Muito antes de serem vistas, as baleias-azuis podem ser ouvidas. Seus sons graves e poderosos percorrem quilômetros sob a superfície, compondo uma verdadeira sinfonia subaquática. Mas, segundo um estudo divulgado pela National Geographic na última terça-feira (29) com base em pesquisas publicadas no início deste ano, esse coral marinho está ficando cada vez mais silencioso – e o motivo preocupa cientistas.
Ao longo de seis anos, pesquisadores monitoraram o ecossistema da Corrente da Califórnia usando hidrofones – microfones subaquáticos capazes de captar sons a quilômetros de distância. O projeto, liderado por John Ryan, do Monterey Bay Aquarium Research Institute, mostrou um padrão claro: enquanto baleias-jubarte mantiveram seu canto estável, baleias-azuis e baleias-fin reduziram drasticamente as vocalizações.
A explicação está no que os cientistas chamam de The Blob, uma onda de calor marinha que começou em 2013 e se espalhou pela costa do Pacífico entre 2014 e 2016, elevando a temperatura da água em até 4,5°C acima da média. Essa anomalia reduziu a oferta de krill (os pequenos crustáceos que são a base da dieta das baleias-azuis) e afetou profundamente a cadeia alimentar marinha.
As gravações revelaram que, durante o calor extremo, as vocalizações das baleias-azuis caíram cerca de 40%. “É como tentar cantar com fome”, explicou Ryan. “Elas gastavam todo o tempo apenas procurando comida.”
Ao contrário das jubartes, que têm dieta variada, as baleias-azuis dependem quase exclusivamente de cardumes densos de krill. Com a escassez, cada mergulho precisava ser calculado para compensar o gasto de energia. Sem comida suficiente, não sobrava tempo nem força para cantar – comportamento que, além de comunicação, está ligado à reprodução.
Pesquisas conduzidas entre 2016 e 2018 no Marine Mammal Institute da Universidade Estadual do Oregon encontraram o mesmo padrão do outro lado do planeta, na Nova Zelândia: menos chamadas ligadas à alimentação e menos cantos de acasalamento nos anos de águas mais quentes. “Quando há menos alimento, há menos investimento na reprodução”, afirma a ecóloga Dawn Barlow, autora principal do estudo.
Isso transforma as baleias-azuis em verdadeiras “sentinelas do oceano”: o que elas fazem (ou deixam de fazer) reflete o estado de saúde dos ecossistemas marinhos. E o silêncio pode ser um aviso de que as mudanças climáticas estão impondo um estresse duradouro e possivelmente irreversível a essas águas.
O estudo reforça que escutar o oceano é uma ferramenta essencial para entender e proteger a vida marinha. O som pode revelar muito sobre a saúde dos ecossistemas, as cadeias alimentares e até antecipar crises ambientais. “Agora, mais do que nunca, é importante ouvir”, diz Barlow. “O silêncio das baleias não é apenas ausência de música – é um sinal de que algo vital está mudando no coração do oceano.”
Fonte: Um só Planeta