Muita atenção tem sido dada a como as mudanças climáticas podem levar à perda de biodiversidade. Agora, pesquisadores do MIT mostraram que o inverso também é verdadeiro: a redução da biodiversidade pode comprometer um dos mecanismos mais poderosos da Terra para mitigar as mudanças climáticas.
Em um artigo publicado na PNAS, os pesquisadores demonstraram que, após o desmatamento, florestas tropicais que se regeneram naturalmente, com populações saudáveis de animais dispersores de sementes, podem absorver até quatro vezes mais carbono do que florestas semelhantes com menos animais dispersores.
Como as florestas tropicais são atualmente o maior sumidouro terrestre de carbono do planeta, as descobertas melhoram nossa compreensão de uma ferramenta potente no combate às mudanças climáticas.
“Os resultados destacam a importância dos animais na manutenção de florestas tropicais saudáveis e ricas em carbono”, diz Evan Fricke, pesquisador do Departamento de Engenharia Civil e Ambiental do MIT e principal autor do estudo. “Quando os animais dispersores de sementes diminuem, corremos o risco de enfraquecer o poder das florestas tropicais de mitigar o clima.”
Entre os coautores do artigo estão César Terrer, professor associado do MIT; Charles Harvey, professor de engenharia civil e ambiental do MIT; e Susan Cook-Patton, da The Nature Conservancy.
O estudo combina uma ampla gama de dados sobre biodiversidade animal, movimento e dispersão de sementes de milhares de espécies, além de informações sobre acúmulo de carbono em milhares de áreas de florestas tropicais.
Os pesquisadores afirmam que os resultados são a evidência mais clara até agora de que os animais dispersores de sementes desempenham um papel crucial na capacidade das florestas de absorver carbono. As descobertas reforçam a necessidade de tratar a perda de biodiversidade e as mudanças climáticas como partes interligadas de um ecossistema delicado, e não como problemas isolados.
“Já estava claro que as mudanças climáticas ameaçam a biodiversidade, e agora este estudo mostra como a perda de biodiversidade pode agravar as mudanças climáticas”, diz Fricke. “Entender essa relação bidirecional nos ajuda a compreender as conexões entre esses desafios e como podemos enfrentá-los. São problemas que precisamos resolver em conjunto, e a contribuição dos animais para o carbono das florestas tropicais mostra que é possível obter ganhos duplos ao apoiar a biodiversidade e combater as mudanças climáticas ao mesmo tempo.”
Unindo as peças
Da próxima vez que você vir um vídeo de um macaco ou pássaro comendo uma fruta, lembre-se de que esses animais estão desempenhando um papel importante em seus ecossistemas. Pesquisas mostram que, ao digerir sementes e defecá-las em outro local, os animais ajudam na germinação, no crescimento e na sobrevivência das plantas.
Fricke estuda animais dispersores de sementes há quase 15 anos. Suas pesquisas anteriores mostraram que, sem a dispersão por animais, as árvores têm menor taxa de sobrevivência e mais dificuldade para se adaptar a mudanças ambientais.
“Agora estamos pensando mais sobre o papel dos animais no clima por meio da dispersão de sementes”, diz Fricke. “Sabemos que, nas florestas tropicais, onde mais de três quartos das árvores dependem de animais para dispersão, o declínio desses dispersores pode afetar não só a biodiversidade, mas também a capacidade de recuperação após o desmatamento. Também sabemos que, em todo o mundo, as populações animais estão diminuindo.”
A regeneração florestal é frequentemente citada como uma forma de mitigar os efeitos das mudanças climáticas, mas a influência da biodiversidade na capacidade de absorção de carbono ainda não havia sido totalmente quantificada, especialmente em larga escala.
Para o estudo, os pesquisadores combinaram dados de milhares de estudos e usaram novas ferramentas para quantificar processos ecológicos distintos, mas interconectados. Após analisar dados de mais de 17.000 áreas de vegetação, focaram em regiões tropicais, examinando informações sobre onde vivem os animais dispersores, quantas sementes eles dispersam e como afetam a germinação.
Os pesquisadores também incorporaram dados mostrando como a atividade humana impacta a presença e o movimento desses animais. Eles descobriram, por exemplo, que os animais se movem menos quando consomem sementes em áreas com maior interferência humana.
Combinando todos esses dados, criaram um índice de perturbação da dispersão de sementes, revelando uma ligação entre atividades humanas e declínio na dispersão. Em seguida, analisaram a relação entre esse índice e registros de acúmulo de carbono em florestas tropicais em regeneração natural, controlando fatores como secas, incêndios e presença de gado.
“Foi um grande trabalho reunir dados de milhares de estudos em um mapa da perturbação da dispersão de sementes”, diz Fricke. “Mas isso nos permitiu ir além de apenas identificar quais animais estão presentes e realmente quantificar seus papéis ecológicos, entendendo como as pressões humanas os afetam.”
Os pesquisadores reconhecem que a qualidade dos dados sobre biodiversidade animal pode ser aprimorada e que isso introduz incerteza nos resultados. Também observam que outros processos, como polinização, predação de sementes e competição, influenciam a dispersão e podem limitar a regeneração florestal. Ainda assim, as descobertas estão alinhadas com estimativas recentes.
“O que é particularmente novo neste estudo é que estamos obtendo números concretos sobre esses efeitos”, diz Fricke. “Descobrir que a perturbação da dispersão de sementes explica uma diferença de quatro vezes na absorção de carbono entre milhares de áreas de regeneração tropical aponta os dispersores como um fator crucial no carbono florestal.”
Quantificando o carbono perdido
Em áreas identificadas como potenciais locais de regeneração, os pesquisadores descobriram que o declínio na dispersão de sementes estava ligado a uma redução na absorção de carbono de, em média, 1,8 tonelada por hectare por ano, equivalente a uma redução de 57% na regeneração.
Os resultados sugerem que projetos de regeneração natural serão mais eficazes em locais onde os animais dispersores foram menos impactados, incluindo áreas recentemente desmatadas, próximas a florestas bem preservadas ou com maior cobertura arbórea.
“Na discussão entre plantar árvores ou permitir a regeneração natural, a regeneração é basicamente gratuita, enquanto o plantio custa dinheiro e resulta em florestas menos diversas”, diz Terrer. “Com esses resultados, agora podemos entender onde a regeneração natural pode ocorrer efetivamente porque os animais estão plantando as sementes de graça, e também identificar áreas onde, devido ao impacto nos animais, a regeneração não acontecerá, tornando o plantio ativo necessário.”
Para apoiar os animais dispersores, os pesquisadores recomendam intervenções que protejam ou melhorem seus habitats e reduzam pressões sobre as espécies, como corredores ecológicos e restrições ao comércio de animais. Também é possível restaurar seu papel ecológico reintroduzindo espécies perdidas ou plantando árvores que atraiam esses animais.
As descobertas podem ainda tornar mais precisas as projeções do impacto climático da regeneração natural.
“Ignorar o impacto da perturbação da dispersão de sementes pode superestimar o potencial de regeneração em algumas áreas e subestimá-lo em outras”, escrevem os autores.
Os pesquisadores acreditam que o estudo abre novas frentes de pesquisa.
“As florestas fornecem um enorme subsídio climático ao sequestrar cerca de um terço de todas as emissões humanas de carbono”, diz Terrer. “As florestas tropicais são de longe o maior sumidouro global, mas nas últimas décadas sua capacidade de absorção tem diminuído. A seguir, exploraremos quanto desse declínio se deve ao aumento de secas extremas ou incêndios, em comparação com a redução na dispersão de sementes por animais.”
No geral, os pesquisadores esperam que o estudo ajude a melhorar nossa compreensão dos complexos processos ecológicos do planeta.
“Quando perdemos nossos animais, perdemos a infraestrutura ecológica que mantém nossas florestas tropicais saudáveis e resilientes”, conclui Fricke.
Traduzido de Phys.org.