber se há o interesse em se posicionar, mas não recebeu resposta até a última atualização.
‘Preocupação geral’
O loteamento Colina Park fica a 5 km da município de Alto Alegre – a 36 minutos do Centro de Boa Vista. Os moradores vivem em chácaras e criam animais como galinhas, bois e porcos, além de ter plantações. Os cachorros ajudam a comunidade na segurança e no cuidado com os outros animais.
Estopinha vivia na comunidade antes da professora começar a cuidar dele. Ele foi acolhido por Josélia há cerca de 2 anos. O filho dela, que mora em Manaus (AM), estava passando alguns dias na chácara e notou um comportamento estranho no animal.
“Ele [Estopinha] costuma ficar solto na chácara, começou a apresentar sintomas que pareciam ser de envenenamento, ele babava muito. Como meu filho é veterinário e estava conosco no fim de semana, ele medicou o animal antes de viajar de volta para Manaus”.
“Curiosamente, o cachorro do vizinho também apresentou os mesmos sintomas nesse dia e recebeu o mesmo tratamento. Infelizmente, no dia seguinte, nosso cachorro faleceu”, conta a professora.
Outros animais da vizinhança começaram a apresentar o mesmo sintoma – o que levantou suspeitas na comunidade. Cachorros de rua também estão aparecendo mortos no residencial.
“Ao longo da semana, percebemos que outros animais começaram a apresentar sintomas semelhantes. Até agora, cerca de 9 a 10 cachorros na região morreram. Até ontem [quinta-feira (12)], encontramos até um cachorro morto na beira da estrada. Estamos muito preocupados porque tudo indica que possa ser envenenamento. É uma preocupação geral”.
‘Meus três cachorros morreram em 12 dias’
A chácara do biomédico Antonio Marcos Barbosa, de 50 anos, tem vivido um clima de tristeza desde o início de dezembro. Isso por que três cachorros que viviam na propriedade: Pretinho, Sansão e Guerreiro morreram com os mesmo sintomas de envenenamento.
Antonio conta que a principio, quando o primeiro cão morreu, o caseiro acreditou que se tratava de picada de cobra – mas quando os outros morreram viu que era algo mais sério. Ele registrou um Boletim de Ocorrência por maus tratos aos animais nessa sexta-feira (13).
“A gente sente uma enorme impotência. Não sabemos o motivo disso. Pode ser que alguém esteja querendo acabar com os cachorros do loteamento. Já tivemos problemas antes com cães que invadiram quintais e mataram galinhas, mas esses nossos cães eram dóceis, não faziam isso”, disse Antonio.
Ele conta que estava viajando quando o primeiro cão, Pretinho, que tinha cerca de 1 ano, morreu. Ele começou a apresentar sintomas no final de novembro. Um veterinário até tentou salvar o cão, mas não conseguiu. O segundo a morrer foi Sansão, que tinha cerca de 2 anos. Ele morreu na casa de uma vizinha, também no fim de novembro.
O terceiro cão de Antonio, Guerreiro, apresentou sintomas de envenenamento quando ele já tinha voltado de viagem, no dia 3 de dezembro.
“O Guerreiro morreu logo depois que eu cheguei de viagem, no dia 3 de dezembro. Eu vi um vídeo dele antes de chegar e percebi que estava muito fraco. Na manhã seguinte, o encontrei morto, debaixo de uma árvore. Ele tinha apenas 1 ano”, lamenta o tutor.
Ele conta que na chácara ainda vive a Negona – que é a mãe de Guerreiro. Ela também apresentou sintomas de envenenamento, mas conseguiu sobreviver com os cuidados do veterinário. Um cachorro em situação de rua que vivia nas propriedade e era cuidado pela comunidade, chamado por Antonio de Valente, também foi encontrado morto na chácara do biomédico.
‘Negão, era como parte da família’
O cachorro tutelado pelo servidor federal Dilermando Pires, de 59 anos, também morreu com sintomas parecidos. Negão tinha 7 anos e morreu nessa quinta-feira (12).
De acordo com Dilermando, o caseiro ligou dizendo que o cachorro da casa estava sumido há um dia. Ele tentou chamá-lo como de costume, mas o cachorro não apareceu. No fim da tarde, ele voltou, mas já estava mal.
“Fizemos de tudo para tentar salvar, mas ele não resistiu e acabou morrendo ontem”, lamenta o servidor público.
Ele ainda não registrou um Boletim de Ocorrência sobre a morte de Negão, mas conta que o mais difícil foi contar aos netos que o cachorro estava morto.
“Foi muito triste. Meu cachorro, o Negão, era como parte da família. Meus netos ficaram arrasados quando souberam. Eu nem quis mostrar o vídeo para eles, foi um momento muito difícil. Era nosso protetor. Ficava sempre perto de nós, na porta do barracão, cuidando de tudo. Nunca saía, mesmo se outros cachorros passassem por perto. Era muito fiel”.
Ele conta ainda que na quinta-feira uma vizinha também ligou para ele em desespero, pois a cachorra também estava morrendo. Ele acredita que estejam querendo enfraquecer a segurança das chácaras do loteamento.
“É uma tristeza enorme. A gente sente que falta segurança no loteamento. Queremos que alguma autoridade faça algo. Precisamos investigar e proteger os cachorros. É muito frustrante. Hoje mesmo, um amigo meu viu como estávamos abatidos e me presenteou com dois filhotes. Vou levá-los para a chácara depois de vaciná-los, mas o sentimento de perda do Negão é imenso”, finaliza Dilermando.
Fonte: G1