Ativistas protestaram neste sábado, 21 de dezembro, em frente ao restaurante onde cão foi morto com chute, na cidade de Novo Hamburgo/RS (Foto: Vanessa Drehmer)
Um dia, na praia badalada, fui comprar um pastel para um cão abandonado que estava invisível pela orla entre pessoas. Ao chegar no local, coincidentemente, o atendente chuta o mesmo cão, a quem eu iria estender o pastel. Consternada, eu e meu marido começamos a xingar o rapaz, que, começa a inventar que o lugar preza pela higiene. Detalhe – ele atendia de pés sujos e descalços (as mãos prefiro não comentar). Depois de perceber que ao meu redor havia um monte de otários rindo, os frequentadores daquela praia, jurei nunca mais colocar meus pés naquelas praias, sim, um conjunto… e assim cumpri minha promessa.
Pois agora outro cão é chutado. E o pobre era cego. E o animal morreu. O que sobra para nós que assistimos a isso, com olhos que choram e veem?
Saramago definiu na personagem ‘a mulher que vê’ em ‘O ensaio sobre a cegueira’, a condição de quem está aí no meio da sordidez humana, vendo tudo o que acontece e sentindo-se totalmente só, diante da barbárie praticada por quase todos à luz do dia. Não foi a primeira vez. Não foi a primeira vez que me senti pequena e só, sem reação, diante da falta total de respeito humano pelo outro, pelo mundo, pelo ser humano, pela dignidade em si mesmo. Já passei em frente de loja e vendedores, sem ter o que fazer, chutando cachorro da frente do estabelecimento. Alguém mandou. E eles não recebem um centavo a mais por isso. Obedecem.
Por que temos que obedecer sempre? A tudo? Eu nunca fui de obedecer a chefe. Nunca. E nunca fui demitida por isso. O que você ouve do seu chefe sobre a demissão dos seus colegas é pura fofoca, nunca acredite ok? Pode acreditar em mim que já vi outros lados dessa farsa que é trabalhar em empresas e outras armadilhas…
O fato de haver animais nas ruas, doentes, abandonados, o fato de haver lojas vazias, atendentes de mau humor, pessoas mesquinhas, silêncio, já diz muita coisa… são sintomas de algo muito pior. E nas redes sociais, um monte de babacas defendendo o ‘empresariado’, neste caso, contra os defensores de animais, sem nem saber do que se tratava. Uma lástima que me lembrou o episódio que presenciei com meus próprios olhos, de mulher que vê, no dia em que resolvi passar um verão numa dessas praias paparicadas pela mídia local.
Se um cego é chutado, o que será de mim, que vejo?