EnglishEspañolPortuguês

Ibama dá prazo de 5 dias para Bienal tirar urubus de instalação

2 de outubro de 2010
7 min. de leitura
A-
A+

O protesto de defensores de animais contra a exposição dos três urubus de cabeça amarela que fazem parte da obra Bandeira Branca, do artista plástico Nuno Ramos, na 29.ª Bienal de São Paulo, surtiu efeito. O Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) de São Paulo notificou os responsáveis pela mostra e deu um prazo de cinco dias para que os animais sejam retirados e retornem para o Parque dos Falcões, em Sergipe, onde são criados por José Persílio Costa.

Vista de cima da obra 'Bandeira branca', de Nuno Ramos, que ocupa o vão central da Bienal. No detalhe, as aves sobre uma das 'chaminés' da instalação (Foto: Daigo Oliva/G1)

A bióloga coordenadora do Núcleo de Fauna do Ibama de Sergipe, Gláucia Maria Lima Bispo, afirmou ao G1, na noite desta sexta-feira (1), que falhou ao emitir a autorização para “transporte e manejo” dos urubus que integram a instalação do artista Nuno Ramos na 29ª Bienal de São Paulo.

A licença foi revogada nesta quinta-feira pelo próprio Ibama de Sergipe após receber parecer do Ibama de São Paulo atestando que as aves, cedidas pelo Parque dos Falcões, em Sergipe, estão sendo vítimas de maus tratos.

“Admitimos que a licença foi emitida de forma precária”, disse Bispo à reportagem por telefone. “Recebemos o plano [da obra do artista] com antecedência, mas dado o volume de documentos e de coisas que a gente tem que ver, eu não atentei que seria uma situação em um ambiente assim, confinado. Ao emitir uma autorização para expor os animais no parque Ibirapuera, a impressão que tivemos é que [as aves] estariam numa área verde”, explicou.

A bióloga reconhece que aprovou o uso das aves na obra baseada principalmente em fotos em preto e branco de uma obra semelhante que já havia sido montanda por Ramos em Brasília, em 2008, com os mesmos urubus.

Bispo diz que mudou de opinião depois que o Ibama de São Paulo, pressionado por reclamações da sociedade civil, a procurou. “Nós informamos sobre a emissão das licenças, dizendo que eles apresentaram um plano de manejo com fotos da exposição em Brasília e que não vimos impedimento, a princípio, na emissão destas licenças. Mas falamos para eles da precariedade de emissão de uma licença numa situação dessas e que, se eles verificassem que teria problemas, não teríamos nenhum problema em revogar nossa licença.”

“Não temos problemas em reconhecer possíveis falhas que possam ser cometidas por nós”, disse Bispo. “Nossa preocupação, em primeiro lugar, tem de ser o bem-estar do animal. Em se verificando problemas na forma como animal está sendo exposto, não há nenhum problema em voltar atrás.”

Instalações inadequadas
O parecer do Ibama de São Paulo, datado de 30 de setembro, que considerou “as instalações e o manejo inadequados para a manutenção das aves pela duração prevista para a exposição, de aproximadamente três meses”.

Segundo o documento, que é assinado pelo veterinário Claudio Massao Kawata, pela bióloga Rossana Borioni, e pelo agente de fiscalização Ivan Paulo Ortiz Pereira, “o local de cativeiro jamais recebe insolação direta ou ventos”, e não oferece “isolamento de segurança” com o público. O parecer questiona ainda a inexistência de um veterinário responsável no local.

O documento do Ibama de SP estipula um prazo provisório de 15 dias para “adequação das instalações” segundo uma lista de nove exigências que incluem o acesso à luz solar, a remoção dos alto-falantes e a melhoria física no espaço da obra “dando alternativa aos animais de escolha”. Após esse prazo, uma nova vistoria seria feita e a autorização, renovada a cada duas semanas, sempre com o parecer de um veterinário local.

Um comunicado enviado pela assessoria de imprensa do órgão diz apenas que o Ibama de SP enviou notificação “aos responsáveis pelos ‘três urubus-de-cabeça-amarela’ (Cathartes burrovianus)” pedindo “a retirada dos animais” por considerar que “as instalações estão inadequadas para a manutenção das aves”.

O comunicado afirma ainda que há um prazo de cinco dias para que os animais sejam devolvidos ao Parque dos Falcões, em Sergipe, de onde foram cedidos. O prazo, ainda segundo o Ibama, visa atender “uma logística para que eles retornem com segurança ao seu habitat”.

No sábado, dia da abertura da mostra, instalação foi pichada (Foto: Filipe Araújo/Agência Estado)

Procurado por telefone, Ramos disse que não se pronunciaria sobre o pedido do Ibama e afirmou que o caso seria resolvido pela Bienal. Em nota, os organizadores da mostra afirmam que a instituição está analisando o pedido do Ibama, mas não esclarece se os animais serão retirados ou mantidos na obra.

“A Fundação Bienal recebeu na data de hoje um comunicado do Ibama SP, que já está em análise pelo departamento jurídico e pela liderança da Instituição, no sentido de buscar uma solução que atenda as novas demandas dos órgãos ambientais e possa, dentro da lei, conciliá-las com os valores de liberdade de expressão do artista e de independência curatorial, na tentativa de preservar a integridade da exposição”, diz o comunicado.

Abaixo-assinado e pichação
A presença dos urubus na instalação “Bandeira branca”, de Ramos, vem causando polêmica desde antes da abertura oficial da 29ª Bienal, que ocorreu no último sábado (25). Cientes da obra, internautas e grupo de defensores dos direitos dos animais chegaram a criar um abaixo-assinado contra a exibição da obra do artista na mostra.

Na ocasião, tanto Ramos quanto os organizadores da Bienal declararam que a presença dos animais estava “dentro da legislação” e que “o autor da obra possui todas as licenças exigidas pelos órgãos de preservação ambiental para o uso desses animais”.

“É importante deixar claro que não tiramos os animais da natureza”, disse Ramos. “Os urubus pertencem ao Parque dos Falcões [em Sergipe], onde vivem em cativeiro. Só tirei de uma gaiola e pus em outra 30 vezes maior.”

Ainda segundo o artista, o tratador das aves e o veterinário foram trazidos para São Paulo para verificar as condições de segurança e adaptação dos animais ao ambiente da Bienal. “Ao menor sinal [de problema], a gente vai atuar”, afirmou Ramos na semana passada.

No último sábado, durante a abertura da Bienal para o público, houve protestos contra a exibição das aves e, ao final do dia, um grupo cortou a grade de proteção da obra de Nuno Ramos e pichou os dizeres “Liberte os urubu” (sic).

Montada no vão central do interior do prédio da Bienal, no parque Ibirapuera, a instalação de Ramos é composta por três grandes esculturas em formas geométricas, que lembram grandes túmulos. As peças são cercadas por uma tela de proteção que acompanha, de alto a baixo, a rampa e as curvas do prédio projetado pelo arquiteto Oscar Niemeyer. No alto de cada uma delas, há caixas de som, que tocam trechos das músicas “Bandeira branca”, “Carcará” e “Acalanto”, além de poleiros que se parecem com chaminés, de onde as aves raramente saem.

Em 2008, a obra já havia sido montada em uma exposição no Centro Cultural Banco do Brasil de Brasília. Segundo Ramos, as aves usadas na época eram as mesmas que estão agora na instalação da Bienal.

José Carlos Orlandim, presidente da ONG Animais da Aldeia, comemorou. “Foi uma excelente vitória para proteção animal. Mas estaremos na Bienal distribuindo panfletos até que os animais sejam retirados.”

Protesto

Ativistas pelos direitos dos animais marcaram para hoje, às 14 horas, um protesto contra o confinamento das aves na frente da Bienal. Pelo menos cem pessoas são esperadas na manifestação.

Com informações do G1 e Agência Estado

Você viu?

Ir para o topo