Com muitas florestas tropicais desmatadas ou degradadas, o planeta pode se beneficiar caso essa vegetação seja recomposta, mas replantar árvores em grande escala é uma atividade cara. Uma parte dessas matas afetadas pode rebrotar espontaneamente, porém, sem replantio ou intervenção no solo, e um novo estudo mostra que o Brasil possui a maior área com capacidade para essa regeneração natural.
Segundo o novo trabalho, realizado por cientistas de Austrália, Brasil e EUA, a área de florestas brasileiras que rebrotariam sem a necessidade de manipulação humana direta é de 55 milhões de hectares, similar ao tamanho do estado da Bahia. O país detém sozinho cerca de um quarto do potencial para essa forma passiva de regeneração, que representa 215 milhões de hectares no mundo (área similar ao tamanho do México).Depois do Brasil, os países com maior potencial são Indonésia, China, Colômbia e México. Juntas, essas cinco nações detém mais da metade da capacidade planetária para recomposição espontânea das matas tropicais.
Depois do Brasil, os países com maior potencial são Indonésia, China, Colômbia e México. Juntas, essas cinco nações detém mais da metade da capacidade planetária para recomposição espontânea das matas tropicais.
As terras com potencial para regeneração natural são aquelas onde o solo não foi muito degradado por atividade agropecuária nem ocupação urbana e que estão ainda relativamente perto de fragmentos florestais saudáveis, de onde vem a semeadura espontânea.
O fato de o rebrotamento ocorrer naturalmente, porém, não significa que projetos de restauração não tenham um custo, pois essas áreas precisariam ser vigiadas contra degradação futura, sobretudo aquelas fora de parques e reservas. Em propriedades privadas, pode ser necessário o pagamento de uma compensação a proprietários para manter a mata intacta, com créditos de carbono, no caso de ainda haver espaço para desmate legal.
De todo modo, os cientistas afirmam que investimento necessário para recompor essas áreas tem um custo-benefício muito maior do que o replantio em áreas isoladas e com solo degradado.
Países com maior potencial para regeneração natural de florestas
- Brasil
- Indonésia
- China
- Colômbia
- México
- Rep. Dem. Congo
- Vietnã
- Mianmar
- Tailândia
- Malásia
“A regeneração florestal natural apresenta uma oportunidade de alcançar restauração florestal econômica em grande escala, proporcionando grandes benefícios de mitigação climática por meio do sequestro de carbono e contribuindo para metas de emissão líquida zero de gases do efeito estufa até meados do século”, escrevem os autores do trabalho, liderados pela cientista Brooke Williams, da Universidade de Queensland (Austrália). “Isso também pode produzir cobenefícios críticos, incluindo a conservação da biodiversidade, a regulação dos recursos hídricos, a redução da erosão e o aumento da resiliência.”
Os dados e a conclusão dos cientistas estão em artigo publicado hoje na revista científica “Nature”.
Numa análise preliminar, os autores estimam que se essas áreas em potencial de regeneração natural forem reservadas para rebrotamento pelos próximos 30 anos, elas poderiam sequestrar ate 23 gigatoneladas de carbono, quase metade das emissões anuais de gases-estufa do mundo.
Segundo a pesquisadora Ludmila Pugliese, gerente-sênior de restauração da ONG Conservation International, que participou do estudo, as áreas típicas do Brasil onde há potencial para regeneração natural são aquelas de desmate recente ou até de desmate mais antigo, mas que foram abandonadas e podem ter começado a rebrotar.
— As áreas que estamos apontando são aquelas onde não ocorreu uso muito intensivo do solo por muito tempo, como pecuária, por exemplo, onde o gado pisoteia o solo. Também ficam comprometidas áreas que tiveram mineração ou que tiveram cultivo com caminhão pesado e trator passando no solo, e uso intensivo de herbicida — diz a cientista. — As áreas também precisam estar relativamente perto de remanescentes florestais, que podem fornecer sementes, ou que tenham propágulos (remanescentes de tocos ou raízes), que podem fazer as plantas rebrotarem.
Tipicamente, terras que tenham passado por qualquer tipo de uso humano ao longo de três décadas não se qualificam mais mais para regeneração natural.
Segundo os cientistas, as regiões com potencial genérico de regeneração (incluindo a regeneração artificial) já estavam relativamente bem mapeadas no planeta, mas não havia estudos com uma divisão clara para o potencial de rebrotamento natural. Com os mapas gerados pelo estudo, em maior resolução, os pesquisadores pretendem subsidiar governos com informações sobre quais áreas tem melhor potencial para serem recompostas.
Se as políticas de reflorestamento começarem pelas áreas que requerem menos investimento, afirmam Williamns e colegas, o planeta terá uma capacidade de aumentar sua biomassa de floresta mais rápido, e absorver mais carbono, o que ajudaria a frear o ritmo do aquecimento global.
Florestas que se recompõem naturalmente, além disso, se tornam normalmente mais robustas e com mais biodiversidade do que aquelas restauradas com plantio direto e manejo de solo.
“À medida que florestas em regeneração promovem mais regeneração no futuro por meio de um mecanismo de feedback, é preciso que haja incentivos fortes para dar apoio a esses processos imediatamente”, diz a cientista.
Dentro do Plano Nacional de Recuperação da Vegetação Nativa (Planaveg), de 2017, o governo federal do Brasil possui algumas diretrizes para incentivar a protecação de áreas com vocação para regeneração natural, sobretudo na Amazônia, mas também em biomas mais desmatados, como Mata Atlântica e Cerrado. Uma segunda versão do Planveg está sendo lançada nesta semana, já com novas propostas mirando a regeneração natural.
Segundo Pugliese, seria interessante priorizar áreas estão dentro de zonas protegidas que ficam dentro de propriedades privadas, como áreas de preservação permanente (APPs) e de reserva legal, porque nelas a lei já diz que esse passivo ambiental precisa ser recomposto. A reserva legal de propriedades na Amazônia por exemplo, é de 80%, que corresponde ao percentual que não pode ser desmatado, segundo a legislação do Código Florestal.
— Restaurar áreas não é um processo fácil nem barato, e se a gente conseguir um mecanismo que facilite isso, ou seja, permita fazer isso com menor intervenção e menor custo, a gente ganha em escala, ganha em velocidade ganha em qualidade da restauração — diz a pesquisadora.
Fonte: Um Só Planeta