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TERRITÓTIO MODIFICADO

Brasil perdeu 33% de áreas naturais; Amazônia recuou “uma França” nos últimos 40 anos

Recuo das águas coloca o Pantanal como bioma com mais municípios com perda de áreas naturais entre 1985 e 2023

21 de agosto de 2024
Marco Britto para Um Só Planeta
10 min. de leitura
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Área de floresta preservada ao lado de plantação de milho. — Foto: Getty Images

O Brasil possui um terço de seu território modificado pela ação humana, afirma novo levantamento feito pelo coletivo científico MapBiomas, publicado nesta quarta-feira (21). O documento chama a atenção para uma aceleração nos últimos 40 anos, quando a ocupação de vegetação nativa e outras áreas naturais pulou de 20% do país em 1985 para os atuais 33%. Só a Amazônia perdeu uma área equivalente à França.

O uso do solo nas áreas impactadas é principalmente direcionado à agricultura e pecuária, sendo que apenas as pastagens brasileiras ocupam 19,35% do território nacional, ou 165 milhões de hectares, enquanto a agricultura se espalha por 61 milhões de hectares, ou 7,17%. Áreas urbanizadas correspondem a pouco mais de 4 milhões de hectares, um terreno próximo a 0,5% do território nacional, segundo dados de 2023.

Como base de comparação, pesquisas do MapBiomas na América do Sul apontam que na Argentina o percentual de vegetação nativa é de 70% do território do país, situação próximo da brasileira (64,5%). No Uruguai, o avanço da agricultura e silvicultura causou uma redução de 10% de áreas naturais em 20 anos (2000-2019).

Segundo os dados do MapBiomas, a perda histórica de áreas naturais no Brasil até 1985 totalizava 20% do território. Nos 39 anos seguintes (1985-2023), essa perda avançou para outros 13% do território (110 milhões de hectares), totalizando em 2023 a marca de 33%. Metade desse total ocorreu na Amazônia. Ao mesmo tempo, outras regiões registraram ganho de vegetação nativa.

Raio-X do uso do território

  • Brasil tem 64,5% do território coberto por vegetação nativa
  • Em 1985, essa cobertura era de 76%
  • Entre 1985-2023, área de pastagem expandiu 79%, ou 72,5 milhões de hectare
  • Área da de agricultura cresceu 228%, ou um acréscimo de 42,4 milhões de hectares
  • Em 1985, 48% dos municípios tinham o predomínio da agropecuária
  • Em 2023, esse predomínio chegou a 60% dos municípios
  • Mais da metade (60%) da perda de vegetação nativa no país está em propriedades privadas

Regiões com aumento de vegetação

Em nível nacional, 18% dos municípios tiveram estabilidade entre 2008 e 2023, período em que dados municipais foram analisados pelo MapBiomas. Em outros 37%, houve ganho de vegetação nativa.

O bioma com maior percentual de municípios onde a área de vegetação nativa cresceu nesses 16 anos foi a Mata Atlântica: 56%.

Os estados com maior proporção de municípios com ganho de vegetação nativa são Paraná (76%), Rio de Janeiro (76%) e São Paulo (72%).

Dos 27 estados da federação, apenas o Rio de Janeiro teve aumento de vegetação nativa no período avaliado, que passou de 30% para 32% de seu território. Os demais 26 estados tiveram redução, sendo que as mais expressivas foram em Rondônia (de 93% em 1985 para 59% em 2023), Maranhão (de 88% para 61%), Mato Grosso (de 87% para 60%) e Tocantins (de 85% para 61%).

Os estados com maior proporção de vegetação nativa são Amapá (95%), Amazonas (95%) e Roraima (93%). Já os estados com menor relação são Sergipe (20%), São Paulo (22%) e Alagoas (23%).

As áreas mais preservadas do Brasil continuam sendo as Terras Indígenas (TIs), que cobrem 13% do território nacional. De 1985 a 2023, elas perderam menos de 1% de sua área de vegetação nativa, enquanto nas áreas privadas foram 28%.

Perda de áreas naturais por município

O bioma com mais municípios com perdas de áreas naturais é o Pantanal, com 82%. O bioma foi afetado não só pelo uso do solo, mas pelo recuo das águas, que compõem as áreas naturais. Em 2023, o recuo dos rios em relação à média histórica foi de 61%, segundo relatório anterior do MapBiomas.

Já os estados com maior proporção de municípios com perda de vegetação são Rondônia (96%), Tocantins (96%) e Maranhão (93%). Quase metade dos municípios brasileiros (45%) perderam vegetação nativa no período.

No caso da região do Matopiba, no Cerrado (área que reúne os estados do Maranhão, Tocantins, Piauí e Bahia), todos os estados têm pelo menos um município com mais de 30% de perda de vegetação nativa entre 2008 e 2023.

O Pampa é o bioma com a maior proporção de municípios com perdas acentuadas (superior a 15%) de vegetação nativa, com uma queda de 35% desde 1985.

Avanço da agropecuária nos biomas 1985-2023 (porcentagem do território)

  • Mata Atlântica: de 63% para 65%
  • Cerrado: de 28% para 47%
  • Pampa: de 28% para 45%
  • Caatinga: de 28% para 38%
  • Pantanal: de 5% para 17%
  • Amazônia: de 3% para 16%

Para Júlio Esquerdo, pesquisador da Embrapa Agricultura Digital, que não participou do levantamento do MapBiomas, dados de uso do solo disponíveis apontam que a agricultura tem aproveitado áreas de pastagens para se expandir. Coordenador da plataforma TerraClass, o especialista ponta que na Amazônia e no Cerrado, entre 2018 e 2022, a agricultura anual foi ampliada em 22%, com 94% dessa expansão sobre usos agropecuários já consolidados, principalmente sobre áreas de pastagem.

“Neste período, aproximadamente 1% desta expansão se deu sobre áreas de vegetação natural primária e secundária. Estes resultados dão um sinal de que o crescimento da agricultura nestes dois biomas ocorreu prioritariamente sobre as pastagens, indicando que a agricultura tem se expandido sobre áreas já antropizadas e poupado a necessidade de abertura de novas áreas naturais. A abertura de novas áreas para pastagem continua sendo a principal atividade responsável pela conversão da cobertura vegetal natural”, afirma Esquerdo.

“Com relação a como conciliar a atividade econômica agropecuária e a preservação, nós reforçamos a importância de incentivar a adoção de tecnologias mais sustentáveis, como por exemplo sistemas integrados e a própria recuperação de áreas degradadas, e a promoção de políticas para gestão territorial voltadas à redução da pressão pela abertura de novas áreas de cobertura vegetal natural ou, ainda, outras políticas que restrinjam acesso ao mercado de produtos oriundos de áreas desmatadas.” — Júlio Esquerdo, pesquisador da Embrapa

Perda de áreas naturais por bioma

Em área total, Amazônia e Cerrado são os biomas que mais perderam área de vegetação nativa. Na Amazônia, foram 55 milhões de hectares, área similar à da França, e uma redução de 14% nos últimos 39 anos. Com isso, a grande floresta tropical brasileira tem hoje 81% de sua extensão coberta por florestas e vegetação nativa. A área inclui 8,1 milhões de hectares de vegetação secundária, que cresceu novamente depois de ser desmatada.

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